O ano era 1967, e a TV Globo enfrentava dificuldades para fazer o público entender a trama de Anastácia, a Mulher Sem Destino, novela baseada no folhetim francês A Toutinegra do Moinho (1956). A adaptação foi escrita pelo saudoso ator Emiliano Queiroz, recordista de novelas, em sua primeira e única experiência como autor na emissora carioca.
O grande problema da obra foi justamente a falta de experiência e técnica de Queiroz no roteiro. Na tentativa de salvar a audiência, ele foi enchendo a história com novos personagens, mas, em vez de ajudar, só tornou o enredo ainda mais confuso – e afundou o barco de vez.
"Chegou um momento em que nem eu nem Glória [Magadan, supervisora do texto] conseguimos tocar aquele calhamaço pra frente. Caí numa arapuca", admitiu Emiliano em sua biografia Emiliano Queiroz – Na Sobremesa da Vida.
Com a novela tão sem destino quanto a protagonista do título, a equipe precisou agir rápido para garantir um desfecho digno à produção. Foi o próprio Emiliano Queiroz quem sugeriu a Boni a entrada de uma nova autora para assumir a história: Janete Clair, com quem ele já havia trabalhado antes. E o que ela fez? Simples: matou quase todos os personagens!
O terremoto que mudou a história da novela
Na época, Janete Clair já era uma autora renomada, mas ainda não havia escrito nenhuma novela para a Globo. Diante da missão quase impossível de salvar a superprodução e reverter a queda na audiência, ela não pensou duas vezes: criou um terremoto para reduzir drasticamente a quantidade de personagens – estima-se que eram mais de cem!

Por volta do capítulo 40, o desastre natural devastou a ilha onde a protagonista se refugiava, eliminando praticamente todo o elenco e deixando apenas quatro sobreviventes: Anastácia (Leila Diniz), Henri (Henrique Martins), Pierre (Ênio Santos) e Gaby (Mírian Pires). Janete ainda promoveu um salto de 20 anos na trama para dar um novo rumo à história.
A partir desse ponto, Leila Diniz assumiu dois papéis: além de continuar vivendo a protagonista Anastácia, também passou a interpretar sua filha, Henriette. Enquanto isso, os outros três sobreviventes envelheceram duas décadas, e novos atores entraram na nova fase da novela.
Apesar dos esforços de Janete Clair, Anastácia, A Mulher Sem Destino não conseguiu recuperar totalmente a audiência. No entanto, a Globo ficou satisfeita com o trabalho da autora, que permaneceu na emissora e se consagrou na teledramaturgia brasileira com inúmeros clássicos, como Irmãos Coragem (1970), Selva de Pedra (1972) e Pai Herói (1979).
Qual a história de Anastácia, a Mulher Sem Destino?
Casado com Anastácia (Leila Diniz), Henri Monfort (Henrique Martins) lutava contra o domínio da monarquia e planejava fugir com a família para o Castelo de Monfort, propriedade que havia herdado. No entanto, durante a fuga, ele é capturado, enquanto Anastácia e sua filha recém-nascida, Henriette, caem em uma emboscada e acabam separadas.
A protagonista, então, torna-se prisioneira em um navio corsário e, sem notícias da filha, começa a enlouquecer aos poucos. Enquanto isso, a pequena Henriette é encontrada na floresta pelos camponeses Pierre (Ênio Santos) e Gaby (Mírian Pires), que decidem criá-la, mesmo sem saber sua verdadeira origem.

Paralelamente, há a trama de Blanche (Aracy Cardoso). Após perder seu grande amor, ela acaba se casando com o comandante Fábio Orsini (Edson França), a pedido do pai, sem saber que está grávida. Posteriormente, fazem-na acreditar que seu filho nasceu morto, mas na verdade ele foi raptado e entregue aos mesmos camponeses que cuidam de Henriette.
Na segunda fase, após o terremoto criado por Janete Clair, a filha perdida de Anastácia ganha o protagonismo ao lado de Roger (José Augusto Branco), o filho de Blanche.