Nesta terça-feira, o AdoroCinema foi conferir dois documentários no festival É Tudo Verdade 2015, e o resultado não poderia ser mais distinto: um filme pretende ser sombrio e profundo, mas não explora muito o seu tema; e o outro, ao contrário, esconde uma incrível complexidade por trás da aparência leve. Os dois estão presentes na competição oficial.
Pátria amada
O filme mais interessante, sem dúvida, foi o documentário nacional Caminho de Volta, de José Joffily e Pedro Rossi. Os diretores acompanharam duas histórias de brasileiros morando no exterior há décadas, ambos confrontados com o retorno ao país. São casos muito particulares: a idosa Maria do Socorro dedicou 24 anos a morar com o filho adulto em Nova York, mas passa os seus dias dentro de casa e não fala uma palavra de inglês. Quando ele se casa, ela é obrigada a voltar ao Brasil. Já o fotógrafo André Câmara sofre com a crise econômica em Londres e decide trazer a esposa inglesa com os filhos para seu país natal.
Com um olhar atento e carinhoso, os diretores retratam o modo como estas pessoas lidam com a cultura alheia, como pensam no retorno ao país, e de que modo o exílio correspondeu (ou não) ao sonho de prosperidade. Repleto de cenas memoráveis (a discussão de André com a esposa no quarto do casal, a conversa de Maria do Socorro com o filho ao som de "New York, New York"), o filme não fornece respostas fáceis nem apela aos clichês do estrangeirismo, deixando os afetos e dúvidas surgirem dos momentos mais banais.
Uma doce poesia domina toda a narrativa deste belíssimo documentário, que pode ser considerado desde já um dos melhores filmes do ano.
Culpada ou inocente?
Chamada de Emergência foi apresentado pelo diretor Pekka Lehto como "um Twin Peaks finlandês". Apesar do ambiente sombrio e da história de morte no centro da trama, os dois filmes não poderiam ser mais diferentes. No caso do documentário, o cineasta retrata uma história real, mas difícil de acreditar, relacionada a um crime no país. Após a morte de um pai de família, a esposa Anneli Auer é acusada do assassinado, e de ter simulado como álibi a invasão de um homem pela janela da casa.
O filme segue dezenas de reviravoltas, umas mais absurdas que as outras, envolvendo erros de análise, interpretações abusivas, sensacionalismo da mídia, desonestidade dos juízes, manipulação dos filhos de Anneli Auer... O caso vai tão longe que começam a surgir hipóteses de rituais satânicos, abuso sexual, policiais infiltrados no papel de namorados e muito mais. O caso certamente merece a nossa atenção, mas Lethto enfraquece a narrativa ao usar a linguagem do jornalismo sensacionalista, incluindo música sonora assustadora e muitas imagens questionáveis de reconstituição do caso.
O público, pelo menos, parecia muito interessado. Ao final, a plateia cercou o cineasta com dezenas de perguntas sobre a complexa investigação policial, ainda em curso.