Para os fortes
por Francisco RussoA invasão nazista foi um dos momentos mais dolorosos da história francesa, não apenas pela vergonha da derrota imposta pelo exército de Adolf Hitler mas também pela prática colaboracionista de parte da população. Uma situação incentivada pelos próprios alemães, que buscavam um domínio mais tranquilo em um território chave para suas pretensões, mas também instável devido ao histórico de luta dos franceses. Em meio a este cenário, O Mar ao Amanhecer acompanha um evento chave neste relacionamento obrigado entre os dois povos: quando Hitler ordenou o fuzilamento de 150 franceses, já que um oficial alemão havia sido morto em território francês. Típico toma lá dá cá, seguindo os cálculos do Terceiro Reich de que qualquer ariano era superior aos seus semelhantes de outros países.
Bastante didático, O Mar ao Amanhecer tem um roteiro enxuto que acompanha não apenas o passo a passo que levou a esta decisão mas também as dúvidas existentes nos próprios alemães para executá-la. Este inclusive é um dos méritos do filme: ao invés de se prender a estereótipos sobre a rigidez e a ausência de sentimentos do povo alemão, o diretor Volker Schlöndorff mostra que mesmo alguns deles também não resistem ao peso das ordens vindas de Hitler, apresentando uma humanização dos nazistas poucas vezes vista no cinema – A Queda - As Últimas Horas de Hitler é um destes raros casos. Além disto, o roteiro ressalta que a conquista do país não podia se dar apenas através de meios militares, devido à existência de um conflito de âmbito intelectual e cultural entre franceses e alemães. Por mais que este aspecto não seja aprofundado, sua presença amplia o leque de motivações daquele período, mais uma vez fugindo do lugar comum existente na luta entre dominados e dominantes.
Entretanto, o grande trunfo do filme vem da forma como a inevitável cena do fuzilamento é conduzida. Além de ser um tema naturalmente pesado, o diretor opta por apresentá-lo em detalhes, com bastante calma, de forma que o peso da morte se torne cada vez maior até o derradeiro fim. A intenção é que o espectador sinta também a aflição vivida pelos prisioneiros, num crescendo que ganha tons de desespero e coragem.
Diante do peso de seu desfecho, O Mar ao Amanhecer é um filme recomendado apenas para os fortes; aqueles que preferem filmes mais leves e agradáveis devem se manter longe. Trata-se de um filme emocionalmente devastador, devido à sua intenção de fazer com que o espectador sinta toda a dor da decisão tomada por Hitler e dos efeitos provocados nas pessoas envolvidas. Muito bom.