David Fincher é um dos atuais gênios de Hollywood. Cada trabalho seu eleva seu estilo a um patamar ainda mais alto do que o anterior, e Garota Exemplar não é diferente.
O filme une as principais características do diretor, a começar pelo visual. O cuidado com o cenário é exemplar, trazendo detalhes interessantes para a maneira como vemos o filme. Pequenos itens que, ao final da trama, se mostram pertinentes, como um jogo com título Mastermind, por exemplo. A fotografia também traz um peso importante para o filme, deixando-o cru, real, dando destaque para os atores quando necessário, sempre uma aliada do diretor.
Falando em atores, há uma entrega elevada nos papéis principais. Rosamund Pike (Amy Dunne) te convence em todos os momentos, mostrando que há muito mais camadas na personagem do que podemos ver superficialmente, a verdadeira “Mestre da mente” do filme. Suas cenas solitárias são um verdadeiro destaque, hora nos deslumbrando, hora nos assustando. Ben Affleck (Nick Dunne) também não fica para trás, fazendo um balanço perfeito entre o marido tranquilo, o traidor e o cara entregue ao necessário para atingir seus objetivos, principalmente nas interações com a sua irmã. E o elenco de apoio não deixa de ter destaque, desde a irmã do personagem de Ben, interpretada por Carrie Coon (se destacando em sua relação com o irmão), até a detetive Rhonda, interpretada por Kim Dickens, e seu auxiliar.
Outro destaque interessante é a maneira como Fincher gosta de contar suas histórias, misturando passado e presente, mesclando cenas de diferentes linhas temporais, pontos de vista opostos, tornando o enredo mais rico e conectado, algo essencial para a trama do filme, que acaba tornando as 2h30 do filme em algo mais prazeroso e menos cansativo. Por fim, temos a maior característica de Fincher, que está na exploração da psique humana. Seus personagens são sociopatas, criaturas filosóficas, desafiadores da sociedade, e Garota Exemplar nos entrega isso claramente. O desenvolvimento da história nos apresenta uma quebra de linhas de raciocínio constante, sempre na figura da personagem de Pike, fazendo com que nós nos sintamos como no começo do filme: estupefatos com o acontecimento e sem saber do que tudo se trata, afinal. Apesar do tempo longo e algum possível excesso desse recurso, o filme em nenhum momento realmente cansa, trazendo um ar renovado com cada uma dessas quebras. A história também consegue se manter diferente durante praticamente todo seu enredo, trazendo uma perspectiva interessante da relação entre o casal, apesar de aqui termos o único revés do filme: a maneira como a mulher é mostrada. Embora seja um caso possível, o filme pode fomentar uma discussão não saudável entre parte do público, especialmente o masculino.
Garota Exemplar nos veio com o slogan “Você não sabe o que tem até que…”. Após a sessão, não tenha dúvidas de que este será o seu sentimento. De dúvida, de perda, de que algo passou, e você só percebeu o quanto era grande após acabar. A garota exemplar vai te corroer como corroeu ao personagem de Affleck, e não há nada que você possa fazer. No final, acabará sentindo falta e querendo mais um pouco daquela sociopatia que Fincher sabe utilizar tão bem.