Depois de apresentar duas produções sul-americanas de baixo orçamento, O Barco e Cabras de Merda, o 28º Cine Ceará - Festival Ibero-Americano de Cinema mudou o tom da mostra competitiva com a exibição de uma grande coprodução entre Espanha, França e Dinamarca: Petra, de Jaime Rosales, drama exibido na Quinzena dos Realizadores em Cannes.
O filme reúne um elenco prestigioso - Barbara Lennie, Alex Brendemühl, Marisa Paredes - para contar a história de uma jovem pintora que decide procurar o pai, que jamais conheceu, após a morte da mãe. No entanto, ao cruzar o caminho de um perverso artista plástico (Joan Botey), sua vida se transforma. O que poderia ser um belo drama de reencontros familiares se transforma num conto violento sobre os danos físicos e psicológicos que somos capazes de causar nas pessoas mais próximas.
Leia a nossa crítica.
A noite de segunda-feira apresentou quatro novos curtas-metragens da mostra competitiva. Apesar de ainda estarmos no início da seleção, o nível pouco estimulante de alguns curtas despertou um alerta vermelho quanto ao recorte da curadoria. Será que o Cine Ceará está guardando o melhor para a segunda metade do evento?
O mineiro Maria Cachoeira, de Pedro Carcereri, busca estabelecer a relação fusional entre Maria e a natureza ao redor. Quando as relações humanas começam a se tornar mais raras, ela encontra reconforto na cachoeira vizinha.
A opção por um cinema de sensações ao invés de uma narrativa linear é bastante louvável. No entanto, o filme encontra dificuldades com a direção de atores, ou mesmo em explorar as suas referências - o que fazem as gêmeas de O Iluminado ali na floresta, em versão brasileira e interiorana?
O goiano O Evangelho Segundo Tauba e Primal, de Márcia Deretti e Márcio Júnior, foi a segunda animação apresentada em competição oficial, após Plantae. Os diretores usam os traços marcados e simples, próximos dos rabiscos amadores, para acentuar a sensação de violência da grande cidade onde vivem os personagens.
Neste contexto, os protagonistas imaginam uma sociedade paralela, cuja prática também leva a disputas e confrontos. O resultado é uma bela construção estética das relações de ódio contemporâneas, embora a conclusão não amarre a contento esta narrativa tão caótica quanto os seus personagens.
Esta animação não foi a única com uma conclusão pouco satisfatória. O paulista Eu Sou o Super-Homem, primeiro trabalho de Rodrigo Batista como diretor, se inicia como uma promissora fábula sobre o racismo, através de um garotinho negro sendo confrontado pelos colegas sobre a sua fantasia de super-herói.
Com boas atuações e um clima verossímil dentro da festa de classe média-alta, o curta surpreende ao apostar num desfecho brutal e aberto. Entre as várias leituras possíveis deste final encontram-se algumas críticas ao racismo, e outras talvez mais conformistas. Diante de um tema tão grave quanto o preconceito racial, o fato de não se posicionar com clareza é um tanto questionável.
Ao final da sessão, uma espectadora negra se levantou e saiu do Cineteatro São Luiz, furiosa, gritando "O júri é todo branco!", o que reforça a importante cobrança de representatividade não apenas de gênero, mas também étnica nas comissões julgadoras.
O documentário carioca Nomes que Importam, de Ângela Donini e Muriel Alves, se concentra nos nomes sociais de travestis e transgêneros, que lutam para serem reconhecidas por suas identidades de gênero, ao invés dos nomes de registro.
O projeto confere protagonismo a figuras importantes da cultura e da política trans, embora não evite a impressão de um formato pouco desenvolvido, próximo à reportagem televisiva, com seus simples planos fechados nos rostos das atrizes posicionadas no meio do quadro, falando umas após as outras. Este é o típico caso em que a importância do tema se sobrepõe à forma encontrada para retratá-lo.
No dia 7 de agosto, serão exibidos dois longas-metragens: o brasileiro Eduardo Galeano Vagamundo e o colombiano Amália, a Secretária.