Até o ano de 2009 J.J. Abrams não era um cineasta com muita visibilidade. Claro que o nova-iorquino já havia participado de grandes produções: em Armagedon (1998) Abrams roteirizou o filme; Já em Missão Impossível 3 (2006) ele o dirigiu e em 2008, no seu último trabalho antes de entrar no comando geral de Star Trek (2009) o diretor foi produtor de Cloverfield — Monstro. Sendo assim, quando anunciado diretor da nova aventura intergaláctica, os haters automaticamente começaram a brotar, duvidando da capacidade de Abrams. Quando entregou o seu material, o diretor calou a boca de muitos, mas outros tantos continuaram a desaprovar a produção de J.J. Essa divisão de águas, infelizmente só é da parte dos fãs; do público em geral e da crítica especializada são poucos que não gostaram. Por que, afinal, Star Trek é o que deveria ser: uma aventura fascinante.
E tratando-se do fã saudoso que pretende assistir ao filme com a intensão de odiá-lo, este pode dar meia volta e abandonar a sessão. Reboots ou remakes são inevitáveis nesse novo século. Essa é a principal fonte de Hollywoody e uma franquia tão famosa quanto Star Trek não poderia fugir das suas mãos. E o que esse fã saudoso deve fazer? Agradecer! Por que Abrams, fã de carteirinha de ficção científica, traz de volta toda a gloria da franquia para os cinemas e oferece um motivo plausível para se começar do zero — o que se deve também ao roteiro de Alex Kurtzman.
Quanto a trama que é desenvolvida pelo roteiro de Kurtzman, trata-e do jovem James T. Kirk (Chris Pine), um adolescente rebelde inconformado com a morte de seu pai. Kirk então resolve, a convite, integrar a nova formação de cadetes da Frota Estelar. Contudo, Kirk acaba demonstrando que não domina o mesmo talento de seu pai e sua vida na Federação piora quando conhece Spock (Zachary Quinto), um vulcano que deixou seu planeta por ser metade humano. Spock e Kirk começam a conviver e a partir da primeira missão ambos tentarão salvar a galáxia da ameaça que é o Comandante Nero (Eric Bana).
Querendo ou não Abrams não poderia ter feito melhor. Com maestria e perfeição, ambas dignas de fã da franquia, Abrams une agradavelmente o novo ao velho — e com todo o respeito possível ao material original. Respeito esse que se torna gritante nas cenas inicias do longa, quando o diretor traz para as telas a transposição da franquia para o novo século numa das cenas mais emocionantes.
O desenvolvimento dos personagens é perfeito. Abrams e o diretor Kurtzman possuem apesar de tudo paciência. E ao longo de apenas duas horas conseguem desenvolver todos os núcleos — do mais importante ao menos útil — com proeza. O tempo é o fio condutor desta história, e através dele acompanhamos o jovem rebelde Kirk e Spock vivendo preconceito em seu planeta até o momento chave em que a produção os une e confronta as suas principais diferenças: a inteligência de Spock e a impulsividade de Kirk. O roteiro trabalha essa controversa relação e os personagens que contem boas introduções já caem nas graças do público.
Mas claro que Pine e Quinto, que contribuem para o longa com ótimas atuações, não são os únicos merecedores de toda atenção. Os demais coadjuvantes, como Leonard Bones (Karl Urban) e Uhura (Zoe Saidana) são tão desenvolvidos quanto os protagonistas e a dinâmica do grupo consegue ser trabalhada da melhor forma possível.
Dito isso vamos para o vilão de Eric Bana. No começo, talvez, possa parecer um vilão nada impactante com uma motivação bastante clichê. Porém, da metade do filme para frente Abrams explode nossas cabeças com o plot twist e o personagem de Bana tem uma das melhores motivações entre os personagens presentes no longa e toda a composição errônea do personagem — como ser vilanesco demais — são deixadas de lado e ele recebe certa profundidade. Ponto alto para Eric Bana, que se tornou irreconhecível no papel de antagonista.
O roteiro de Kurtzman é excelente! Faz tudo ao seu tempo: desenvolvimento dos personagens, a passagem dos atos, o clímax, os panos de fundo que o roteirista usa como o tempo e as guerras entre nações. Kurtzman trabalha tudo isso num único filme e de longe se torna confuso e sempre consegue reverenciar o material original no qual se baseia.
Essa "reverência" cabe também a Abrams. E o diretor não poupa esforços: não só homenageia Star Trek — trazendo Leonrd Nimoy de volta para o seu papel original — como também Star Wars, já que é também fã desta franquia. Não há como lembrar em duas cenas específicas de Kirk da cena inicial de Luke Skywalker em O Império Contra-ataca (1980) e de Obi-Wan Kenobi em Guerra nas Estrelas (1977).
Comédia e piadas engraçadas também norteiam pela atmosfera do filme. Isso já era esperado, de fato, já que em Hollywoody comédia se anda bastante com ação a série original e os filmes nunca obtiveram um ar sombrio — apesar de tudo, as produções do século XX sempre tinham um ar eleve e se vistas hoje, humorístico.
Com Star Trek a franquia de Gene Roddenberry volta com todo fôlego para os cinemas e marca um dos auges de J. J. Abrams. Uma aventura dinâmica de tirar o fôlego, Star Trek, de 2009, honra aos velhos fãs e usa de uma nova linguagem — muito boa, aliás — para atrair o novo público.
Nota: 10/10