Exibida entre 1975 e 1984, One Day At A Time foi uma clássica série de comédia que retratava o dia a dia de uma família americana formada por uma mãe divorciada e suas duas filhas. Agora, mais de trinta anos após o fim da produção, a Netflix resolve reimaginar a trama com o foco em uma família de origem cubana que vive nos Estados Unidos. A nova One Day At a Time estreou sem fazer muito barulho no início de 2017, mas aos poucos foi conquistando o coração das pessoas, ao ponto de ser renovada para uma segunda temporada. No elenco, o nome mais famoso é o de Rita Moreno, vencedora do Oscar por Amor, Sublime Amor.
O AdoroCinema foi até Miami, nos Estados Unidos, e conversou com duas das protagonistas da série: Justina Machado e Isabella Gomez, que vivem mãe e filha.
Vocês possuem origens latinas, mas não propriamente cubanas. Como foi desenvolver e retratar esta origem cubana?
Justina Machado: A nossa showrunner, Gloria Calderon Kellett, que comanda a série ao lado de Mike Royce, é cubana. Não sei se vocês viram o episódio da Operação Pedro Pan, mas os pais de Gloria vieram de Cuba naquela operação. Então, o fato de interpretarmos cubanas é porque nossa showrunner é cubana. Essa é a história deles. Eu sou porto riquenha, caribenha, e não acho que seja um problema interpretar uma cubana porque não vejo tantas diferenças assim. Essa é uma história latina. E é uma história universal. Sermos cubano-americanas é só um detalhe.
Essa é uma história sobre amor, família, empoderamento feminino, especialmente de uma mulher solteira... Por que é importante ter esta história na tv atualmente?
JM: Porque é importante representar uma família latina que não é composta por estereótipos. Essa é a parte mais importante para todos nós que fazemos parte da série; que nós sejamos representados da forma como somos, como seres humanos. Essa é uma história universal sobre família, amor e compreender uns aos outros e opiniões divergentes. É sobre a vida de uma família de classe média. Faz tempo que não vemos uma família de classe média na televisão. Na maioria das vezes, são pessoas descoladas que vivem em apartamentos incríveis, mas que trabalham como bartenders. Nossa série é real.
Isabella Gomez: Pessoalmente, nunca pensei na questão da representação até ver o quão importante isso é para as pessoas. Agora que a série está no ar, várias pessoas falam comigo para dizer que Elena, minha personagem, é como elas são. Nunca pensei que me veria na televisão e que meu trabalho faria com que as pessoas se sentissem validadas, representadas. É maravilhoso ver isso acontecendo. A série e a minha personagem, particularmente, que é muito jovem, é uma feminista, da comunidade LGBTQ faz com que as pessoas se sintam menos sozinhas. É incrível porque jovens falam comigo pelo Instagram para dizerem que são feministas, que se sentem representadas por Elena. É incrível.
É ótimo ver o movimento do empoderamento que vem ocorrendo na televisão hoje em dia. Como vocês veem essas mudanças na indústria hoje em dia?
JM: É um processo lento que está indo no caminho certo, mas que poderia caminhar muito mais rápido. Precisamos de mais diretoras, mais escritoras e mais histórias sendo contadas pela perspectiva feminina. Isso vem acontecendo, mas seria melhor se acontecesse mais rápido.
IG: Também acho que agora mais mulheres estão falando sobre isso. Gina Rodriguez debate muito sobre o empoderamento e sobre as mulheres não-brancas. Acho que se mais de nós fizermos isso, o processo será acelerado. Mas é claro que essa é uma luta de séculos e mais séculos, então precisamos ver o que vai acontecer.
Por que a avó da família aceita melhor a diferença da orientação sexual do que os pais?
JM: Acho que é mais uma questão de narrativa. Não poderíamos ter dois personagens com reações iguais. Precisávamos mostrar perspectivas diferentes, como fazemos com todas as questões na série. Como nossos episódios têm 35 minutos, não podemos nos demorar muito em um tema, mas o monólogo da avó sobre ser católica e não saber se pode aceitar ou não a situação até lembrar que o Papa Francisco disse que não tinha problema poderia se estender por três episódios. É importante ter, em uma série, pontos de vista diferentes para que exista o debate e para que nós possamos aprender a tolerância, a compreensão e tudo o mais.
IG: Acho que isso também é uma questão geracional. As pessoas mais velhas foram criadas de uma maneira muito religiosa, distante da comunidade de LGBTQ e por isso que acho importante mostrar que a avó, sim, era contra, mas que tinha a mente aberta à mudança, que podia aprender e mudar.
JM: Exato. Além disso, ela é uma “abuela”. Minha avó morreu em 2006, mas, para ela, a culpa era sempre de outra pessoa, nunca minha. Podia fazer algo de errado na frente dela que a culpa não seria minha. Então, acho que o amor das “abuelas” também está envolvido. Isso está em seu monólogo.
Como foi a experiência de trabalhar com Rita Moreno?
JM: Incrível! Se não fosse por ela, não estaríamos aqui agora, é uma pioneira. É interessante ver como as mulheres estão em um ciclo de continuidade e descontinuidade. Até mesmo ela, uma ganhadora do EGOT [Emmy, Grammy, Oscar e Tony], que quebrou diversas barreiras, precisa trabalhar para conseguir as coisas. Nessa série não, eles deram o papel para ela. É incrível ver o quão longa é a carreira dela. Ela merece esse sucesso. Tenho certeza que ela não conseguia os papéis nos anos 50 e 60, mas agora ela consegue. Precisamos de mais oportunidades. Se tivermos mais oportunidades, vocês nos verão mais vezes. É ótimo ver a longevidade da carreira dela. Além disso, é incrível contracenar com ela, ela é uma mulher fantástica.
IG: Ela é uma mulher incrível. Você aprende muito com ela, especialmente se você for uma novata. Ela fez tudo. Ganhou tudo. Para mim, ela sabe de tudo. Mas, mesmo assim, ela continua questionando, continua querendo aprender. Ela é muito humilde, muito doce. Eu a chamo de avó e mando mensagens para ela, mas ela é horrível com tecnologias.
JM: Ela é hilária com celulares. Ela se perde com os contatos, não sabe quem é quem.
IG: É difícil manter contato com ela porque acho que ela não sabe como usar o celular.
JM: Ela adora emojis.
IG: É a única forma de comunicação. Mas ela é muito engraçada, tem muita energia em 100% do tempo. É incrível.
A série é muito engraçada... Mas, às vezes, tem momentos muito sombrios. Lida com temas como depressão, alcoolismo, estresse pós-traumático... Como foi trabalhar com esses elementos?
JM: Para mim, foi ótimo. Não consigo fazer nada que não seja honesto. Não consigo fazer sitcoms, onde tudo é apenas uma preparação para uma piada. Nunca serei escalada para uma série como essa. A beleza de One Day at a Time é o realismo, é assim que a vida é. Você vai de 0 a 100 em dois segundos e essas são coisas com as quais as pessoas lidam. Foi bom encontrar um material como esse e também foi desafiador. Não de uma maneira difícil, mas desafiador de forma a me instigar a trabalhar. Adoro a série e todos os momentos que passamos.
IG: Também gosto muito disso. Sempre me vi mais como uma atriz dramática, então foi interessante quando fui escalada para uma sitcom. Eu? Bem, ok. Mas a série é mais que isso. Acho que o drama melhora o humor da série. One Day at a Time não é só um alívio cômico. Além disso, ajudou a criar uma relação especial com o público. É bom saber que o público ri do que fazemos, mas saber que eles estão prestando atenção nos momentos sérios é muito intrigante. Ver as reações deles, saber que um se irritou, o outro se emocionou.
A série acabou de ser renovada. O que podemos esperar da segunda temporada?
JM: O mesmo tipo de coisa que fizemos na primeira temporada: abordar tópicos complicados com humor e amor, tornando-os identificáveis para o público. Para ser honesta, não sei o que acontecerá. Como filmamos muito antes da série ser lançada, ainda não sabemos o que acontecerá.
O AdoroCinema viajou a convite da Netflix.