"Procurando Dory", filme que volta os holofotes à peixinha que roubou a cena em "Procurando Nemo", tem seu inicio um ano após os acontecimentos do primeiro filme.
A repetição do título não foi devido à falta de criatividade dos animadores da Pixar (criatividade é o que não falta àquela equipe). Mas, se no primeiro filme havia literalmente a procura desesperada de um pai pelo filho, perdido recentemente; agora, ocorre a procura de uma filha perdida dos seus pais há um longo tempo.
E justamente por isso a necessidade do título "Procurando Dory", porque através dessa procura, e do reencontro com suas origens, Dory finalmente conseguirá se encontrar.
Para que isso seja possível alguns insights fornecem recordações afetivas da infância da peixinha com problema de memória. Para Dory, essas lembranças funcionam como peças de um quebra-cabeça para ser construído no decorrer dessa busca.
Há nas entrelinhas do filme uma abordagem psicológica interessante sobre a importância da catarse no processo de consolidação de memórias afetivas.
Em sua definição etimológica a palavra "catarse" vem do grego – kátharsis – significando purificação, purgação, alívio da alma por meio de uma descarga emocional provocada por um drama.
De acordo com a psicanálise, a catarse tem a capacidade de trazer à consciência memórias recalcadas no inconsciente, libertando a pessoa em análise de sintomas psiconeuróticos associados a algum bloqueio.
É muito interessante perceber em uma animação, destinada ao público infantil, essas metáforas e sutilezas que passam despercebidas ao grande público.
Dory, além de caracterizar todo individuo que precisa de autoconhecimento, e sente-se perdido em um oceano com milhares de seres, mas que não lhes despertam identificação, não refletem sua identidade. Também funciona como um simbolo de resistência, que luta obstinadamente para preservar memórias e sentimentos, priorizando o reforço positivo às boas lembranças e lutando contra o esquecimento.
É o que torna Dory tão adorável, especialmente nos dias atuais, em que temos a sensação que os sentimentos são descartáveis e que há pouco empenho na manutenção das lembranças e do amor. E sem ter conhecimento dessas questões filosóficas. Ela apenas continou a nadar...obstinadamente!
Se a nossa heróica peixinha Dory, mesmo com as limitações de sua memória, soube fazer um bom uso de episódios catárticos e obteve condições para tomar consciência de si mesmo, de sua situação no mundo, de suas origens e de seu destino.Também devemos utilizar a catarse ao nosso favor, seja para o autoconhecimento, evolução emocional e principalmente para mantermos vivas em nossas lembranças as pessoas que amamos.