Brasileiros e Imperdíveis - Parte 2

Seis Documentários Essenciais

O Sol - Caminhando contra o Vento de Tetê Moraes (2006)Lá em 68 Caetano já cantava "... o sol nas bancas de revista me enche de alegria e preguiça...". O que pouca gente sabe é que o tal sol não tinha nada a ver com o famoso astro-rei que no verão transforma Bangu numa frigideira de 45 à sombra, era sim um jornal, um dos poucos veículos da imprensa a bater de frente contra a ditadura vigente da época. O documentário da diretora Tetê Moraes, que chegou a trabalhar no Sol, usa entrevistas, imagens da época e depoimentos para tentar recriar o espírito de inovação e audácia que permearam suas páginas. Com um time de colaboradores de respeito, o jornal, diferente dos outros meios de comunicação, cutucava a opressão reinante com uma dose de criatividade e ironia inimagináveis na época.Com depoimentos generosos de Chico Buarque e Gilberto Gil, passando por Fernando Gabeira, Betty Faria, Hugo Carvana e mais quatro dezenas de intelectuais e artistas, o documentário nos dá uma pequena amostra do caleidoscópio contracultural da época: Ditadura, Ai-5, festivais de música, estudantes batendo e apanhando da polícia, censura ampla, geral e irrestrita. Pode-se dizer sem susto que o Sol fez a crônica mais exata e libertária do seu tempo, e apesar da vida curta - duraria apenas quatro meses - os ecos de sua ousadia estão aí, até hoje. Moacir Arte Bruta de Walter Carvalho (2005)Moacir poderia muito bem figurar no rol daqueles artistas loucos, geniais e incompreendidos. O profeta Gentileza, Arthur Bispo do Rosário, Van Gogh... Pois por longos quinze anos o diretor Walter Carvalho (de Cazuza - O tempo não pára) insistiu na idéia de tirar esse louco genial e sua arte do anonimato. Vivendo isolado na Chapada dos Veadeiros e assolado por problemas físicos e mentais, Moacir criou para si um mundo todo particular com suas pinturas e desenhos. Um mundo surreal, misterioso, habitado por criaturas bizarras, animais fantasmagóricos, mulheres nuas - bem, percebe-se que Moacir não é tão pirado assim - e seres satânicos. Usando as paredes de sua própria casa como telas gigantes não é à toa que o artista vem causando celeuma entre os evangélicos do lugar (alguns seus próprios parentes); no fantástico mundo de Moacir orgias explícitas e infernais são lugar comum. Além de Carvalho captar com franqueza o universo que gravita em torno de seu personagem - suas limitações, os preconceitos do qual é vítima e sua forma de ver o mundo, ou seja, a gênese de sua arte - o diretor também acerta ao registrar o encontro entre Moacir o criador bruto, cru, e o prestigiado e erudito artista plástico Siron Franco. Dois mundos que se encontram e se completam. Duas faces distintas de uma mesma moeda universal, a arte. Língua - Vidas em português de Victor Lopes (2004)Uma produção conjunta dos compadres Brasil e Portugal, Língua - Vidas em português é um dos mais belos documentários já feitos sobre a língua portuguesa. Sim, há outros filmes sobre o assunto, mas nenhum que trate a nossa língua pátria com tanto carinho, tanta poesia. Filme de estréia do português Victor Lopes, Língua parte da premissa de que não existe uma língua portuguesa e sim várias línguas portuguesas, e para atestar isso colhe depoimentos de pessoas que falam português ao redor do mundo. Do escritor português ganhador do prêmio Nobel José Saramago a um pastor que trabalha vendendo balas nos ônibus do Rio. De um vendedor de pães em Goa, ex-colônia portuguesa na Índia, ao sambista Martinho da Vila. De Edinho, adolescente moçambicano que sonha em ser cantor de rap, a Teresa Salgueiro, a divina voz do grupo Madredeus, é impossível não se sentir fascinado pelos diferentes timbres, formas, sons e sotaques que a língua portuguesa foi ganhando ao aportar em lugares tão diversos do mundo. Impossível não assistir Língua - Vidas em português e não se sentir orgulhoso da própria língua. Mais que um documentário sobre um dos tesouros que a colonização portuguesa legou ao mundo o filme se apresenta como uma verdadeira declaração de amor ao idioma luso. Para assistir, ouvir e se emocionar.

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