O debate sobre filmes de super-heróis e o papel da crítica cinematográfica é um tópico cada vez mais presente no cenário cultural contemporâneo, especialmente em produções de grande apelo popular como os filmes de Deadpool e Wolverine. Desde o lançamento de Vingadores: Ultimato (2019) e Homem-Aranha: Sem Volta para Casa (2021), o universo Marvel vem proporcionando grandes sucessos de bilheteria e títulos que agradam o público pela sua combinação de ação, humor e, em alguns casos, inovação narrativa. Deadpool e sua potencial parceria com Wolverine prometem repetir a dose, porém com uma abordagem ainda mais irreverente e “fora da caixa”. Entretanto, a maneira como essas produções são analisadas por críticos e como o público as percebe muitas vezes reflete um abismo entre a experiência de entretenimento e os critérios técnicos avaliados pelos especialistas.
Em primeiro lugar, é fundamental reconhecer que a crítica cinematográfica tem um papel relevante e histórico. Ela analisa não apenas o enredo, mas também a profundidade dos personagens, a construção narrativa, a estética visual e sonora e o contexto de produção. Tudo isso contribui para o entendimento da obra enquanto arte e cultura. Por outro lado, quando o público busca no cinema uma experiência de diversão despretensiosa, as análises técnicas podem parecer exageradas e desnecessárias. No caso de filmes como Deadpool, que desde o início se posiciona como uma obra irreverente e satírica, a crítica rigorosa pode até parecer deslocada, pois o propósito do filme não é a excelência técnica ou a complexidade narrativa, mas, sim, proporcionar momentos de riso e entretenimento puro.
Deadpool é, essencialmente, uma obra que abraça a galhofa e a liberdade narrativa. Desde o primeiro filme, o personagem quebra a quarta parede, fala diretamente com o espectador, faz piadas sobre si mesmo e sobre o universo de super-heróis em que está inserido. Essas características não só o diferenciam de outros heróis, mas também desafiam as convenções dos filmes do gênero, que tendem a se levar muito a sério, especialmente após o sucesso de produções sombrias e profundas como a trilogia Batman, de Christopher Nolan. Neste sentido, criticar Deadpool com a mesma seriedade aplicada a filmes como O Poderoso Chefão ou A Origem pode parecer fora de propósito, pois não leva em conta que cada filme tem seus próprios objetivos, públicos e linguagens.
Ao assistir a Deadpool, o público sabe que encontrará um filme recheado de violência estilizada, humor ácido e autodepreciativo, e referências pop – um pacote que, se bem executado, cumpre com eficácia a proposta de entreter. E, ao que tudo indica, essa fórmula foi bem-sucedida em conquistar o público. Críticos que insistem em avaliar esse tipo de filme pelo prisma das obras "sérias" podem cair na armadilha de ignorar que a indústria do cinema é multifacetada, abrangendo tanto produções autorais e experimentais quanto filmes comerciais voltados para a diversão escapista. Ou seja, enquanto uma parcela do público deseja uma experiência cinematográfica intensa e rica em significados, outra parte, igualmente legítima, busca apenas uma pausa da realidade.
A inclusão de Wolverine ao universo de Deadpool, se bem feita, traz potencial para ampliar ainda mais esse universo de forma cômica e única. Wolverine, um dos personagens mais complexos e adorados do universo Marvel, possui uma profundidade e um peso emocional notáveis, enquanto Deadpool é a caricatura em sua máxima expressão. Juntos, eles podem proporcionar uma dinâmica única de contrastes, com cenas de ação que mesclam violência e humor, e diálogos que alternam entre a seriedade de Wolverine e o sarcasmo de Deadpool. Dessa forma, essa nova produção parece desenhar um filme que, de fato, tem como principal objetivo entreter, sem a obrigação de se prender aos parâmetros do “bom gosto” ou do “cinema de qualidade” que muitos críticos defendem.
No entanto, a crítica negativa e rigorosa pode ter origem na visão dos especialistas de que, ao oferecer um produto de entretenimento de massa descompromissado, os estúdios estão, de alguma forma, banalizando o cinema. Nesse contexto, alguns críticos argumentam que a popularidade de filmes como Deadpool representa um enfraquecimento da qualidade média das produções, incentivando um público menos exigente e mais passivo. Essa visão, porém, pode ser vista como elitista e distanciada da realidade, pois ignora que o cinema, em essência, também é um meio de entretenimento e que, ao longo da história, sempre houve espaço tanto para obras leves e divertidas quanto para produções profundas e artísticas. Ignorar essa dualidade é desconsiderar a diversidade cultural e a multiplicidade de experiências que o cinema pode proporcionar.
Para o público, especialmente os fãs de longa data dos personagens, ver Wolverine e Deadpool juntos em tela é um evento esperado e desejado. Filmes de super-heróis, especialmente os mais irreverentes, como Deadpool, oferecem uma experiência coletiva, onde o prazer está tanto nas cenas de ação e nas piadas quanto na interação com os outros espectadores. Essa sensação de pertencimento, de estar conectado com uma comunidade que compartilha os mesmos interesses e aprecia o mesmo humor, é uma parte crucial da experiência cinematográfica para muitos. E talvez isso explique por que, para o público, críticas rigorosas e desfavoráveis parecem desnecessárias – não se trata de uma obra de arte clássica, mas de um filme feito para ser desfrutado.
Portanto, embora a crítica cinematográfica tenha sua importância e o seu lugar, ela precisa reconhecer que nem todas as produções se destinam a serem profundas ou tecnicamente impecáveis. Filtrar cada filme por uma lente de alta exigência artística pode desconsiderar o valor cultural e social das obras mais leves e irreverentes, que cumprem seu papel ao proporcionar alegria, distração e diversão. Ao final, o sucesso de Deadpool e a popularidade de filmes de super-heróis de um modo geral revelam a necessidade de uma crítica que saiba distinguir e valorizar as diferentes propostas do cinema. Filmes como Deadpool são uma celebração do absurdo, do exagero e da diversão; e seu mérito está, precisamente, em abraçar esses elementos, oferecendo ao público exatamente o que ele procura: um escape prazeroso e descomplicado.