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    Admirável Mundo Pop: De volta para o passado... no futuro

    Os serviços de streaming facilitam muito a vida, mas deixam alguns antigos hábitos muito saborosos para trás.

    Difícil alguém que esteja ligado à cultura pop, hoje em dia, não assinar algum serviço de streaming. Seja pela variedade, pela economia ou só pela praticidade, é uma ferramenta essencial para quem gosta de música, séries, filmes, livros ou games. Mas junto com toda a facilidade que se propõe no nosso novo tipo de consumo de produtos, também há algo ali que nos faz sentir falta de velhos hábitos.

    Ver filmes, por exemplo. Você se lembra do ciclo? Depois que saía de cartaz, um filme levava um tempão (às vezes mais de um ano) para ganhar versão em VHS ou em DVD. Lembro que a visita semanal à locadora da esquina era um momento mágico -- eu nunca saía de mãos vazias. E se aquele lançamento que eu tanto queria ver já estivesse alugado (o que era bem provável), era "obrigado" a escolher qualquer outra coisa para assistir no fim de semana. Foi assim, na indisponibilidade do que eu desejava, que conheci muitos dos meus filmes favoritos (bons e ruins) dos anos 1980 e 90.

    E quando sua banda do coração lançava um disco novo na era pré-internet? A gente só sabia de algo novo quando escutava uma música nova no rádio, ou via um clipe na TV, ou até aquela "coisa antiga" de ler uma matéria em revista ou jornal. E se nada disso acontecesse, uma visita à loja de discos acabava dando o recado. Hoje, é só você começar a seguir seus artistas favoritos que os serviços de streaming mandam avisos automáticos sobre qualquer novidade. Quer escutar um disco que acabou de sair? Não precisa mover um único músculo do corpo - é só olhar a notificação na tela do celular e apertar o play.

    Esses serviços já estão perfeitamente adequados a esses tempos preguiçosos (ou apenas confortáveis) que já temos também livros, em texto ou áudio, e games, antigos ou recentes, ao alcance de um clique automático e/ou um download. E essas plataformas já produzem produtos exclusivos (como é o caso de Netflix e Amazon), o que forçou os tradicionais criadores de conteúdo a criarem seus próprios serviços. A Disney planeja lançar o seu em breve. E a DC Comics anunciou uma novidade semelhante, que convenientemente batizou de DC Universe.

    Eu experimentei uma versão beta do DC Universe durante a última Comic-Con de San Diego. Rob Kamphausen, vice-presidente da Warner Digital Labs, me alertou de que se trata de uma "experiência". "É mais do que um serviço de streaming tradicional e mais do que uma plataforma de quadrinhos -- é tudo isso junto e muito mais", ele me disse. "Sempre nos perguntamos: como seria criar um aplicativo que pudesse agradar a todos nossos fãs? A DC tem 80 anos. Temos materiais de arquivo, novos conteúdos, vídeos, quadrinhos… Cada pessoa tem seu Batman favorito! Queremos garantir que vamos conseguir falar com todo mundo."

    O DC Universe estará disponível para tablets, celulares, smart TVs e pela web, por enquanto só nos Estados Unidos, a partir de algum momento entre setembro a dezembro deste ano. O lançamento deve se estender a outros países no ano que vem -- o Brasil está nos planos, mas não na primeira fase do projeto. O valor da assinatura varia de US$ 7,99 (por mês) a 75 (por ano). Do lado do cinema, eles vão disponibilizar todos os filmes dos super-heróis da editora, do maravilhoso Superman de 1978 ao questionável Liga da Justiça de 2017. Já entre desenhos e seriados, há produções antigas como a adorada animação Batman do Futuro e lançamentos novinhos como a hypada série live-action Titans.

    A ideia é que a plataforma sirva também como uma ferramenta para promover as futuras investidas multimídia da DC, seja em séries televisivas ou em seu universo cinematográfico. Para isso, estão previstas seções especiais com curadoria da equipe da DC, que organizam produtos diversos de acordo com a intenção e a ocasião -- por exemplo “Conheça os Jovens Titãs” ou “Tudo sobre o Aquaman” --, reunindo filmes, desenhos e HQs que melhor representem a trajetória de cada personagem para novos fãs.

    Mas a cereja do bolo é o robusto acervo de quadrinhos. Kamphausen acredita que mais de 25 mil revistas foram digitalizadas e estarão disponíveis de alguma forma aos assinantes. Mas há um “catch”: todo conteúdo estará dentro da plataforma, mas nem tudo estará disponível na hora. Alguns produtos específicos precisam ser adquiridos à parte. “Nossa prioridade número é garantir que o assinante tenha muita coisa para assistir e ler”, ele pondera, enquanto dá início a uma demonstração prática de como é “ler” uma graphic novel pela televisão.

    O formato horizontal da tela não ajudou muito, já que a “revista” permanece com a orientação vertical tradicional -- algo que não atrapalha em um tablet, por exemplo. É possível apreciar a página por inteiro ou dar “zoom” e ampliar um quadrinho por vez. Na condição de quem passou a vida lendo e colecionando HQs de papel, achei a experiência estranha, mecânica, sem vida. Algo parecia não se encaixar.

    Disfarcei a decepção quando notei alguns dos cenários mais lindos desenhados por Frank Miller em O Cavaleiro das Trevas parecerem opacos e sem graça na telona widescreen de 50 polegadas. Percebendo minha (falta de) reação, Kamphausen tentou me empolgar: “Ler quadrinhos sempre foi uma experiência solitária, seja em revista ou em um tablet. Veja essa cena: não tem nada acontecendo, é só um grande panorama, e é lindo de se ver. E é a primeira vez que você poderá ver a arte em um tamanho tão grande -- e junto aos seus amigos!”

    Terminada a demonstração, perguntei se a DC planeja incluir animações ou efeitos sonoros às páginas digitais. Parece óbvio que é o tipo de recurso que as novas gerações de leitores vão exigir. “Queremos dar opções ao consumidor”, explicou Kamphausen. “Esses recursos que você sugeriu já foram discutidos entre nós. Não estarão prontos para o lançamento, mas queremos explorá-los para entender o que os fãs desejam. Mas também queremos manter a experiência o mais pura possível.”

    OK, entendi as boas intenções e todo valor agregado ao serviço. São 80 anos de histórias em quadrinhos clássicas, disponíveis para meu deleite e leitura imediata, tudo a um simples apertar de botão de distância. É tudo o que o Pablo de 9 anos poderia sonhar. E mesmo com todo esse poder infinito em mãos, eu só conseguia pensar em uma coisa…

    ...Que saudades das bancas de revistas!

    Pablo Miyazawa é colunista do AdoroCinema e consome cultura pop desde que nasceu, há 40 anos, de Star Wars a Atari, de Turma da Mônica a Twin Peaks. Como jornalista, editou produtos de entretenimento como Rolling Stone, IGN, Herói, EGM e Nintendo World.

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