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Série rica em conteúdo desperta no espectador o senso crítico.
Mockingjay é uma palavra criada por Suzanne Collins, a escritora desse estrondoso sucesso literário, a bombástica trilogia Jogos Vorazes. Surgiu da soma de mockingbird, um pássaro que existe na vida real, com jabberjay, esse fictício, criado na Capital, a sede do poder de Panem, nação onde toda a trama se desenrola. Mockingjay, portanto, neste mundo distópico e desesperançado imaginado por Collins, é um pássaro (cujo canto é capaz de reproduzir canções humanas) surgido do cruzamento dessas duas espécies acima citadas, e escolhido pelos rebeldes como o símbolo da revolução. Para tornar tudo mais simples, a versão brasileira resolveu chamar o pássaro inspirador simplesmente de tordo, decisão que pode ter decepcionado muitos, mas, convenhamos, tem lá o seu apelo. Mockingjay também nomeia o terceiro e último livro da série, e para a comercialização nacional, os distribuidores propuseram um título mais, digamos, esperançoso, o que também se aplica, naturalmente, à transposição para o cinema. Ao assistirmos, portanto, Jogos Vorazes: A Esperança - Parte 1, sempre que ouvimos mockingjay ser pronunciado, lemos ‘tordo’ na legenda, o que não interfere em nada na fantástica imersão que o filme oferece a este mundo cinzento e desiludido, mas tão interessante, em que continuamos a acompanhar a trágica jornada de Katniss Everdeen, e a torcer por ela.
Imediatamente após os eventos mostrados no episódio anterior, Em Chamas, Katniss é acolhida pela resistência concentrada no Distrito 13, em que a “dama de ferro” Presidente Alma Coin (Julianne Moore), juntamente com Plutarch Heavensbee (Philip Seymour Hoffman, que recebeu uma citação póstuma nos créditos finais) e Cressida (Natalie Dormer) planejam a elaboração de propagandas a serem divulgadas, de maneira ‘pirata’, por toda Panem, convocando os cidadãos a aderirem à causa rebelde contra a tirania da Capital. Para isso, será necessária a voz de alguém que represente o tordo, a esperança, a revolução... Katniss. Extremamente habilidosa com o arco-e-flecha, mas sem nenhuma intimidade com a câmera ou com a arte de interpretar – em contraste com a já habitual entrega de Jennifer Lawrence a este papel – Katniss, com sua costumeira personalidade forte, não consegue extravasar sua ira em um estúdio, e suas palavras só soarão sinceras se ela realmente estiver em pleno campo de batalha... Essas campanhas serão uma resposta às investidas televisivas veiculadas insistentemente pela Capital, em que o mestre de cerimônias dos Jogos (Stanley Tucci), desta vez muito mais contido, conversa com Peeta (Josh Hutcherson), que supostamente, para desespero de Katniss, teria traído a causa rebelde. Será?
A predominância do cinza na fotografia e nos figurinos que vemos neste longa salienta o delicado e crítico momento da história, em que o colorido espalhafatoso da glamorosa Capital vislumbrado nos dois primeiros episódios não está mais em foco. O espectador pode até tomar um susto ao ver a carismática Effie (Elizabeth Banks), outrora tão adepta de visuais à la Lady Gaga, desta vez surgindo na tela com um lenço escondendo o cabelo raspado e trajando um uniforme que facilmente a confundiria com uma detenta de qualquer sistema prisional brasileiro. Este necessário enfoque em cores tristes é complementado por cenas fortes, que enfatizam o horror do regime comandado pelo Presidente Snow. Quanto a Donald Sutherland, o pouco tempo em cena que lhe foi reservado já é suficiente para confirmar seu irretocável talento para encarnar a vilania, como na curiosa sequência envolvendo uma lâmina de barbear, que remete ao Al Capone de Robert De Niro visto em Os Intocáveis (1987) de Brian De Palma. Vemos ainda o confronto psicológico entre Snow e Katniss, que só aumenta a cada episódio, com palavras incendiárias vindas de ambas as partes.
Contudo, em meio ao cenário caótico da trama, o diretor Francis Lawrence consegue impor momentos contemplativos, de maneira que, ver um gato entretido com a luz de uma lanterna, logo após um ataque aéreo perpretado pelos soldados da Capital, não parece algo tão inoportuno assim, além da clara alusão que a cena faz do controle não apenas político, mas também midiático da Capital sobre os distritos. O roteiro também se ocupou em investir no triângulo amoroso Katniss-Peeta-Gale, deixando clara a instabilidade da heroína ante os assuntos do coração, em que nada está resolvido. Em contraponto, vê-la aderindo de vez à causa rebele, diante das circunstâncias trágicas que a rodeiam e que insistem em levá-la para o meio do conflito, chega a ser comovente, dado esse acúmulo de eventos tensos e aterrorizantes com os quais ela tem tido de lidar, desde que se colocou no lugar de sua irmã Primrose (Willlow Shields), como tributo, com a única intenção de defendê-la. Katniss nunca quis fazer parte de nada disso, mas se tornou involuntariamente a maior esperança da aliança rebelde.
A forte temática política, a acidez da narrativa, o teor angustiante dos desdobramentos e o iminente fim que se aproxima de forma dramática fazem de Jogos Vorazes uma série muito mais rica em conteúdo do que a grande maioria das recentes produções juvenis que o cinema tem apresentado. Seu imenso sucesso, principalmente junto ao público juvenil, vislumbra em quem assiste, ou lê, um grande potencial para o desenvolvimento de um apurado senso crítico. Suzanne Collins, realizadora desta trilogia literária – que ao final do próximo ano terá sido completamente transposta para a tela totalizando uma quadrilogia cinematográfica – já pode se orgulhar por ter dado sua contribuição para a formação de adultos mais conscientes. O tordo, ou mockingjay, que ela criou, quem sabe possa servir de inspiração para muitos, e seja visto também na vida real como um símbolo de resistência, de sobrevivência... e de esperança.
Mockingjay é uma palavra criada por Suzanne Collins, a escritora desse estrondoso sucesso literário, a bombástica trilogia Jogos Vorazes. Surgiu da soma de mockingbird, um pássaro que existe na vida real, com jabberjay, esse fictício, criado na Capital, a sede do poder de Panem, nação onde toda a trama se desenrola. Mockingjay, portanto, neste mundo distópico e desesperançado imaginado por Collins, é um pássaro (cujo canto é capaz de reproduzir canções humanas) surgido do cruzamento dessas duas espécies acima citadas, e escolhido pelos rebeldes como o símbolo da revolução. Para tornar tudo mais simples, a versão brasileira resolveu chamar o pássaro inspirador simplesmente de tordo, decisão que pode ter decepcionado muitos, mas, convenhamos, tem lá o seu apelo. Mockingjay também nomeia o terceiro e último livro da série, e para a comercialização nacional, os distribuidores propuseram um título mais, digamos, esperançoso, o que também se aplica, naturalmente, à transposição para o cinema. Ao assistirmos, portanto, Jogos Vorazes: A Esperança - Parte 1, sempre que ouvimos mockingjay ser pronunciado, lemos ‘tordo’ na legenda, o que não interfere em nada na fantástica imersão que o filme oferece a este mundo cinzento e desiludido, mas tão interessante, em que continuamos a acompanhar a trágica jornada de Katniss Everdeen, e a torcer por ela.
Imediatamente após os eventos mostrados no episódio anterior, Em Chamas, Katniss é acolhida pela resistência concentrada no Distrito 13, em que a “dama de ferro” Presidente Alma Coin (Julianne Moore), juntamente com Plutarch Heavensbee (Philip Seymour Hoffman, que recebeu uma citação póstuma nos créditos finais) e Cressida (Natalie Dormer) planejam a elaboração de propagandas a serem divulgadas, de maneira ‘pirata’, por toda Panem, convocando os cidadãos a aderirem à causa rebelde contra a tirania da Capital. Para isso, será necessária a voz de alguém que represente o tordo, a esperança, a revolução... Katniss. Extremamente habilidosa com o arco-e-flecha, mas sem nenhuma intimidade com a câmera ou com a arte de interpretar – em contraste com a já habitual entrega de Jennifer Lawrence a este papel – Katniss, com sua costumeira personalidade forte, não consegue extravasar sua ira em um estúdio, e suas palavras só soarão sinceras se ela realmente estiver em pleno campo de batalha... Essas campanhas serão uma resposta às investidas televisivas veiculadas insistentemente pela Capital, em que o mestre de cerimônias dos Jogos (Stanley Tucci), desta vez muito mais contido, conversa com Peeta (Josh Hutcherson), que supostamente, para desespero de Katniss, teria traído a causa rebelde. Será?
A predominância do cinza na fotografia e nos figurinos que vemos neste longa salienta o delicado e crítico momento da história, em que o colorido espalhafatoso da glamorosa Capital vislumbrado nos dois primeiros episódios não está mais em foco. O espectador pode até tomar um susto ao ver a carismática Effie (Elizabeth Banks), outrora tão adepta de visuais à la Lady Gaga, desta vez surgindo na tela com um lenço escondendo o cabelo raspado e trajando um uniforme que facilmente a confundiria com uma detenta de qualquer sistema prisional brasileiro. Este necessário enfoque em cores tristes é complementado por cenas fortes, que enfatizam o horror do regime comandado pelo Presidente Snow. Quanto a Donald Sutherland, o pouco tempo em cena que lhe foi reservado já é suficiente para confirmar seu irretocável talento para encarnar a vilania, como na curiosa sequência envolvendo uma lâmina de barbear, que remete ao Al Capone de Robert De Niro visto em Os Intocáveis (1987) de Brian De Palma. Vemos ainda o confronto psicológico entre Snow e Katniss, que só aumenta a cada episódio, com palavras incendiárias vindas de ambas as partes.
Contudo, em meio ao cenário caótico da trama, o diretor Francis Lawrence consegue impor momentos contemplativos, de maneira que, ver um gato entretido com a luz de uma lanterna, logo após um ataque aéreo perpretado pelos soldados da Capital, não parece algo tão inoportuno assim, além da clara alusão que a cena faz do controle não apenas político, mas também midiático da Capital sobre os distritos. O roteiro também se ocupou em investir no triângulo amoroso Katniss-Peeta-Gale, deixando clara a instabilidade da heroína ante os assuntos do coração, em que nada está resolvido. Em contraponto, vê-la aderindo de vez à causa rebele, diante das circunstâncias trágicas que a rodeiam e que insistem em levá-la para o meio do conflito, chega a ser comovente, dado esse acúmulo de eventos tensos e aterrorizantes com os quais ela tem tido de lidar, desde que se colocou no lugar de sua irmã Primrose (Willlow Shields), como tributo, com a única intenção de defendê-la. Katniss nunca quis fazer parte de nada disso, mas se tornou involuntariamente a maior esperança da aliança rebelde.
A forte temática política, a acidez da narrativa, o teor angustiante dos desdobramentos e o iminente fim que se aproxima de forma dramática fazem de Jogos Vorazes uma série muito mais rica em conteúdo do que a grande maioria das recentes produções juvenis que o cinema tem apresentado. Seu imenso sucesso, principalmente junto ao público juvenil, vislumbra em quem assiste, ou lê, um grande potencial para o desenvolvimento de um apurado senso crítico. Suzanne Collins, realizadora desta trilogia literária – que ao final do próximo ano terá sido completamente transposta para a tela totalizando uma quadrilogia cinematográfica – já pode se orgulhar por ter dado sua contribuição para a formação de adultos mais conscientes. O tordo, ou mockingjay, que ela criou, quem sabe possa servir de inspiração para muitos, e seja visto também na vida real como um símbolo de resistência, de sobrevivência... e de esperança.