Os ânimos na internet ficaram exaltados na última sexta-feira com a volta de James Gunn ao comando de Guardiões da Galáxia 3.
Você deve se lembrar que, em julho do ano passado, durante a Comic-Con de San Diego, o diretor foi afastado da franquia sem direito a perdão. Tudo porque vieram a tona alguns tweets muito antigos escritos por ele, mensagens que mostravam Gunn compartilhando de ideias bastante ruins sobre temas delicados como estupro, Aids e pedofilia.
A Disney considerou as opiniões "indefensáveis e inconsistentes em relação aos valores do estúdio", o que causou o desligamento imediato do cineasta. Não vale a pena nem divulgar aqui as tais mensagens: tratam-se de comentários (brincadeiras?) muito fracos e de mau gosto. Gunn pediu tantas desculpas que ficou até chato, mas não adiantou.
Essa história ficou mais conturbada porque a opinião pública não chegou a um consenso. É claro, será que alguma vez na história da humanidade já existiu algum tipo de consenso? De um lado, houve gente que fez campanha raivosa nas redes sociais demandando punições severas a Gunn. Do outro lado, o elenco de Guardiões da Galáxia se mobilizou, os fãs fizeram de tudo e até a Marvel pediu encarecidamente para a Disney mudar de ideia. Mas não houve jeito, mesmo quando ficou claro que toda a confusão -- não apenas o ressurgimento das mensagens, como a repercussão delas na mídia -- tinha forte conotação política. Sim, assim como no Brasil, a polarização atual nos Estados Unidos vai muito além de barulhentos bate-bocas entre deputados.
James Gunn merecia ser afastado da franquia que o deixou famoso por causa de coisas que escreveu uma década atrás? Provavelmente, sim... se as regras se aplicarem igualmente a todos os profissionais de Hollywood que cometeram atos criminosos ou exibiram comportamentos questionáveis. Sabemos que existe um direcionamento da indústria nesse sentido (Harvey Weinstein, Bryan Singer, Kevin Spacey, Louis C.K. e muitos outros que o digam). E ainda que não se possa generalizar e que cada caso deva ser analisado individualmente, certas decisões parecem menos óbvias do que outras -- a demissão de Gunn é uma dessas.
Analisando friamente o caso de James Gunn: ele escreveu bobagens, pediu desculpas, mostrou arrependimento, jurou que mudou. Em um primeiro momento, nada adiantou e ele foi demitido assim mesmo. Tempos mais tarde, acabou perdoado. O que mudou para a Disney de lá para cá? Os valores do estúdio se modificaram? Fico pensando se esse tipo de atitude redentora daria certo com os outros cidadãos citados no parágrafo anterior...
Do lado da Disney, tudo indica que a empresa sentiu a pressão e tomou uma decisão precipitada quando afastou Gunn logo de cara. Será que dava para ser diferente? Talvez fosse difícil para a maior empresa do entretenimento ficar em cima do muro com tanto barulho inconveniente rolando sobre sua cabeça. A "Casa do Mickey" precisou tomar uma decisão rápida e foi lá e o fez. Conforme muito bem definiu meu colega Renato Furtado neste AdoroCinema, "para navegar as águas turvas do século XXI e chegar do outro lado com danos mínimos, indivíduos e empresas precisam de respostas incisivas e inequívocas: quem fica em cima do muro ou sinaliza incongruências é engolido".
Da mesma forma que pessoas podem mudar, decisões de empresas também podem mudar. Se James Gunn assumiu remorso por ter dito coisas indignas no passado, então qual é o problema de uma grande corporação modificar uma resolução meses depois? Inclusive, após a revelação de que foi recontratado, Gunn rapidamente agradeceu a todo mundo que pôde. Quem não faria o mesmo?
Foram oito meses desse assunto na mídia e nas redes sociais, até que tudo inesperadamente voltou ao mesmo lugar onde começou. Foi um processo chato e desgastante para todas as partes envolvidas -- James Gunn, a Marvel, a Disney, os atores e atrizes de Guardiões da Galáxia, a imprensa sedenta por desdobramentos e, por último mas não menos importante, para os muitos fãs dessa franquia, que nada tinham a ver com isso. Tanto barulho... pra quê mesmo?
Estamos muito sensíveis e reativos, isso não há dúvidas. Não estamos só indignados com tudo o que é dito, mas nos sentimos obrigados a emitir opiniões sobre tudo, o tempo todo. A verdade é que ninguém precisa dar tanta opinião. E ninguém precisa saber de tanta opinião.
Esta é a minha opinião sobre o assunto. Não que alguém tenha perguntado...
Pablo Miyazawa é colunista do AdoroCinema e consome cultura pop há quatro décadas, de Star Wars a Atari, de Turma da Mônica a Twin Peaks, de Batman a Pato Donald. Como jornalista, editou produtos de entretenimento como Rolling Stone, IGN Brasil, Herói, EGM e Nintendo World.