A Inexorabilidade do Destino.
Para os leitores assíduos do britânico Bernard Cornwel, a série Crônicas Saxônicas é um deleite em potencial narrativo. O escritor é extremamente habilidoso em criar momentos tensos e personagens icônicos, mas quando surge uma série televisiva que faz uso do mesmo universo literário, surge uma ponta de grande expectativa e curiosidade em conferir o material em questão.
O ilustre protagonista, cujo nome mais mais apropriado seria Uhtred de Bebbanburg, é interpretado pelo britânico Alexander Dreymon, algo que parece ter caído como um luva para o ator, já que faz de suas interpretações uma forma de aprendizado ao longo da temporada. Uhtred é filho do senhor de Bebbanburg, que é assassinado em uma batalha contra os brutais dinamarqueses conhecidos como Vikings. Sem lar definido, Uthred é "adotado" por líder dinamarquês Ragnar Ravnsson (Peter Gantzler), o que faz com que o protagonista aprenda diversas habilidades com o manejo da espada e táticas de guerra que fazem dos vikings vencedores. Anos após uma desavença com o soldado Kjartan (Alexandre Willaume), o "vilarejo" onde está o exército dinamarquês é alvejado durante uma celebração, criando neste instante o que motiva grande parte das ações do protagonista: o desejo de vingança.
Ambientada em 872, a série nos faz acompanhar o dia a dia de Uthred no reino de Wessex, uma das muitas pequenas regiões independentes que um dia se juntariam para formar a grandiosa Inglaterra. Buscando auxílio para preparar, cautelosamente, sua vingança, o protagonista, juntamente com sua amante Brida (Emily Cox) conhece Alfredo, o rei respeitado por suas habilidades na arte da comunicação verbal e escrita. Aliando-se a ele e ao exército saxão, Uthred usa das situações que envolvem as defensivas e ataques contra os dinamarqueses como uma alternativa para ir moldando sua imagem dentro do reino e arquitetar, pouco a pouco sua vingança.
Assim como nos livros, um dos grandes méritos da produção reside na forma como trata as batalhas, violentas e cheias de momentos tensos. Como aprendiz, Uthred usa e abusa do que absorveu quando criado pelos Vikings, principalmente nas capacidades defensivas com escudos, algo que é contemplado com imenso cuidado pelos produtores. Sem deixar de citar que, por se passar em um período cujo catolicismo rege toda a sociedade, há diversas menções a atos feitos em prol da igreja, desde mortes desnecessárias até ostentação em nome divino.
Do ponto de vista narrativo, a temporada faz uso dos dois primeiros livros da série literária, sendo eles O ÚLTIMO REINO e O CAVALEIRO DA MORTE, isso acaba deixando de lado alguns detalhes nada triviais que ajudaram a moldar o personagem principal, embora não prejudique o desenrolar da história. Os primeiros episódios são bem corridos, pois o que nos importa mesmo é fase adulta de Uthred e a forma como ele ganha confiança, mesmo que para isso crie conflitos com amigos de infância. Há grandes e fortes personagens no enredo, com destaque evidente para Alfredo, um homem cuja habilidade de convencer é notável, principalmente pela ótima atuação de David Dawson para dar vida ao rei nas telinhas. Claro que na gama de infindáveis nomes e personagens, também temos alguns outros de relevância, como o padre Beocca (Ian Hart), um dos grandes responsáveis pela sobrevida de Uthred; o jovem vilão Odda (Simon Kunz), frio, sacana e inescrupuloso; além dos vilões Vikings Ubba e Skorpa que diferem entre si no comportamento, mas são cruéis como poucos, inclusive rendem lutas apoteóticas contra Uthred e dignas de comemoração .
Para alegria de quem curtiu THE LAST KINGDOM, a segunda temporada, que terá o dobro de episódios, já está em produção. Considerando a qualidade desta primeira, principalmente na retratação precisa dos personagens e suas complexidades; das batalhas épicas e cheias de energia; e do apuro técnico em criar algo grandioso, certamente teremos mais momentos para torcer pela vingança de Uthred e pelos aliados do, quase desagradável, Alfredo.