Já são mais de dois anos desde que Marighella foi exebido - sob muitos aplausos - no Festival de Berlim. Agora, o longa assinado por Wagner Moura, estreante na direção, finalmente chega aos cinemas brasileiros. O atraso, é claro, não passou despercebido: em entrevistas, o elenco, equipe e diretor fizeram questão de relembrar os imbróglios que o filme estrelado por Seu Jorge sofreu durante estes dois últimos anos - um acontecimento que Wagner Moura, inclusive, relaciona com a história contada nas telas.
“O filme foi proibido de estrear aqui, o que é um absurdo. Fomos atacados desde o começo. Na época em que estávamos financiando, durante as filmagens, fomos ameaçados, depois houve todo o imbróglio com a Ancine”, contou em entrevista ao AdoroCinema. O diretor explicou explicou que a O2, produtora de Marighella, recorreu à Agência Nacional do Cinema (Ancine) diversas vezes para que o longa pudesse ser veiculado no Brasil.
Além das negativas a Marighella, o ator de Tropa de Elite contou que outras obras culturais passaram pela mesma burocracia e falou em censura. “Não tenho a menor dúvida de que Marighella foi censurado. Os pedidos eram corriqueiros e num momento em que Bolsonaro falava abertamente sobre filtragem na Ancine, que a Ancine tinha que acabar. Não foi só com a gente. Era uma época em que falavam que não poderia ter um filme de Bruna Surfistinha, que editais LGBT eram cancelados inexplicavelmente”, disse.
Em 2019, o presidente Jair Bolsonaro declarou que extinguiria a Ancine, caso as produções audiovisuais não pudessem passar pelo filtro do governo. “Já que é um órgão federal, se não puder ter filtro, extinguiremos a Ancine. Privatizaremos, passarei ou extinguiremos", afirmou durante um evento em comemoração ao Dia Nacional do Futebol, realizado em setembro de 2019. O governante não deu muitos detalhes sobre o tipo de “filtro” a que se referia, mas usou a palavra “culturais” para definir.
O que é a Ancine?
Fundada em 2001, Agência Nacional do Cinema é o órgão federal que regula e fiscaliza a indústria cinematográfica e audiovisual no Brasil. Entre os principais objetivos da agência estão o fomento às produções culturais, bem como estimular o mercado, garantir o acesso às produções cinematográficas e a participação delas no mercado interno e externo.
Em relação a Marighella, a justificativa da Ancine para o imbróglio na liberação do filme tem a ver com outra produção da O2, que teve um problema com prestação de contas e cumprimento de prazos junto ao órgão. Assim, a inadimplência atravancou o processo de financiamento do filme de Wagner Moura.
Durante coletiva de imprensa realizada em São Paulo, a produtora de Marighella Andrea Barata Ribeiro também falou sobre os problemas com a agência: “Quero lembrar que a Ancine fez 20 anos e que em 18 esteve ao lado dos produtores brasileiros. Faz dois anos que a agência foi desmontada, que a cultura desmontada. Isso é uma forma de censura. Tiraram a diretoria e a que entrou não fazia o processo andar”, afirmou.
Os ataques e processos burocráticos não intimidaram a equipe do filme e Wagner Moura sempre esteve confiante de que a situação seria superada. “Lutar para que o filme estreasse nos cinemas para os quais foi feito era também fazermos parte de uma luta pela democracia no Brasil hoje, pelo direito de um produto cultural estrear como qualquer outro. Se não nos engajássemos nesta luta, não estaríamos fazendo jus ao filme e à memória de Marighella”, disse o diretor ao AdoroCinema.
Além de Seu Jorge no papel principal, Marighella conta com Bruno Gagliasso, Adriana Esteves, Bella Camero, Humberto Carrão, Pastor Henrique Vieira e Maria Marighella, neta de Carlos Marighella. O filme já está disponível nos cinemas brasileiros.