Quando um evento nasce para ser polêmico, começa desde sua preparação. Foi assim desde a primeira edição do XII Cine PE: Festival de Audiovisual. Atualmente na 12º, a edição 2008 do evento, que aconteceu entre os dias 26 de abril e 4 de maio, no Centro de Convenções, em Olinda, Pernambuco, foi alvo de diversas críticas, começando pela escolha dos filmes. A mostra competitiva exibe durante todo o evento curta-metragens, digitais e em 35mm, e longas, concorrentes ao troféu Calunga, entregue no domingo, 4 de maio. Ao todo foram 28 curtas e 13 longas, variando a quantidade de acordo com o dia (teve dia em que foram exibidos 7 curtas e um longa, mas teve dia com apenas 3 curtas).A festa teve início oficial na noite de segunda. Aliás, que festa! Cores e luzes vibrantes, a começar pelo vestidinho verde tomara que caia da eternizada apresentadora do Cine PE, Graça Araújo. Graça sem graça mas tentando sempre, deu as boas-vindas aos cinéfilos lotantes do Teatro Beberibe, do Centro de Convenções, na primeira noite das mostras competitivas do evento. Para iniciar oficialmente, o sejam bem-vindos veio em alto estilo: um espetáculo digno de aplausos de pé do grupo "Sagração da Etnia". Ao som do Hino de Pernambuco, cabloquinhos, capoeira, dança afro e muitos eventos da cultura local deram início ao mix cultural no palco em uma apresentação de pouco mais de 20 minutos, deixando um sorriso bobo no rosto até dos mais durões.Em todos os festivais de cinema ao redor do Brasil são os longa-metragens que atraem o maior público. Geralmente os festivais são escolhidos para exibir as novas criações, prontas para ir ao cinema ou ainda em teste de público. Esses eventos são a oportunidade de ver, em primeiríssima mão, produções antes de estrear no circuito ou que nunca vão chegar nas redes franqueadas de cinema, mas merecem um olhar mais atento. Documentários como "Brizola: Tempo de Luta", exibido pela segunda vez no Brasil na última terça-feira no festival pernambucano, por exemplo, cairá no máximo no Canal Brasil. Mas o Cine PE houve um contraste. Aliás, em todas as edições do evento as atrações principais são sempre os curta-metragens. Exibidos antes dos longas, os filmes com no máximo 20 minutos garantiram as sessões lotadas todos os dias do evento. Curtas como o aplaudido "O Guardador", do paraibano Diogo Benevides, estudante de graduação em radialismo e TV na Universidade Federal da Paraíba (UFPE), foram a grande surpresa do evento, sendo também premiado no final. Rodado em 35 mm dentro da universidade, provavelmente no período de aula, o curta conta a história de seu José, técnico em anatomia e responsável pelo departamento por mais de 30 anos. A função do guardador seria digna de um filme de terror: dissecar corpos para tornar os ossos práticos para estudos. Mas, com humor e simplicidade, Diogo escolheu as frases certas para contar a história certa. "Dossiê Rê Bordosa", animação de Célia Cabral, de São Paulo, exibida no penúltimo dia do evento, desde a introdução caiu nas graças do público. A animação em massinha (lembra de A Fuga das Galinhas?) resgata a personagem dos quadrinhos do cartunista Angeli, a Rê Bordosa. Uma devassa, vivendo a vida literalmente em sexo, drogas e rock and roll. O assassino? O próprio Angeli, que matou a personagem ainda na década de 80, mas deixou nos fãs uma saudade.A maior reclamação dos críticos foi quanto à escolha dos filmes. Fracos e sem atrativos quanto às temáticas. Alguns tentaram ser polêmicos, como o curta "Café com Leite", de Daniel Ribeiro. A produção traz nas primeiras cenas, antes mesmo dos créditos, um casal masculino homossexual trocando juras de amor na cama. Infelizmente o público ainda não é tão receptivo a cenas no estilo queer, mas as caras feias da platéia foram dissolvidas com a afirmação da temática principal do filme: relacionamento. Os pais de um dos rapazes, Danilo, morrem em algum tipo de acidente não especificado e o jovem é obrigado a cuidar de seu irmão mais novo, tendo que quebrar as juras de amor e promessas de morar com o namorado feitas minutos antes do acidente.A ousadia de estilo foi que arrancou a primeira vaia do evento, com o curta-metragem pernambucano "Décimo Segundo". Nas apresentações iniciais muita gente no palco, contando com a presença do ilustre crítico Kleber Mendonça Filho, técnico de som do filme. Infelizmente, não correspondeu aos aplausos. O curta conta a história de um homem chegando de viagem e indo ficar na casa de uma amiga, no décimo segundo andar de um prédio. Sobe, conversa vai e vem, ela vai embora e ele fica lavando pratos. Bom, fim de papo. Ao final, vaias e tentativas de aplausos por ser local. Fica a polêmica, filme pernambucano tem que ser aplaudido porque é pernambucano ou porque é bom?Para fechar o evento com chave de ouro, os nordestinos ganharam um presente, sua própria faceta: o longa "O Retorno", de Rodolfo Nami. Nami baseia-se na obra de Josué de Castro, "Geopolítica da Fome". Para uma noite de sábado, um filme tratando sobre a fome e seca no nordeste deveria deixar a platéia vazia, mas acontece o oposto. Dizem as más línguas que o brasileiro gosta de ver sua miséria. Bom, "O Retorno" traz a pior faceta da miséria nordestina, com rostos maltratados pela seca e velhos com uma vida inteira para contar de fome e sofrimento por algo tão desprezado nas capitais: a água. São pessoas acostumadas a viver em privação de comida e principalmente bebida, algo raro ou inexistente por alguns meses no sertão nordestino. Logo depois veio o não tão aclamado "Minha Vida Não Cabe num Opala", mas ganhador de melhor filme, mesmo sendo exibido com a sala quase vazia (se bem que o filme começou um pouco mais das 11h da noite).Ousadias a parte, o evento cumpriu seu papel: mostrar o que está sendo produzido no país. Que pena que não o melhor da produção, mas o que a equipe da organização acredita ser o melhor. O público não concordou muito com a seleção dos filmes mas lotou todos os dias, com um número aproximadamente de 1.500 pessoas por noite. A próxima edição promete.
O XII Cine PE foi sucesso de público, mas nem tanto de crítica