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    Coração de Cowboy: Diretor e elenco falam sobre "conto de fadas sertanejo" que homenageia Chitãozinho & Xororó (Entrevista)

    O cantor e ator Gabriel Sater e a atriz Thaila Ayala estrelam este drama romântico musical que marca a estreia de Gui Pereira como diretor de longas-metragens.

    Em um momento em que o sertanejo universitário se firma como a maior força da música brasileira com projeção na TV e rádios, o protagonista do drama romântico musical Coração de Cowboy é um representante frustrado do popular gênero musical. Dirigido pelo cineasta estreante Gui Pereira, o longa-metragem conta com o ator e músico Gabriel Sater no papel de Lucca, um cantor de sucesso com fantasmas em seu passado e uma ânsia por não perder sua integridade artística.

    Para Sater, filho de Amir Sater, um dos bastiões da música sertaneja de raiz, o filme não deve ser encarado como uma crítica à música moderna e sim como uma jornada de alguém em busca de sua verdade pessoal. "A questão maior é a perda da identidade. Eu conheço artistas que trabalham no sertanejo universitário e a identidade deles está ali e eles conseguem inovar dentro da linguagem, porque tudo é linguagem. Todos os estilos têm uma característica pela qual eles se enquadram no mercado”, avaliou Gabriel em entrevista ao AdoroCinema.  "Você pode remover o sertanejo e colocar axé ou pagode. Pode até remover o tema da música e falar sobre cinema, sobre jornalismo, porque Coração de Cowboy é um filme sobre uma cara forçado a fazer uma coisa que ele não quer", complementou Pereira.

    Depois de fundir suas habilidades como ator e cantor em musicais para o teatro, na novela Meu Pedacinho de Chão e no filme Malasartes e o Duelo com a Morte, o músico está muito à vontade no papel de Lucca e colabora com composições próprias na trilha sonora do filme que estreou nos cinemas brasileiros no último dia 26 de setembro.

    Na trama de Coração de Cowboy, Lucca teve juventude marcada por uma tragédia pessoal envolvendo a morte de seu irmão, com quem cantava em um grupo musical ao lado de uma amiga de infância. Já adulto, isolado da família e desfrutando da opulência e do prestígio trazidos por seu sucesso comercial, o artista é controlado a mão de ferro por sua empresária (Françoise Forton). É ela quem empurra o protagonista a fazer parcerias musicais meramente comerciais, cantar canções vazias sobre curtição e participar de um reality show ao lado de artistas sertanejos que gostam mais de Coldplay do que de Tonico e Tinoco. Após um reencontro com sua parceira musical na infância, Lucca volta para a sua cidade natal, tenta fazer as pazes com o pai (Jackson Antunes) e conhece a indômita Paula (Thaila Ayala), dona de um bar que preserva a tradição da música caipira.

    "É um presente atuar no filme porque eu me identifico muito com a história da Paula”, revela Ayala. "Ela é uma mulher muito forte que foi criada pelos tios, que perdeu os pais muito cedo. Ela é super independente e eu acho que isso retrata muito a mulher brasileira, é a história de milhares de mulheres, da minha mãe, das minhas irmãs, a minha própria história é parecida em muitos lugares com a da Paula."

    Depois de experimentar o fazer cinematográfico ainda na infância e adolescência, estudar cinema em Los Angeles e dirigir curtas, comerciais e videoclipes, Pereira queria encontrar uma inspiração afetiva para desenvolver seu primeiro longa-metragem. A inspiração para o projeto chegou, é claro, quando o cineasta estava ouvindo música. "Eu acho que um primeiro longa-metragem tem que ser algo com muita personalidade, que mostre mais o lado pessoal do diretor do que qualquer outra coisa", defende Pereira. "Na época [em que projeto começou a ser desenvolvido], eu escrevia roteiros ouvindo música e no modo aleatório começou a tocar 'Fogão de Lenha', de Chitãozinho & Xororó, e a música bateu em mim de um jeito que me fez dizer: 'É isso o que eu tenho que fazer, eu tenho que voltar às minhas origens, botar as músicas que eu gosto'."

    Os cantores que eternizaram a canção "Evidências" são os grandes homenageados do longa-metragem, que revisita canções de Chitãozinho & Xororó com novos arranjos assinados por Lucas Lima, também autor da trilha sonora original. "Quando eu e o Lucas estávamos separando músicas para o filme, fizemos uma seleção com nossas 100 músicas sertanejas favoritas e 90 eram do Chitãozinho e Xororó. Aí eu falei, ‘Lucas, acho que a gente tem que prestar uma homenagem para eles’. Então eu escrevi mais algumas coisas no roteiro, para ficar mais redondinho, falamos com a dupla, explicamos do projeto e contamos que seria uma grande homenagem da música sertaneja através da música do Chitãozinho e Xororó.” Com o apoio dos ícones do gênero, Pereira afirma que foi mais fácil conseguir que artistas como Rio Negro e Solimões, Marcos e Belutti e Rick Sollo fizessem participações especiais com performances de canções clássicas como "Saudade de Minha Terra", "Não Desligue o Rádio" e "Deixei de ser Cowboy por Ela" no filme.

    Para viver o cantor Lucca, Sater conta que, durante a preparação para as gravações, só assistiu filmes que tinham alguma conexão com a proposta de Coração de Cowboy e só escutava músicas que se ligavam com os dramas dos personagens do longa-metragem. "A partir disso eu fiz uma pesquisa muito intensa dos artistas sertanejos atuais, porque eu não conhecia muito desse mercado atual de sertanejo mais pop", relata.

    Sater afirma que vale a pena deixar sua carreira musical em segundo plano para trabalhar em um outro projeto artístico porque o diálogo entre as duas artes faz dele um profissional melhor. "Para deixar de lado durante meses da minha vida a minha carreira solo tem que ser um projeto que vai jogar o meu nível artístico para cima, e depois de todos esses projetos eu chego para fazer os meus shows e a diferença é absurda, você chega com a alma renovada, cheia de novidades e de inspirações", afirma. Para o diretor, era fundamental encontrar alguém como Gabriel para o papel principal. "Eu não queria um ator que tocasse, eu queria um cantor que atuasse". Para o futuro, Sater se prepara para mais um filme envolvendo o universo musical. "Eu ainda estou trabalhando nos direitos. É a história de um ídolo brasileiro mas eu não posso contar nada porque eu ainda estou negociando."

    O ator afirma que trabalhar em Coração de Cowboy ativou sua "memória emotiva do passado" ao resgatar clássicos da música sertaneja. Ayala compartilha do mesmo sentimento. "Eu acho que o projeto está lindo e para mim foi uma volta às origens porque pouca gente sabe mas eu sou caipira. Cresci na roça, na vida sertaneja, caipira pirapora, que eu tanto amo e prezo. A minha primeira influência musical foi o sertanejo que meu pai ouvia muito, Rio Negro e Solimões, Milionário e José Rico. Eu acho que poder retratar uma parte tão grande da história do nosso país, uma parte tão grande da nossa cultura e que é tão pouco retratada no cinema, é realmente especial."

    Além dos clássicos sertanejos, Sater contribuiu com três canções originais para a produção. Uma delas, "Meu Lugar", tem um impacto especialmente emocional na narrativa. "A música entrou em uma cena muito bruta que eu toco com o Jackson em um dos clímax do filme", conta o ator. A parceria com ator veterano, aliás, rendeu muitos elogios do elenco. "Ele é uma alma iluminada, uma pessoa incrível, teve uma troca sincera entre a gente, o tempo inteiro buscando o melhor. Quando a gente fazia nossas cenas saia faísca e o Gui ficava muito feliz. Foi uma energia muito curiosa, a nuca arrepiava, o corpo inteiro entrava em uma adrenalina muito curiosa, eram embates muito sérios", recorda Gabriel. Pereira descreve Jackson como alguém que tem uma "atmosfera muito forte" ao redor de si e diz que as falas do roteiro ganharam outra com o ator. "Quando ele lê um texto ele melhora suas palavras, não sei como isso é possível. Ele lê sua frase é como se fosse ouvir poesia."

    Uma coisa que chama a atenção no projeto é que Coração de Cowboy evoca, com sua estética, uma atmosfera de sonho, graças a aura de sua fotografia. Gui Pereira explica que a intenção era se inspirar nos filmes de fantasia. "Junto com o diretor de fotografia eu queria criar o filme como se fosse uma fábula sertaneja, então eu quis dar realmente esse olhar mais fantasioso, uma fotografia mais clássica, uma coisa que remete a uma pintura. O que a gente queria criar era uma fotografia nostálgica que remetesse a uma fábula, como um conto de fadas sertanejo."

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