"Uma ficção baseada em fatos reais."
Pode parecer algo paradoxal, mas é assim que o diretor Felipe Caño Ibanéz resume a série Hugo Chávez: O Comandante, atração que causou polêmica pela América Latina e chega ao Brasil este mês, através do canal TNT.
Misturar "Hugo Chávez" e "polêmica" na mesma sentença já não é algo surpreendente - afinal, o saudoso presidente venezuelano foi tão popular quanto controverso. Porém, o burburinho causado pelo audacioso projeto do colunista Moisés Naim atravessou fronteiras e instaurou debates.
Apesar de assumir o uso de drama, romance e suspense para contar a história privada de Hugo Chávez, El Comandante (título original) teve sua exibição proibida na Venezuela, pelo governo local. Tanto que o presidente Nicolás Maduro anunciou uma resposta extrema: o país fará sua própria série sobre a vida e obra do político, intitulada Chavez de Verdad.
Em entrevista para a imprensa brasileira, Felipe Caño parece observar tal situação com tranquilidade: "Não vejo problema. Acho ótimo que exista outra série. Sou um amante do audiovisual e quanto mais séries surgirem sobre o tema será bom porque poderemos compara-las à nossa. É compreensível que tenham se sentido incomodado pelas escolhas que fizemos, mas gostaria que vissem a série para critica-la de maneira própria."
O cineasta também aproveitou a oportunidade para defender sua produção - que muitos acusam de tentar "manchar" a imagem do ex-presidente. "Esta é a história por trás do Chávez midiático. Queríamos entender a fixação com sua vida. Para nós, era a história de um jovem que ingressou na carreira militar muito cedo e que, lá, descobriu que tinha a inteligência e o poder para mudar um país inteiro. Nosso personagem não é um estereótipo porque construímos e desenvolvemos suas ações cotidianas com naturalidade. A série não tem aspirações políticas e nem pretende mudar o ponto de vista de ninguém."
Outra grande crítica sofrida pela produção foi a escolha do protagonista. Andrés Parra assume a difícil tarefa de interpretar Hugo Chávez, mas o "problema" (se é que existe um) é que o ator ficou conhecido por interpretar o traficante colombiano Pablo Escobar na série O Senhor do Tráfico.
"Andrés é um ator muito comprometido. Ele não copia Hugo Chávez; dá uma vida interna ao personagem, dá vida às suas emoções e sensações. Poder trabalhar com ele é muito bom. É melhor fazer uma produção como esta, tão difícil e cheia de sacrifícios, ao lado de um amigo", declara Caño, que trabalhou com o ator em seu primeiro filme, La Semilla del Silencio.
Hugo Chávez, o Comandante acompanha cerca de 30 fatos da vida do protagonista, saindo de uma infância difícil sem os pais, passando pela carreira militar até sua chegada à presidência. Porém, não usa os recursos de uma biografia comum: os únicos personagens reais da trama são os políticos que fizeram parte da história política latino-americana. Enquanto os coadjuvantes são obras de ficção, o cenário ao fundo não é imaginário assim. Alguns fatos são retratados da realidade da Venezuela e reconstruir tais momentos foi a parte mais díficil dessa produção, segundo o cineasta.
"As coisas mudaram muito entre os anos da infância de Chávez e seus últimos dias. Portanto, construímos nossa Caracas no nosso set, na Colômbia. Aí, tivemos que enfrentar os problemas com a direção de arte, com o visual, com os figurinos, com a maquiagem, com os figurantes. Tudo isso foi muito complexo, principalmente ao mostrar desastres naturais como a Tragédia de Vargas (1999) e atingir a sensibilidade certa. Mas alguns venezuelanos da equipe ficaram muito impressionados com as semelhanças entre o set que construímos e os locais reais."
Por fim, ficou claro que Hugo Chávez, o Comandante abraça bem o caráter de paradoxal de sua inspiração. Felipe Caño Ibánez e Andrès Parra são colombianos que estudaram a vida do político venezuelano. Eles construiram uma obra de ficção, mas inspirada na realidade. O formato é de série, as imagens ambicionam o caráter cinematográfico, porém é exibido diariamente, como uma novela. Ou seja, surgiu algo cheio de misturas e controversias... assim como Chávez.
Hugo Chávez, o Comandante estreia segunda-feira, dia 6 de março, à 0h.