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    A Maldição da Residência Hill: Criador da série explica processo criativo, o Quarto Vermelho e linhas temporais

    Nova série de terror da Netflix adapta a obra homônima de Shirley Jackson.

    A Maldição da Residência Hill cheira a clichê a distância: a história de uma casa mal-assombrada e uma família desavisada e inocente que se muda para o local — com cinco crianças — sem pensar nas consequências. Apesar disso, a nova série de terror da Netflix consegue reverter as convenções e apresentar uma trama contagiante e envolvente.

    Em entrevista concedida ao The Hollywood Reporter, o showrunner, diretor e roteirista da adaptação Mike Flanagan explicou qual foi o seu processo criativo para adaptar a obra original de Shirley Jackson, que serve de base para a série — e já ganhou os cinemas anteriormente com Desafio do Além (1963), de Robert Wise, e A Casa da Colina (1999), de William Malone. Para sua versão, Flanagan resolveu fazer uma "remixagem" do romance. Não há a história de quatro adultos investigando atividades paranormais, e os substituindo estão os irmãos de uma família que, depois de décadas, ainda é perseguida pela mansão.

    O desvio da obra original

    Steve Dietl/Netflix

    Quando foi abordado pela Netflix para fazer a adaptação, Flanagan imediatamente voltou ao livro, sabendo que precisaria expandir a obra para preencher uma temporada inteira de televisão.

    "Eu sou naturalmente atraído por dramas familiares, e acho que no terror, particularmente, as pessoas se comportam dentro das famílias de formas diferentes que em nosso mundo," explica. "Elas se despem dos pretextos. Para mim, era questão de identificar os elementos e personagens dos livros que eu amava, e tentar construir algo diferente a partir deles [...] Abordei como uma espécie de remix. Assim que comecei a olhar para ela desta forma, abriu meus olhos para muitas possibilidades muito divertidas, onde eu poderia fazer algo que fosse realmente nosso, mas passando pelos momentos do livro que mais me impactaram."

    As linhas temporais

    Steve Dietl/Netflix

    Um dos destaques da série em abordagem de narrativa é como ela interlaça momentos da vida adulta e da vida infantil dos protagonistas, criando uma relação de causa e consequência que desafia o entendimento do tempo como uma linha reta. Flanagan explica:

    "Acho que a televisão está cheia de exemplos efetivos de como se pode brincar com as linhas temporais de forma a fazer a audiência moderna se interessar. Apareceu primeiro com Lost e Westworld. Isso foi empolgante para mim, poder destrinchar os requerimentos lineares.

    A Maldição da Residência Hill: O fascínio da morte e a origem de todos os medos (Crítica da 1ª temporada)

    Quando se fala sobre uma pessoa sendo assombrada, um fantasma é tedioso a não ser que esteja diretamente ligado a uma experiência ou uma emoção intrínseca ao personagem. Somos todos assombrados enquanto pessoas, e eu achei que isso é o que faria a série interessante. Fantasmas pipocando para dar sustos só são interessantes uma ou duas vezes. Se for para fazer em um longo formato, precisava ser sobre como toda família é uma casa mal-assombrada, e todos lutam com os próprios fantasmas da infância e além."

    Já a respeito da abordagem da história de Nell (Victoria Pedretti) especificamente, que passou a vida sendo assombrada pela própria imagem de seu último momento em vida, o criador conta de onde veio a ideia.

    "Iríamos assumir a posição, principalmente com a Moça do Pescoço Torto, que um fantasma nessa série não é necessariamente o que você acha que ele é. Um fantasma pode ser uma premonição, ou no caso de Shirley, uma manifestação imaginada da culpa. Parecia que iríamos machucar muito este tema se passássemos tempo demais explicando os fantasmas. No final, colocamos mais fantasmas do que a história da casa suportaria. Queria que parecesse que a coleção era muito maior do que o tempo de existência da casa. Ela colecionava fraturas do psicológico das pessoas que estavam dentro dela."

    O Quarto Vermelho

    Steve Dietl/Netflix

    A respeito da concepção do quarto, Flanagan atribui a ideia original a uma das roteiristas;

    "Foi Rebecca Klingel que sugeriu primeiro. Eu queria algo que fosse muito especial para o Quarto Vermelho. Nós sabíamos que manteríamos a porta fechada por muito tempo. E eu dizia algo do tipo que 'Nós vamos querer tanto ver o que já naquele quarto no fim da temporada que precisa ser algo muito bom.' E ela sugeriu: 'Bom, e se nós já tivermos visto, mas sem saber?' Há algo muito insidioso sobre ser aplacado e ao mesmo tempo devorado por esta casa.

    Então usamos o mesmo set; nós apenas redecoramos e pintamos para cada uso. Ele fica muito específico para quem está lá e a respeito de como se vestir lá dentro. Isso foi muito divertido, a ideia de que poderíamos usar o design de produção para aquele espaço para refletir os aspectos dos personagens. Isso foi uma das minhas reviravoltas favoritas que veio da sala dos roteiristas. Nos deu gás para boa parte da primeira metade da temporada."

    A resolução da temporada

    Steve Dietl/Netflix

    "É difícil terminar histórias de terror," confessa. "É difícil terminar histórias desse jeito. Havíamos passado por tanta coisa no processo de escrita, cada um de nós cavou tão fundo na história das próprias famílias que todos necessitávamos de um momento de paz no fim."

    Mas ele confessa que havia a possibilidade de plantar uma sementinha perturbadora naquele fim pacífico. "Brincamos com a ideia de, durante o monólogo [de Steven, Michiel Huisman], acima da imagem da família colocarmos a janela do Quarto Vermelho ao fundo. Por um tempo, este era o plano. Talvez eles nunca tenha saído do quarto. Na noite antes do dia dessa filmagem, eu me sentei à cama e me senti culpado em relação a isso. Parecia cruel demais. E isso me surpreendeu. Eu passei a amar esses personagens tanto que queria que fossem felizes. Cheguei no trabalho e disse: 'Não quero colocar a janela. Acho que é cruel e injusto.' E assim que esse detalhe entrou no lugar, queria me distanciar o máximo possível nessa direção. Estávamos há dez horas nesta jornada; alguns minutos de esperança era importante para mim."

    Mas Flanagan pondera: "Steven herda as responsabilidades de Hugh [Timothy Hutton], e a casa ainda está de pé. Ainda é assombrada, todos ainda estão presos. Mas eles estão juntos. É meio agridoce. Quando pensamos em famílias, é isso que nos resta. Estamos presos a elas não imporata o que aconteça, mesmo que não esteja tudo bem, mesmo que nunca conheçamos o que perdemos. Pelo menos podemos encontrar uma forma de viver com isso. Essa pontinha de conforto significou muito para mim. Nós poderíamos ter sido bem cínicos, e quase fomos. Mas estou feliz de não termos sido."

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