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    Mostra de São Paulo 2015: José Mojica Marins queria que Mel Gibson interpretasse Zé do Caixão

    Quem revelou foi o roteirista André Barcinski, biógrafo do diretor, durante coletiva da série baseada em sua vida.

    José Mojica Marins e Zé do Caixão, criador e criatura que, ao longo das décadas, se misturaram no imaginário popular. A vida desta personalidade tão peculiar do cinema brasileiro, capaz de "inventar um gênero" com À Meia-noite Levarei Sua Alma e também de rodar filmes de sexo explícito com animais, é tema da série Zé do Caixão, estrelada por Matheus Nachtergaele, que será exibida no canal de TV por assinatura Space a partir de 13 de novembro - sexta-feira 13! -, às 22h30.

    Durante a programação da Mostra de São Paulo, foram exibidos aos jornalistas os dois primeiros episódios da série, seguidos por uma coletiva com o diretor Vítor Mafra, o roteirista André Barcinski - autor do livro "Maldito! A Vida e o Cinema de José Mojica Marins" - e parte do elenco, encabeçado por Matheus Nachtergaele. O AdoroCinema esteve lá, aprovou o que viu (crítica em breve!) e traz a você os principais destaques da entrevista.

    DIFERENÇAS ENTRE LIVRO E SÉRIE

    "Fiz o livro há quase 20 anos e há muito tempo estamos tentando levá-lo para o cinema ou a TV", disse André Barcinski. "Eu, como biógrafo do Mojica, tinha a preocupação de que a série fosse fidedigna à vida dele, mas não é um livro de 600 páginas e sim uma série. A gente não pode também se ater a pequenos detalhes biográficos quando a dramaturgia é mais importante." Diante desta preocupação, Barcinski revelou que algumas pessoas foram unificadas na série. Um exemplo é o personagem Chico, que sintetiza a importância que os diretores Carlos ReichenbachLuiz Sérgio Person tiveram na vida de Mojica.

    PRIMEIRA ESCOLHA

    Durante a coletiva, André Barcinski surpreendeu ao revelar que Matheus Nachtergaele não era o ator preferido de José Mojica Marins para interpretá-lo. "Queria revelar para o Matheus que ele não foi a primeira escolha do Mojica. Ele queria o Mel Gibson para o papel", revelou, provocando gargalhadas na plateia de jornalistas. "Foi na primeira vez em que a gente conversou sobre um possível filme, isso lá em 1998 ou 2000. O Mel Gibson parece muito com o Mojica, vocês sabem...", brincou. "Mas é engraçado, pois muito antes da série começar a ser feita e do Vítor [Mafra] entrar no projeto a gente já falava no Matheus", complementou.

    ADMIRAÇÃO

    "Um lado meu sempre admirou profundamente algumas obras do Mojica, principalmente os dois primeiros filmes de terror [À Meia-noite Levarei Sua Alma e Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver] e O Despertar da Besta", disse Matheus Nachtergaele. "Admiro estes filmes como quem admira a obra de um grande artista. Mas existe toda uma faceta dele que não me atrai, mas admiro também. O que me surpreende de verdade é que era um cara que esteve para a vida para o bem e para o mal. Isto é de uma coragem tão bonita, uma ampliação de limites morais tão grande para ser o artista que ele é, que me deu uma sova de ensinamento. Um cara que conviveu com altos intelectuais e ao mesmo tempo um cara do boteco, ali da esquina. Era vivo."

    O SOTAQUE DE MOJICA

    Um dos grandes destaques da série é a caracterização de Matheus Nachtergaele, com o inevitável sotaque típico de Mojica. "Era muito saboroso para não fazê-lo", disse o ator, se referindo ao sotaque típico de Mojica. "Durante um período da minha vida, achei que os erros de português fossem propositais. Mas não era. Nos primeiros dois filmes o Zé do Caixão é dublado por outro ator, que fala português bem corretamente. Mas o Mojica mesmo fala daquele jeito!"

    Matheus falou também sobre o medo de tornar sua caracterização uma sátira ao verdadeiro Mojica. "Tive medo no início em satirizar alguém que admiro, mas acho que o Mojica provou pela vida dele que é um livro aberto e que está com a cara a tapa, sempre. Quando você faz um personagem que existe ou existiu creio que o diferencial seja a questão ética, de como vai abordá-lo. No caso do Mojica, a gente ficou muito liberado. Nós vimos os momentos gloriosos e os momentos terríveis da vida dele, o auge artístico e também o auge da vendição pop na nossa frente, o tempo inteiro, sobrevivendo às variações de mercado e às economias do país. Fazendo o seu trabalho o tempo todo como foi possível."

    "O problema era fazer o sotaque e manter a dramaticidade das cenas. Porque isso é muito bom nas cenas de terror e de quiproquó, mas nas cenas de amor e nas tristes isto tem que entrar muito organicamente em você para que possa permanecer nos momentos difíceis do personagem."

    A CRIAÇÃO DO ZÉ DO CAIXÃO

    Na série, Zé do Caixão apenas surge em cena no segundo episódio, quando os bastidores de À Meia-noite Levarei Sua Alma são mostrados. Matheus Nachtergaele falou sobre a criação do personagem. "A concepção é muito perfeita no início. Um coveiro brasileiro, niilista, ateu e que acredita que a única coisa que faz sentido na vida é a perpetuação do seu sangue. E por isso ele faz qualquer coisa. É algo assustador e tem suas razões, como qualquer grande personagem."

    O ator ainda falou sobre como foi interpretar José Mojica Marins. "Foi muito saboroso interpretá-lo e eu tinha muita fonte. Tinha o livro, os filmes todos, a memória muito viva de quem era o Zé do Caixão, mais até do que o Mojica, algo que fui saber mais durante o processo de trabalho."

    O INCRÍVEL EXÉRCITO DE BRANCALEONE

    "O que fiquei muito contente ao ver a série é que foi mantida a sensação de que a trupe do Mojica é uma espécie de exército de Brancaleone, que o segue independentemente das loucuras que ele fizer", disse Barcinski. "E é verdade, sempre foi assim. Mojica é o cara que tem as ideias mais malucas e consegue convencer 200 outros caras de que aquela é a melhor ideia do mundo e que vai dar certo. A série tem um pouco esta loucura coletiva que o Mojica impinge em tudo o que faz. Fiquei muito comovido com a entrega do elenco."

    CINEBIOGRAFIAS

    Pouco antes de rodar a série Zé do Caixão, Matheus deu vida ao carnavalesco Joãozinho Trinta em outra cinebiografia, Trinta. O ator falou sobre as semelhanças e diferenças entre os dois trabalhos. "Fica a alegria de ter sido escolhido para interpretar dois grandes artistas, aparentemente opostos em temperamento mas muito parecidos no ponto de vista da formação e da tenacidade. Autodidatas, trabalharam sem parar até onde foi possível. Um se envolveu com a alta cultura, da ópera e do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, e levou isto para o Carnaval num evento midiático mundial, e outro sendo uma das cabeças mais interessantes do cinema brasileiro. [...] Fiz em Trinta uma homenagem muito doce, onde havia uma preocupação grande em nunca satirizar o Joãozinho. Mas aqui tinha a liberdade que o Mojica nos dá por ser como ele é."

    VISITA DE MOJICA

    Devido a problemas de saúde, José Mojica Marins esteve internado por mais de cinco meses e pouco pôde acompanhar as gravações da série. Mesmo com a saúde debilitada, ele visitou o set. "O Mojica passou por um momento delicado de saúde e esteve no nosso set apenas uma vez, ao lado da família e da enfermeira. Não pôde falar, mas se emocionou", disse Matheus. "A gente fez para ele um pequeno desfile das roupas do Zé do Caixão ao longo das décadas. Achei bonitinho porque, mesmo fraco e sem poder falar, ele tocava em cada capa e fazia tipo ok, e depois chorou. Foi um dia que a gente ficou bem emocionado."

    "Você imagina, o cara quase foi fadado ao fracasso e ao esquecimento absoluto, punido por si próprio, e agora tem uma série em homenagem a ele. O que vai fazer com que as pessoas conheçam mais sobre a trajetória do cara. Ele é muito especial. Um doido, um louco!"

    THE END

    Matheus revelou ter ficado bastante emocionado ao término das gravações da série. "Quando acabou deu uma saudade... Não tive aquele sentimento de "graças a deus, acabou", mas de "que pena que acabou". Muito parecido com o que tive em O Auto da Compadecida. Estava muito cansado, mas quando tirei a roupa do João Grilo eu chorei. No último dia que fui tirar as unhas, a barba e as coisas do Mojica, pensei "nossa, nunca mais vou fazer isso". Obrigado por terem me deixado brincar disto."

    O AdoroCinema viajou a convite da organização do festival.

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