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    Festival do Rio 2018: Os conflitos familiares de Domingo ganham novos significados diante das transformações políticas do Brasil

    Parceria de Fellipe Barbosa e Clara Linhart conta com Camila Morgado, Ítala Nandi, Augusto Madeira e Chay Suede no elenco.

    Sabe quando a família começa a discutir no grupo do Whatsapp? Agora, imagine reunir toda essa galera debaixo do mesmo teto, com cheiro e fumaça de churrasco ao fundo. E, justamente, num marcante dia político. Isso é Domingo, parceria de Fellipe Barbosa com Clara Linhart (colaboração já existente, em menor escala, nos elogiados Casa Grande e Gabriel e a Montanha).

    Exibida na Première Brasil do Festival do Rio, essa comédia dramática acompanha uma reunião familiar burguesa em 1º de janeiro de 2003, comemorando o ano novo, durante a posse do ex-presidente Luis Inácio 'Lula' da Silva. Logo, problemas se entrelaçam: sogra (Itala Nandi) e nora (Camila Morgado) que se odeiam, uma nervosa grávida de nove meses (Martha Nowill), crianças correndo para todo lado, adolescentes fazendo besteira, beijos roubados e os empregados tentando manter tal caos controlado.

    O grande destaque do debate, realizado no Cinema Odeon na quinta-feira (08/11), foi perceber como o contexto político nacional traz novas camadas para Domingo. Para Itala Nandi, há potencial dele se tornar um marco do cinema: "Gravamos o filme em novembro de 2017. Um ano atrás. E nenhuma das críticas que o roteiro apresenta tinha tamanha importância como agora. Adquiriu outra linguagem, que eu nem tinha percebido que existia quando rodamos. Ele ficou historicamente atual. Como trabalhei com muitos diretores do Cinema Novo posso dizer que esse filme inicia um Cinema Novo Novo."

    Surpreso com tal elogio, Barbosa também completa esse pensamento: "Quando fizemos esse filme, a gente não imaginava o momento atual. Acreditamos que estávamos fazendo um longa com uma distância temporal, sobre o medo da burguesia de surgir uma ditadura do proletariado. Só que esse foi o início do medo que nos levou aos dias de hoje. A ironia é que quem está com medo, hoje, somos nós."

    Desenvolvido por anos, o primeiro (e bem pessoal) roteiro profissional escrito por Lucas Paraizo (Gabriel e a MontanhaSob Pressão) não tem medo de apontar influências na realidade. "Ele carrega o ideal de um estudante recém-formado, com todas as referências da vida até então. Por outro lado, reflete a realidade de um país em transformação e a reação de parte da minha família. Desde então, tantas coisas aconteceram, tantos valores foram mudando. O filme precisou se atualizar também. É cheio de coisas do ambiente em que fui criado, mas ouso dizer que também é uma biografia de todo mundo."

    Por não ser uma ideia original sua, Barbosa achou natural a parceria com Linhart. Não somente pelo trabalho de fazer vários planos-sequência com muitos atores no mesmo plano. Algo a mais separa Domingo do resto de sua filmografia: "A grande diferença é que ele rejeita a reconciliação. Eu tenho esse lado meio otimista e um pouco ingênuo, mas aqui não cabe isso. Tentamos mostrar as visões de opressor e oprimido ao mesmo tempo. Foi um processo que acompanhou toda a equipe, culminando na ideia de reafirmar tal opressão."

    Mas a provocação política não está apenas no roteiro. A responsável por revelar um detalhe interessante [e a intérprete da jovem Valentina, Manu Morelli: "O local onde filmamos era uma charqueada, onde torturavam escravos. O trágico é que, hoje, muitos usam esse terreno para comemorações. Fazer uma crítica à classe que, querendo ou não, dá continuidade para essa escravidão é algo muito significativo. Mostra como a ignorância é transmitida de geração em geração."

    O curioso será observar, justamente, como as próximas gerações irão analisar Domingo. Estaria o mundo girando em círculos ou novas opiniões virão, abrindo caminhos como os galhos de uma arvore genealógica? Com Chay Suede e Augusto Madeira, a estreia no circuito nacional está marcada 14 de março de 2019. Leia a crítica do AdoroCinema.

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