Após uma segunda temporada frustrante que resultou em um hiato de quatro anos, True Detective está de volta. Com Nic Pizzolatto mais uma vez no comando, tanto no roteiro quanto como showrunner, a nova leva de episódios busca uma volta às origens, não propriamente nos personagens retratados mas na ambientação. Isto, é claro, mantendo o padrão de apresentar como protagonista um policial complexo, enveredado em teias de trabalho que afetam também sua vida pessoal.
Assim como na temporada de estreia, aqui vemos um detetive às voltas com um interrogatório acerca de um caso traumático não resolvido do passado - a diferença é que, ao invés de duas linhas temporais, agora a proposta é ainda mais complexa ao envolver passado, presente e futuro. Em todas estas narrativas o detetive em questão cabe a Mahershala Ali, em uma impressionante performance onde não só demonstra sutilezas decorrentes da maturidade mas, especialmente, o peso inerente à dor do caso que insiste em retornar. Isto em uma ambientação fotografada a partir de cores frias, onde a emoção surge apenas a partir de rompantes de raiva, e uma edição milimétrica de forma a intercalar cada período abordado.
Se você lembrou do icônico Rust Cohle de Matthew McConaughey, com certeza não foi por acaso. Em busca do sucesso perdido, Pizzolatto habilmente retomou elementos de seu momento de maior sucesso de forma a compôr algo novo que, ao mesmo tempo, seja reconhecível pelos fãs - até mesmo o fator satânico está lá! Entretanto, desde já pode-se notar algumas diferenças relevantes: a introdução da sempre complexa questão racial na sociedade americana, especialmente no segundo episódio; a parceria existente com o personagem de Stephen Dorff, por enquanto sem qualquer investigação particular além do mero cumprimento do dever que o torna bem diferente da relação entre McConaughey e Woody Harrelson na temporada de estreia; e ainda o fato de que, aqui, há também uma história de amor (e de dor) a ser contada.
Tal característica traz à terceira temporada uma camada extra, não só por mais uma vez mesclar pessoal e profissional mas, especialmente, por um estar intrinsecamente ligado ao outro. Se o episódio piloto impressiona pela postura elegante e educada de Mahershala nas três narrativas temporais, o seguinte surpreende pelo abandono da retidão moral induzida, não só na investigação do caso em questão mas, também, pelos escancarados - e ainda enigmáticos - problemas de família com a própria filha. Há muito a ser desvendado sobre sua história, o que instiga mais até do que o próprio caso policial.
Inclusive, Pizzolatto aproveita para tirar um sarro de si mesmo, ao apresentar um programa chamado "True Criminal" entrevistando antigos policiais acerca de casos não-resolvidos do passado - nada mais é do que o próprio True Detective, em versão metalinguística.
Em seus dois episódios iniciais, True Detective agrada tanto ao remeter a uma fórmula de sucesso como, também, ao trazer como protagonista um ator em seu auge. Mahershala é o brilho maior deste início de temporada que, pelo apuro demonstrado na fotografia e edição, promete mais uma vez trazer uma apurada investigação sobre a psiquê de um detetive verídico, sem os floreios típicos de Hollywood e sabendo de antemão que sua busca será em vão. Instigante e enigmático, deixa o gostinho de quero mais - e logo! - para saber não propriamente o que acontece, mas como acontece.