⚠ TEM SPOILERS ⚠
O Exorcista (The Exorcist) 1ª Temporada - 2016
"O Exorcista" é uma série de televisão americana criada por Jeremy Slater (roteirista das séries "The Umbrella Academy" e "Cavaleiro da Lua") para a Fox, onde teve a sua estreia em 23 de setembro de 2016. A série é inspirada (baseada) de forma vaga na obra-prima literária de William Peter Blatty, e funciona como uma possível continuação do clássico "O Exorcista" (1973), do saudoso e eterno William Friedkin, além de ignorar as várias sequências do filme. A série é estrelada por Alfonso Herrera e Ben Daniels como uma dupla de exorcistas que investigam casos de possessão demoníaca.
Sobre o livro:
Em outubro do ano passado eu li pela primeira vez o icônico livro de 1971, "O Exorcista". Foi uma experiência sombria, incomoda, obscura, tenebrosa, diferente de tudo que eu já vivi literariamente. O livro "O Exorcista" é uma obra que mexe com a nossa mente, que mescla o sagrado, o profano, o ceticismo, a fé, a crença, juntamente com o investigativo e um estudo das camadas do ser humano ao ser exposto ao seu limite mental e espiritual. Uma obra completamente imersa no terror psicológico, no terror sobrenatural, onde temos um embate entre a ciência e a fé, além sermos confrontados com o ocultismo, o mistério, o suspense e obviamente o terror. Definitivamente o livro é uma obra sombria, macabra, soturna, um terror sobre o bem e o mau, Deus e o demônio, e principalmente sobre a renovação e o poder da fé. Posso afirmar com 100% de certeza que a obra de William Peter Blatty está simplesmente entre os maiores livros de terror de todos os tempos.
Sobre o clássico:
"O Exorcista" é um filme completamente fiel com a obra literária, muito bem adaptado, que consegue nos inserir com bastante propriedade no terror sobrenatural, psicológico, sombrio, nos causando um certo nível de tensão, desconforto, medo e repulsa. "O Exorcista" é mundialmente conhecido como o maior filme de terror do século XX, cuja influência foi extremamente significativa na cultura pop e diversas publicações o consideram um dos maiores filmes de terror já feitos. Uma obra categórica, apoteótica, pioneira, influente, revolucionária, um verdadeiro marco na história do cinema, que virou referência sobre o gênero terror e possessão. Dentro do meu conceito cinematográfico, "O Exorcista" é simplesmente o MAIOR filme de terror da história do cinema.
Sobre a série:
Confesso que na época em que a série foi divulgada eu fiquei muito curioso em como iriam retratar uma história tirada do clássico "O Exorcista". Logo eu fiquei com um pé atrás, pois sinceramente eu nunca confiei em seriados de obras clássicas, em que na sua grande maioria por si só elas já são irretocáveis e autossuficientes. Porém, antes de conferir a série eu queria ler o livro e revisitar o clássico, coisa que eu fui postergando até este momento, e que de fato aconteceu.
Realmente a série tem uma premissa muito interessante, já que no início conhecemos toda ambientação soturna e sombria, juntamente com uma fotografia que traz um foco ambientado em um cenário acinzentado, macabro, com um tom morto, denso, obscuro, que logo casa com uma trilha sonora potente, estridente, incomoda, que logo dita o ritmo exato que foi projetado pelo roteiro. É um início bastante motivador!
Destacando cada episódio:
O primeiro episódio se encarrega em apresentar cada personagem da história, onde logo conhecemos o Padre Tomas Ortega (Alfonso Herrera) e o Padre Marcus Keane (Ben Daniels). Logo após conhecemos a família da Angela Rance (Geena Davis), que é composta por suas duas filhas, Casey Rance (Hannah Kasulka) e Katherine "Kat" Rance (Brianne Howey), e seu marido Henry Rance (Alan Ruck). Nesse episódio temos uma cena marcante da série, que é a cena do exorcismo do garoto Gabriel que está sendo executada pelo Padre Marcus - de fato é uma cena tecnicamente muito bem feita. Logo em seguida vamos conhecendo mais a respeito dos dois Padres em questão, já que temos um grande embate de ideias e opiniões entre eles, onde o Padre Marcus se mostra extremamente perturbado e traumatizado com o trágico exorcismo do garoto Gabriel. Por outro lado já observamos que o Padre Tomas se mostra inexperiente e assustado com tudo que começa a acontecer com a garota Casey. O primeiro episódio termina ao som da icônica e lendária trilha sonora clássica de "O Exorcista", "Tubular Bells", de autoria de Mike Oldfield.
No segundo episódio já temos o início de todas as suspeitas envolvendo a garota Casey, em ela estar realmente possuída ou não. Tanto que o Padre Tomas vai em busca da Igreja com auxílio de vídeos para estudar a possibilidade de um exorcismo. Novamente estamos diante de uma caso de possessão, mas que a indicação inicial não é um exorcismo e sim uma sessão se terapia, ou algo do tipo. É nesse episódio que conhecemos aquela espécie de seita que fazem chacina e roubam os órgãos das vítimas. A partir daí a série segue nos mostrando mais a respeito da história do Padre Marcus, onde ele mostra ter uma personalidade muito forte, já que ele é muito enfático em seus objetivos de conseguir algo e provar algo. Como na cena em que ele consegue arrancar de dentro da Casey a presença do demônio. Por outro lado ele é visto como impostor pela diocese, o que culmina com a sua excomunhão vindo direto de Roma, por ele ter apontado uma arma para um colega Padre e conduzir um exorcismo que resultou na morte de uma criança. Já o Padre Tomas só observa tudo acontecer de fora, como se não entendesse a gravidade dos fatos, ou não soubesse como agir por inexperiência. No terceiro episódio que temos aquelas revelações sobre o passado de Kat envolvendo a Julia e o acidente de carro. Nesse mesmo episódio temos aquela cena no metrô, onde a Casey tem uma performance que me remete a Carrie (da lendária franquia de filmes baseado no icônico livro do mestre King).
No quarto episódio é onde estamos diante da Angela pedindo por um exorcismo em sua filha para o Padre Tomas, o que já me soava bastante estranho essa sua atitude. Já o Padre Tomas inicialmente recusa o pedido da Angela, mesmo com a já autorização do Bispo. Enquanto isso a Casey é submetida à inúmeros exames médicos desnecessários, já que ela está piorando cada vez mais e o seu problema não é médico. O Padre Marcus busca mais informações com a Freira chefe do convento, e ele passa por uma espécie de treinamento de exorcismo, para que ele entenda mais sobre como lidar corretamente com o caso, sem forçar a vítima até a morte, como aconteceu com o garoto Gabriel. No fim, ele consegue realizar o exorcismo do rapaz corretamente. A partir daí, o Padre Tomas solicita a ajuda do Padre Marcus no exorcismo da garota Casey, e logo eles começam a preparar o local do exorcismo na casa da família Rance.
No quinto episódio é onde temos a primeira tentativa de exorcismo na Casey. É uma cena muito boa, até por destacar aquela maquiagem pesada na Hannah Kasulka durante a possessão, e a sua performance também se destaca nessa cena. Como sempre acontece em sessões de exorcismo, o demônio se utiliza da vítima para relembrar os traumas e o ponto fraco do Padre Tomas, como no caso da Jessica (Mouzam Makkar). Já com o Padre Marcus o demônio ataca revivendo a figura de sua mãe, que diz que deveria ter abordado ele enquanto teve chances. Nesse episódio temos aquela cena da Casey na ambulância, que é bizarra. E possivelmente a maior revelação da série; quando a Angela revela para o Padre Tomas, durante uma conversa, que ela é a lendária Regan MacNeil do clássico. Ao mesmo tempo que temos uma espécie de homenagem da icônica cena de "O Exorcista", quando o Padre desce do Táxi e se porta bem na frente da casa, dessa vez é a Chris MacNeil (Sharon Gless), a mãe da Regan, que faz exatamente esta cena ao chegar na casa da filha.
A partir do sexto episódio é onde temos a dimensão de uma provável continuação da história do clássico "O Exorcista", já que o episódio se inicia nos mostrando os flashbacks de quando a mãe da Regan usava o caso de possessão da filha para lucrar um dinheiro, sendo com livros, entrevistas de Tvs, onde claramente a Regan não se sentia a vontade, pelo contrário, ela ficava visivelmente incomodada com esta situação imposta pela mãe. Esta é uma parte da série extremamente curiosa, já que nós da velha guarda não tivemos o conhecimento desses acontecimentos após o término da possessão da Regan, até porque são fatos novos criados exclusivamente para a série. E todos esses novos acontecimentos com relação ao passado da Regan e da Chris é criado para dar o contexto do atual relacionamento entre mãe e filha, já que a Regan tem uma relação muito difícil com sua mãe, ao ponto de ter falado para sua família que ela estava morta há muito tempo, pois a Regan senti um profundo ressentimento da mãe por tê-la usada com seu caso de possessão para alavancar sua carreira de atriz e ganhar dinheiro. Diante desses novos fatos fica muito claro o porque que a Angela (Regan) acreditava que sua filha estava realmente possuída desde o início, e que não era uma problema médico, já que ela sempre foi a Regan MacNeil e já havia passado por tudo que sua filha estava passando.
No sétimo episódio temos o destaque da grande repercussão midiática que deu esse caso de possessão da Casey, onde seus familiares foram encarados quase como celebridades, ainda mais com a volta do caso Chris e Regan. Nesse episódio o Padre Bennett (Kurt Egyiawan) tem uma bom destaque. Já o Padre Tomas resolve se entregar para a Jessica, enquanto a Casey está extremamente debilitada e é finalmente exorcizada pelo Padre Marcus dentro do lago.
No oitavo episódio temos mais revelações envolvendo aquela seita demoníaca, que acaba tomando uma vaga proporção dentro da série (muito questionável, por sinal). O episódio segue com a Casey já exorcizada e se recuperando no hospital. O padre Tomas é punido e afastado pela igreja por cometer adultério, enquanto o padre Bennett cai em uma emboscada. No final desse episódio é quando, no meu ponto de vista, as coisas começam a desandar dentro da série; quando temos a cena com a Angela/Regan torcendo o pescoço de sua mãe e ela caindo da escada.
O nono episódio da série é onde temos mais dúvidas e questionamentos em relação a Angela/Regan. Ela apresenta comportamentos cada vez mais estranhos e suspeitos, na medida que ela ataca sua família fazendo todos de reféns em sua casa, e logo após ela mata a Abadessa no convento. Estaria Regan MacNeil novamente possuída pelo demônio Pazuzu? O ponto mais questionável e curioso, é quando ela afirma que dessa vez não se trata de uma possessão e sim de uma integração entre ela e o demônio. A partir daí a Regan age inteiramente como se ela e o demônio tivessem se integrado e se tornado um só - Bizarro!
O último episódio é bem fraco, a começar por aquela espécie de reunião familiar destrutiva imposta pela Regan. Acredito que a parte positiva desse episódio é unicamente com a parte final do Padre Tomas e o Padre Marcus, pois eles foram os únicos que seguraram bem o último episódio. Estou curioso para saber como será este treinamento que o Padre Marcus fará com o Padre Tomas, para que ele vire um exorcista, já que foi um pedido do próprio Padre Tomas e o Padre Marcus aceitou ficar.
Pontos positivos dessa primeira temporada:
A ideia de composição da série é boa, pois podemos perceber que inicialmente a série consegue demonstrar aquela essência que vem diretamente da franquia de "O Exorcista". Querendo ou não, ao assistir a série a gente se pega revivendo acontecimentos ligados ao filme clássico ou até a obra literária - isso é um ponto muito positivo! incluindo as partes técnicas dessa primeira temporada, que eu já destaquei anteriormente, como ambientação, fotografia, enredo e trilha sonora.
Pontos negativos dessa primeira temporada:
Começando pelo roteiro, que obviamente se divide em dois pontos, um bom e outro péssimo. O acerto inicial do roteiro está justamente em criar uma temática para a série que está diretamente inserida dentro do universo de "O Exorcista", incluindo a sua atmosfera sombria e macabra. Acredito que se a primeira temporada tivesse seguido unicamente por este caminho, que engloba uma família que teve a sua filha possuída pelo demônio nos mesmos moldes do que aconteceu com a história original, ficaria uma história muito boa e muito mais relevante e aceitável. O maior erro do roteiro, que eu considero uma péssima escolha, é o fato de optarem por construir uma ligação verdadeira com a história original e não ficar somente no terreno do inspirado/baseado, que na minha opinião seria o certo.
A partir do momento que temos a revelação de que a Angela é a verdadeira Regan MacNeil, é onde a série despenca, cai completamente de produção e relevância. Pois a partir daí, nós que conhecemos a história original vamos buscar coerência em praticamente tudo. Sem falar que apresentação da atriz Geena Davis enquanto Angela é aceitável, dentro da questão de mãe desesperada por não saber o que de fato está acontecendo com sua filha. Porém, a partir do momento que ela revela ser a Regan, ela fica péssima, com uma atuação caricata demais, canastrona demais, grotesca demais, querendo se impor, com um ar de poderosa, de soberana, que ficou absurdamente péssimo. Sem falar que essa história de integração com o demônio (ao invés de possessão) é muito ruim, mal interpretada, onde a atriz está nitidamente sofrível para conseguir se impor como um ser soberano sobre os humanos.
Continuando com os pontos negativos:
Aquela cena com a Regan integrada com o demônio se exibindo para sua família, é bizarramente ruim, desnecessária, mal planejada, mal trabalhada, com atuações sofridas e um desfecho final inteiramente questionável. Sem falar que a forçação de barra nessa cena é ainda maior quando decidem que a Regan integrada obteve poderes no maior estilo X-Men. O CGI é um ponto técnico completamente negativo. Outro ponto: tentaram elaborar algumas histórias paralelas para dar mais contexto para a temporada, que no fim ficou com desfechos rasos e perdidos; como no caso daquele grupo, que mais parece uma seita demoníaca, que ainda não mostrou a que veio, talvez na próxima temporada.
Sobre o elenco:
Alfonso Herrera (protagonista da telenovela mexicana "Rebelde") está muito bem como o Padre Tomas, pois ele conseguiu expor aquela veia de personagem inexperiente, indeciso, confuso, muita das vezes até perdido em sua própria história. Todavia, seu personagem vai em uma crescente dentro da temporada, e no fim ele se torna bastante convincente.
Ben Daniels ("House of Cards") é outro que conseguiu compor muito bem o seu personagem Padre Marcus. O Padre Marcus foi o contraponto do Padre Tomas, e ambos funcionaram perfeitamente dentro das suas proporções de roteiro. Ben Daniels conseguiu demonstrar a figura daquele Padre incisivo, categórico, enfático, que nunca se dava por vencido, que não se vendia e sempre acreditava em seus princípios. Alfonso Herrera e Ben Daniels para mim foram os dois melhores de todo o elenco da série nessa primeira temporada.
Hannah Kasulka ("The Rookie") faz um trabalho modesto que até se destaca em algumas cenas. Acredito que ela compôs bem a figura da Casey, a garota possuída, e conseguiu uma atuação convincente, principalmente nas cenas de possessão.
Brianne Howey ("Ginny e Georgia") traz uma personagem que mostrou ter bastante potencial, mas foi completamente subaproveitada. A personagem Kat se destaca apenas por ser a irmã da filha possuída da Regan MacNeil, pois ela apenas compõe o elenco, quando na verdade eu achei que ela fosse ter mais destaque baseado naquele acidente de carro.
Alan Ruck ("Succession") traz seu personagem na mesma linha da Brianne Howey, ou seja, compor o elenco familiar como o pai de família. Seu personagem Henry Rance até mostra um certo destaque, principalmente nos embates com sua esposa Angela, mas como um todo é bem vago e sem grande influência.
Sharon Gless ("Burn Notice") faz a Chris MacNeil, que na minha opinião é a personagem mais sem sentido de toda temporada. Ela chega na série com um pé na porta, ao reviver uma cena icônica do filme clássico, mas também é só. De resto ela serve como bode expiatório da Regan, troca algumas farpas com a filha, revive o passado e tem uma morte absurdamente ridícula.
Geena Davis ("Grey's Anatomy") eu já destaquei perfeitamente o que ela representa para essa temporada. Como Angela Rance ela convence e vai muito bem, como Regan MacNeil é simplesmente péssima.
Considerações finais:
Esta primeira temporada de "O Exorcista" tem seus altos e baixos, pois a série inicia dentro de uma proposta, que é reviver um universo extremamente cultuado e glorificado do maior filme de terror de todos os tempos. E até a metade da temporada a série vai muito bem dentro dessa proposta. Porém, a partir do sexto episódio a série toma um outro rumo, deixa de lado a essência e a atmosfera do filme original para embarcar em uma espécie de mitologia, indo para o campo das seitas demoníacas, saindo da possessão para a integração, e com representações de forças sobrenaturais exageradas.
Não classifico a série como desnecessária (como muitas pessoas classificaram), acho que a série tinha muito potencial, porém foi mal utilizada nessa temporada. Acredito que a série inicia dentro da proposta mas encerra como algo que nunca foi e sequer precisava seguir por este caminho. É uma boa série em que a primeira temporada consegue honrar o nome do maior filme de terror da história até os cincos primeiros episódios, pois a partir daí a série perde completamente a mão, beirando o grotesco nos dois últimos episódios. Uma pena que a série foi cancelada pela Fox em sua segunda temporada, pois eu realmente acreditava que a série poderia melhorar ainda mais. O que me resta é conferir os 10 episódios da segunda e última temporada.
- 29/03/2024