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    O Que Ficou Para Trás: Crítica do filme de terror da Netflix

    O Que Ficou Para Trás inova ao metaforizar os horrores da imigração utilizando o subgênero das casas mal-assombradas.

    NOTA: 3,5 / 5,0

    Nos últimos anos, o terror vem potencializando a sua capacidade de abordar inúmeros conflitos sociais. Mais do que nunca, cineastas utilizam o gênero para expressar as maiores angústias da humanidade, como o racismo e a violência. Não se engane, este sempre foi o papel do horror. Contudo, filmes como Corra! — de Jordan Peele — e Uma Noite de Crime estão ajudando a popularizar o aspecto político dessa vertente cinematográfica.

    Agora, O Que Ficou Para Trás se torna a obra mais recente a embarcar neste movimento. Distribuído mundialmente pela Netflix, o primeiro longa de Remi Weekes é a prova de que o terror vem assumindo um viés muito mais reflexivo. Ainda há espaço para os títulos mainstream como Invocação do Mal e Sobrenatural. Porém, além de tomar sustos, o público deseja ter uma experiência complexa, que converse com os tempos atuais.

    Se isso é o que você procura, His House irá agradar. A trama acompanha Bol (Sope Dirisu) e Rial (Wunmi Mosaku) buscando abrigo na Inglaterra após fugir do Sudão, que estava em guerra. Ao desembarcar em terras inglesas, o governo lhes oferece uma residência e tudo parece um sonho.

    No entanto, o recomeço se transforma em um pesadelo quando o casal descobre que a nova casa está assombrada por espíritos malignos. Ao tentar escapar da moradia, as autoridades questionam as motivações da dupla, e os riscos de deportação aumentam. Por isso, eles devem enfrentar a ameaça paranormal sozinhos, sem levantar grandes suspeitas dos órgãos de fiscalização.

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    Como drama social, o filme é eficaz. Há um senso de injustiça constante pairando sobre a história desde os primeiros minutos. O sistema de imigração — apesar de útil — está longe de ser acolhedor. Os refugiados sofrem desde o momento em que precisam abandonar seus lares, e esse desespero não é aliviado pelas pessoas responsáveis por ajudá-los.

    Muito pelo contrário: para conseguir manter a estadia no país, Bol e Rial não podem trabalhar para completar a renda, ter animais de estimação ou até receber amigos em casa. Para nós, todas essas atividades são banais e inerentes ao exercício da cidadania. Porém, para os imigrantes, o básico se torna um privilégio.

    Felizmente, Remi Weekes consegue capturar tudo isso sem soar panfletário. Não apenas o cineasta denuncia a precariedade dos sistemas migratórios, como também cutuca a ferida da xenofobia. Admitindo ou não, todos nós sustentamos traços e comportamentos que perpetuam o preconceito com o estrangeiro. His House os evidencia, e provoca o espectador a se colocar em posições que nunca pensou em ocupar.

    Inclusive, a obra não poderia chegar em um período mais oportuno, já que estamos vendo líderes mundiais construindo muros para isolar populações, e os chineses vêm se tornando alvos de ataques racistas desde o início da pandemia.

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    Porém, nem tudo é perfeito: como filme de terror, O Que Ficou Para Trás não abre espaços para a subjetividade. Os espíritos aparecem frequentemente durante o longa, e em certo momento, nos acostumamos com os rostos macabros que habitam a casa. Ao banalizar o sobrenatural, a experiência perde boa parte de sua tensão.

    Além disso, a produção falha em criar uma atmosfera ambígua. As respostas são rapidamente entregues ao público, e acabam simplificando uma experiência que poderia ser mais engenhosa.

    A revelação do passado do casal reitera a culpa que muitos refugiados carregam por sobreviver, e expandem o sentimento de não pertencimento que a obra tanto almeja passar ao público. Contudo, ao explorar o horror, a produção não alcança a mesma relevância e inventividade.

    Mesmo assim, His House entrega bons resultados. Mais autoral e menos apegado às convenções do terror, a nova aposta da Netflix inova ao trazer uma abordagem inédita ao subgênero das casas mal-assombradas. Desta vez, os fantasmas não são apenas consequências diretas da morte. Agora, as aparições também são reflexos de um passado traumático que precisamos aceitar para superar.

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