Que True Detective foi uma das séries mais badaladas de 2014, isto é inegável. Com Matthew McConaughey na melhor atuação da carreira – superior até mesmo à que teve em Clube de Compras Dallas, que lhe rendeu o Oscar – e participações marcantes de Woody Harrelson e Michelle Monaghan, a série trouxe um clima soturno e angustiante em torno da investigação de uma morte bizarra, esmiuçada em períodos de tempo distintos. Entretanto, por mais que boa parte da trama seja em torno da busca ao responsável pelo crime, a primeira temporada se destacou por apresentar o lado pessoal de seus personagens principais. Mais do que caçadores de criminosos, os detetives são também seres humanos, com suas dores, alegrias, anseios e necessidades.
Sem qualquer personagem visto na primeira temporada, o roteirista e produtor executivo Nic Pizzolatto teve como desafio criar uma história completamete nova sem descaracterizar o formato. O frisson em torno da abertura fez com que os fãs ficassem de olhos bem atentos a cada novo anúncio feito e, talvez, este alto grau de expectativa tenha prejudicado a temporada recém-encerrada. Que ela é inferior à primeira, isto é inquestionável. A história não é tão envolvente, as atuações não são tão marcantes e o truque do quarto episódio, que mais uma vez traz uma sequência impactante, não funciona tão bem. Mas, ainda assim, tem alguns pontos interessantes.
O principal deles é em relação ao elenco, ou melhor, a parte do elenco. Se não há o brilho intenso de McConaughey, Rachel McAdams se sai bem na pele de uma policial durona e infeliz com seu passado, absolutamente solitária. Tal personagem, bem diferente dos papéis adocicados que costuma encarar nas telonas, foi um belo desafio para a atriz e pode até resultar em uma virada na carreira, em busca de papéis mais sérios. Colin Farrell, por sua vez, se saiu bem na pele do ambíguo Ray Velcoro, mas sem brilhar. O ponto fraco do trio protagonista foi o sempre inexpressivo Taylor Kitsch.
Assim como aconteceu na primeira temporada, a vida pessoal dos personagens principais surge com força. Por mais que o assassinato de Ben Caspere seja o motivo que reúne o trio, os problemas enfrentados por cada um deles ganham uma importância ainda maior que a própria investigação. Este, por sinal, foi um dos problemas da temporada. Sem um foco definido, a narrativa cada vez mais apontava para coadjuvantes que, mal desenvolvidos, não atraíam o menor interesse nem insinuavam grande relevância. Mais ainda: a quantidade de personagens e subtramas era tão grande que o próprio espectador, em certos momentos, se questionava sobre o que realmente estava acontecendo, devido à ausência de dinâmica envolvendo os mesmos. Por mais que seja a mesma tática adotada na primeira temporada, que se dedicou a esmiuçar a vida de Rust e Mart para depois reuni-los em busca de resolver o caso de uma vez por todas, desta vez a fórmula não funciona a contento pela fragilidade das conexões existentes e pelo aumento no número de protagonistas (há ainda o gângster interpretado por Vince Vaughn, tão importante quanto os detetives).
Outro elemento típico da fórmula seguida por Pizzolatto acontece no quarto episódio, onde mais uma vez há uma impactante cena de ação (desta vez sem plano-sequência). Por mais que seja mal justificado, o confronto entre policiais e traficantes em campo aberto, com direito a perseguição de carros e um intenso tiroteio, foi não apenas uma das melhores cenas da temporada como ainda serviu de ponto de virada. É no quinto episódio, logo após o evento, que ocorre um salto no tempo onde praticamente a série é reiniciada. É a partir deste momento que os personagens principais se aproximam e passam a se interessar uns pelos outros, trazendo algum foco à história como um todo. Nâo à toa, é na metade final que está o melhor da segunda temporada, especialmente os elos afetivos que surgem.
Diante disto, a pergunta que fica é: por que a nova temporada tem um preâmbulo tão longo e desinteressante? É obvio que os personagens principais necessitam de um certo tempo para que suas histórias sejam situadas, mas a insistência em mantê-los como “gladiadores solitários”, lutando contra seus fantasmas, foi um tremendo tiro no pé. Quando a temporada enfim apresenta um rumo há uma melhora significativa, pontuada pelo desfecho que, se não é apoteótico, ao menos é realista e apresenta um interessante viés feminista. Este inclusive é um ponto positivo em relação à primeira temporada, onde Pizzolatto demonstrou uma enorme condescendência com seus personagens principais.
Bastante irregular, a segunda temporada de True Detective não fez jus à expectativa existente. Não apenas em relação à primeira temporada, muito boa apesar do desfecho decepcionante, mas como uma história a ser contada mesmo. Com problemas sérios no ritmo da narrativa e na apresentação dos personagens, a temporada cria um grande mistério em torno do assassinato de Caspere para, repentinamente, resolvê-lo de forma banal e pouco convincente, como se tirasse um coelho da cartola. No fim das contas, a impressão que fica é que, na tentativa de repetir a fórmula de sucesso da temporada inicial, Pizzolatto criou uma trama confusa que dependia demais da qualidade de seus atores principais, nem todos bem escalados. Não deu certo.