Segundo longa-metragem de Gabriela Amaral Almeida, A Sombra do Pai é o retrato de uma família despedaçada. Após a morte da mãe, a pequena Dalva () fica sob os cuidados do pai, Jorge (Julio Machado) e da tia, Cristina (Luciana Paes). Quando o pai fica doente depois de um acidente de trabalho, a menina precisa deixar de lado a infância para cuidar do pai, que por sua vez, tem que lidar com a frustração de perder aspectos de sua paternidade.
O estranho núcleo familiar dá espaço para uma trama de terror que utiliza o abandono como metáfora ao apresentar um pai zumbificado e trazer as religiões de matrizes africanas para o texto, envolto em crenças e magia.
Para a diretora, que apresentou o filme e conversou com o público durante o Festival do Rio, os bons filmes de gênero têm uma relação com o drama. “Acredito muito em boas histórias, e acho que o gênero do horror tem como objetivo tornar alegóricos temas sobre os quais precisamos conversar,” explica. “É a maneira como eu consigo enxergar o mundo. Para mim, os bons filmes de horror são os filmes sobre a vontade de amar.”
Para Luciana Paes, que já havia trabalhado com Amaral Almeida em projetos anteriores, A Sombra do Pai tem algo de especial. “A Gabriela é uma diretora que trabalha muito com o inconsciente. E ela diz uma coisa que é muito certa. O cinema tem que trabalhar o inconsciente, se não, não há propósito em ser algo deste tamanho todo.”
Quando questionada sobre o fascínio criado pelo terror e o que ele representa face ao cenário político, a cineasta refletiu:
“Precisa ter cuidado, porque o filme de terror é alegoria. E do lado de fora as coisas estão mais alegóricas do que dentro da tela. Daqui a pouco eu estou fazendo documentário. Estamos em um período, no Brasil e no mundo, de transição, de bases muito móveis. E neste sentido, o horror é a força, ele representa o medo do desconhecido. O espírito da época traz a possibilidade do resgate dessas histórias.”
Um dos elementos mais sensíveis do filme, a espiritualidade é trabalhada com bases nas variadas crenças identificadas no Brasil. Almeida conta que a importância deste detalhe reflete sua própria criação na Bahia e a mistura de elementos com que se familiarizou desde a infância. "A espiritualidade da Dalva é trabalhada de forma muito infantil," compartilha. "No set, nós criamos uma relação com os objetos, criamos um cantinho e fomos dando significado a elementos do dia a dia dela. Boneca, velas, xuxinha de cabelo, giz... e, a partir disso, criamos uma mitologia."