por Francisco Russo
Um dos destaques da mostra competitiva do 41º Festival de Brasília, que ocorrerá entre 18 e 25 de novembro, o curta-metragem V.I.D.A., dos diretores Geison Ferreira e Vinícius Zinn, tem causado comoção a quem o assiste. O Adoro Cinema entrevistou o diretor Geison Ferreira, que falou um pouco sobre a proposta do filme e as dificuldades em fazer cinema no Brasil.
Adoro Cinema: Como surgiu a idéia de fazer um curta-metragem sobre um tema tão complicado quanto a depressão?
Geison Ferreira: Certo dia eu estava numa grande avenida em São Paulo, no banco de passageiros, enquanto uma amiga minha dirigia. Ela teve uma crise. Chorava enquanto dizia estar passando muito mal. Pedi que ela encostasse o carro. Ela só dizia que não agüentava mais tamanho sofrimento. Há vários anos fazendo tratamentos e tomando corretamente suas medicações. Conseguimos chegar até sua casa. Fiquei abraçado com ela. Era tudo o que eu poderia fazer. Na verdade, era tudo o que deveria ser feito naquele momento. Ela dormiu. Pensei muito naquela noite. No dia seguinte fiquei muito feliz por, simplesmente, vê-la. Foi a partir da troca de experiências como esta que enxergamos a importância de falar sobre este tema. Hoje em dia é muito difícil não conhecer alguém com algum histórico de depressão.
Adoro Cinema: No é dito um pouco sobre como foi a pesquisa do tema e o ensaio com os atores. Gostaria que você falasse um pouco sobre este processo.
Geison Ferreira: Li muito sobre a depressão, para entender melhor o que estávamos falando. Existe muita informação sobre a questão patológica da doença. Mas foi a partir de depoimentos, dos relatos e detalhes do cotidiano de pessoas depressivas que realmente fui me sensibilizando. Durante um tempo participei de grupos online de depressivos e comunidades pela internet. É lindo o trabalho de algumas pessoas que se disponibilizam a simplesmente dizer: "Olha eu também sofro com isto, você não está sozinho!". Participar desses grupos foi importante para entender que cada ser humano lida com a depressão da sua melhor forma possível. E isto trouxe liberdade para a direção e para os atores. Fizemos uma semana de ensaios simulando a reunião que acontece no filme. Juntos, líamos depoimentos, os atores comentavam sobre experiências, e aos poucos, o Vinicius (Zinn, co-diretor do filme) e eu, fomos trazendo os atores para as situações que o roteiro sugeria.
Adoro Cinema: Algo que chama a atenção no curta é que ele mostra vários estágios da depressão, tanto pessoais quanto no relacionamento com outras pessoas. Como foi a decisão do que deveria ser tratado sobre este tema, bem como a forma de sua abordagem?
Geison Ferreira: Ana Maria Saad, Vinicius Zinn e eu somos idealizadores de um projeto chamado "PENSAMENTOS FILMADOS", que consiste na realização de filmes de curta-metragem que abordem o ser humano, suas sensações e sentimentos. Como relacionam o seu interno com o externo. Por isto, o V.I.D.A. é um relato sobre como cada ser humano lida com suas questões. Mais que a depressão, o filme fala sobre relações: mãe e filha, irmãs, amigos e até desconhecidos que, a partir do amor e da vontade de ajudar, se encontram.
Adoro Cinema: "V.I.D.A." está inscrito no Festival de Brasília. Quais são as expectativas para este festival e para os demais que o curta pretende disputar?
Geison Ferreira: Nossa, foi uma alegria imensa a seleção do V.I.D.A. para o Festival de Brasília. Pois é o primeiro festival que o filme foi inscrito, e Brasília tem a fama de ser um festival bem visceral, onde as pessoas vão assistir e se manifestam calorosamente sobre os filmes. Nosso principal interesse é que o V.I.D.A., através dos festivais, possa trazer visibilidade para o nosso projeto, pois acreditamos muito no cinema como forma de expressão, e temos muito a falar. Neste momento estamos iniciando a pré-produção do nosso segundo filme, chama-se SOLO e fala sobre a solidão.
Adoro Cinema: "V.I.D.A" foi produzido de forma independente. Por que esta decisão e de que forma ela afetou a realização do próprio curta?
Geison Ferreira: O cinema brasileiro está caminhando de forma linda. Crescente. E as leis de incentivo são essenciais para isto. Mas existe uma burocracia para se chegar até elas, que torna tudo muito mais difícil para quem está começando. Tem muita gente com vontade de realizar, de dar seu depoimento em forma de cinema. Não ter dinheiro, talvez, tenha nos aproximado ainda mais de pessoas assim, cheias de coragem. E uma das propostas do nosso projeto era justamente aproximar pessoas que estavam iniciando com profissionais experientes do mercado, e o V.I.D.A. proporcionou isto. Temos, por exemplo, o trabalho lindo de atores experientes como a Gabrielle Lopez, Vinicius Zinn e atores estreantes, como Naninha Borges, Ulysses de Santi. Alias, todo o elenco é sempre muito parabenizado por quem assiste ao filme.
Adoro Cinema: Depois que um filme fica pronto cabe ao público a decisão de acolhê-lo ou não. Como tem sido esta reação, junto às pessoas que já tiveram oportunidade de assistir ao "V.I.D.A."? De que forma os interessados no curta podem assisti-lo?
Geison Ferreira: Assim que passar este período de festivais, onde os filmes precisam ser inéditos, o disponibilizaremos para visualização na internet. Dia 05 de dezembro haverá uma exibição gratuita do V.I.D.A. na Cinemateca de São Paulo. Sobre a reação de quem assiste, dou como exemplo, o caso de uma espectadora. Ao termino do filme, depois de um longo silêncio ela me disse: "O filme de vocês é lindo, mas aplaudi-lo será uma falta de respeito com essas pessoas que eu acabei de acompanhar!". E este era exatamente o nosso objetivo, que o V.I.D.A. trouxesse um pouco de reflexão sobre o ser humano. V.I.D.A. será exibido no dia 20 deste mês, às 14h30, na sala Martins Pena do teatro Nacional Cláudio Santoro, em Brasília.