O cantor, compositor, produtor e instrumentista R. Kelly é um dos maiores nomes do gênero R&B da música norte-americana. Ao longo de sua carreira, produziu e compôs alguns grandes hits. Entretanto, também ao longo de sua trajetória profissional, seu nome sempre esteve ligado a acusações de pornografia infantil. O auge dessa polêmica foi em 2002, quando um suposto vídeo em que Kelly se relacionava com uma menina de 14 anos vazou na Internet. Em decorrência disso, ele foi a julgamento sob a acusação de 21 crimes de pornografia infantil, porém foi inocentado.
Em 2019, na esteira de movimentos como o Time’s Up e a prisão e julgamento de figuras como o produtor cinematográfico Harvey Weinstein (acusado de assédio sexual), os rumores sobre o comportamento de R. Kelly voltaram à tona. A série Sobrevivi a R. Kelly, dirigida por Lyric R. Cabral, é um produto direto da movimentação de iniciativas como Mute R. Kelly e das que foram promovidas por pais de vítimas do cantor.
Ao longo de seis episódios, Sobrevivi a R. Kelly fala sobre a trajetória pessoal e profissional de Kelly, ao mesmo tempo em que retrata que o sucesso de sua carreira foi diretamente proporcional ao comportamento pedófilo e de assédio sexual, emocional e físico que ele cometia junto a jovens menores de idade e, em alguns casos, também maiores de idade. A série documental é bastante rica nos emocionantes depoimentos de vítimas, da ex-mulher, de irmãos, de funcionários e de colegas de trabalho do cantor – que, em algum momento, foram testemunhas ou sofreram na pele com os atos do cantor. Sobrevivi a R. Kelly se torna ainda mais forte quando entra nos testemunhos dos pais de algumas das vítimas, como a família Savage e a família Clary, que viram suas filhas serem seduzidas por R. Kelly e tiradas do convívio familiar.
Em comum entre as vítimas do cantor, o fato de que todas eram da comunidade negra norte-americana. Sobrevivi a R. Kelly faz reflexões interessantes sobre como, apesar disso, R. Kelly nunca foi cancelado (para usar uma palavra da moda) pela comunidade afro-americana (que sempre acolheu o cantor em todas as suas turnês e lançamentos) e nunca sofreu as punições que deveria pelo seu comportamento (e se as vítimas dele fossem garotas brancas?). Por isso mesmo, tudo que assistimos ao longo da série documental nos causa o sentimento de nojo. Nojo de R. Kelly. Nojo dele continuar fazendo, até hoje (porque, apesar de ele estar preso, ele ainda não foi condenado por tudo o que fez), tudo isso e nunca ser responsabilizado pelo seu comportamento. Nojo das pessoas que o rodeavam, que sabiam que ele agia de uma determinada forma, mas nunca fizeram nada para coibir os atos dele. NOJO!