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    Mostra SP 2018: Vera Holtz mistura ficção e documentário para retratar a sua vida em As Quatro Irmãs

    "Não há memória sem imaginação", explica o diretor Evaldo Mocarzel.

    Aline Arruda

    Vera Holtz não teve a juventude típica das meninas de Tatuí, cidade do interior de São Paulo. Enquanto muitas garotas aceitavam o modelo de família tradicional, Holtz se viu atraída pelas artes plásticas, pelo teatro e pela performance. Por isso, teve brigas com o pai conservador, e gerou certa distância da família ao construir a carreira no Rio de Janeiro.

    Esse percurso é contado por uma mistura de documentário e ficção em As Quatro Irmãs. O cineasta Evaldo Mocarzel reúne Vera e suas três irmãs - duas mais velhas, uma mais nova - no casarão que pertenceu à família. Juntas, elas evocam as boas lembranças de festas e brincadeiras, mas também recordam as agressões do pai e os obstáculos de uma sociedade repressora. Além disso, elaboram ficções baseadas no passado, a exemplo das cenas em que Vera interpreta a própria mãe.

    "Não há memória sem imaginação", explicou Mocarzel à imprensa, ciente de que a percepção dos fatos é muito diferente de acordo com a vivência de cada um. As Quatro Irmãs adquire um significado ainda mais forte pelo fato de Vera Holtz estar assumidamente perdendo a memória, algo exposto sem tabus no projeto.

    Aline Arruda

    "Ela se submeteu a todos os meus caprichos", brinca o diretor, que pediu para cada uma das irmãs reproduzirem as cenas diversas vezes para as necessidades da filmagem. "Elas me chamavam de insaciável!". A intenção, segundo ele, era atingir uma "irrupção de memória" através de um "cinema performativo". Mocarzel admite a influência direta de clássicos do cinema como Monika e o Desejo, de Ingmar Bergman, e Acossado, de Jean-Luc Godard, cujos trechos quase entraram na versão final.

    Mas não seria doloroso relembrar o comportamento agressivo do pai e expor essas feridas ao público? Vera Holtz garante que não. "Fiquei muito confortável, mesmo que tenha percebido o peso dessas passagens ao ver o filme na tela grande. Mas são memórias de menina, e estávamos todas juntas", ela ameniza.

    Aline Arruda

    Sobre as transformações da propriedade familiar ao longo da trama, ela confessa o prazer quase juvenil de reconstruir esse espaço de memória: "Ninguém tocava no casarão, era algo meio sagrado. Mas nós mexemos em tudo!". De fato, Mocarzel e as irmãs Holtz mudam os móveis, pintam as paredes, utilizam objetos, criam novos espaços. Tudo é possível neste grande palco em que a lembrança se torna ficção, e onde as quatro mulheres adultas podem se divertir como garotas novamente.

    O belo As Quatro Irmãs será exibido 42ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, entre 18 e 31 de outubro, antes de chegar ao circuito comercial.

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