No penúltimo dia do Fantastic Fest em Austin, duas presenças importantes ocuparam as mesas de debates promovidos após a sessão: Sam J. Jones, o eterno Flash Gordon, e o diretor David Robert Mitchell, que apareceu para dar mais explicações sobre o enigmático Under the Silver Lake. Depois de passar por Cannes, a exibição marcou a estreia do filme em território norte-americano, que deve chegar ao grande circuito dos Estados Unidos em dezembro.
Em Under the Silver Lake, Andrew Garfield interpreta um jovem inteligente e desocupado que entra numa espiral de suave paranóia após o desaparecimento da vizinha que estava paquerando. Tendo Los Angeles e sua estranha cultura de celebridades como cenário, o filme ironiza a crença constante de que tudo precisa ter um sentido maior e traz uma avalanche de referências à cultura pop. Segundo a crítica do AdoroCinema: "As pistas não constituem detalhes dentro de uma história maior, elas são a história maior" (leia o texto completo).
Antes da sessão começar, Mitchell deu o aviso: "Ao invés de tentar entender, se deixe levar pelo filme. Não fique tentando captar tudo, até porque provavelmente você não vai conseguir". Pretencioso? Talvez. Mas o volume de easter eggs é propositalmente tão absurdo que já é possível prever a Internet sendo tomada por perguntas quando o filme chegar ao público em geral. De cartazes de filmes de Hitchcock até ouvir disco ao contrário e revirar revista de games procurando a saída para um jogo, tudo está ali por um motivo - ou não.
"Tem tanta coisa escondida nesse filme que talvez você só perceba na terceira ou quarta vez que assistir", explicou o diretor, orgulhoso de suas referências. Apesar de parecer um filme atual, Mitchell também esclareceu que é um momento do passado, que "já foi": "muita gente vai ver e achar que o filme é contemporâneo, mas não é. “Ele acontece especificamente no final do verão de 2011". E certamente esta informação vai sentar no topo da pilha de irrelevâncias relevantes que vão deixar muita gente pesquisando obsessivamente sobre o filme.
À tarde, o Flash Gordon em pessoa apareceu para conversar com o público após a exibição do documentário sobre sua vida, Life After Flash. O filme acompanha a jornada de Sam J. Jones por eventos no estilo Comic Con, passa de leve por momentos complicados da vida do ator, que inclusive o afastaram do mercado do entretenimento, e ainda traz conversas com diversos envolvidos no longa clássico de 1980. Entre os depoimentos mais interessantes estão o do mestre da Marvel Stan Lee e do músico Brian May, do Queen, que compôs o tema original do herói.
Apesar de ter entrevistados relevantes, faz falta uma variedade maior de imagens de arquivo para contar a história. O ritmo é prejudicado e, mesmo tendo um grande personagem, o material final fica mais próximo de jornalismo do que de cinema propriamente dito. O ponto alto é a discussão sobre o fato de Gordon ser ou não um super-herói: enquanto Stan Lee acredita que, sem superpoderes não há super-herói, outros especialistas pensam diferente. Afinal, está aí o Batman para provar o contrário.
Percebendo uma tendência, a diretora Lisa Downs já planeja um próximo filme: Life After the Navigator, sobre a vida do ator Joey Cramer, ainda jovem quando estrelou O Vôo do Navegador em 1986. Ao final do papo, o simpático Jones já havia transformado o debate numa grande palestra motivacional: "faça pelos outros e você conseguirá o que quer. Eu tive que me superar, ser humilde e aqui estou eu. Meu telefone está tocando e estou voltando a trabalhar como ator", declarou emocionado.