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    CineOP 2018: Segundo dia da mostra mineira reexamina o cinema brasileiro que a história esqueceu

    Palestras, debates e rodas de conversas, todas marcadas pelo tropicalismo, trouxeram à baila o tema da historiografia da sétima arte nacional.

    Beto Staino

    A História, apesar de seus aspectos científicos, também é uma espécie de "arte" subjetiva. Como toda e qualquer mídia narrativa, seja ela ficcional ou baseada em fatos, a História é também uma estória, uma trama construída - pelos vencedores, de acordo com o filósofo Friedrich Nietzsche - que elimina, seleciona, ressignifica e, principalmente, condena ou salva do esquecimento determinados acontecimentos de modo a seguir seu curso. E no caso do cinema, a banda não toca de outra forma.

    No segundo dia do CineOP 2018 - mostra de cinema mineira que tem como nortes a preservação da sétima arte e a perpetuação de sua história -, palestras, debates e mesas-redondas, lideradas por alguns dos maiores especialistas em cinema no país, se debruçaram sobre a proposta da revisão historiográfica de nosso audiovisual. Durante o pré-lançamento do livro "Nova História do Cinema Brasileiro" (ed. Sesc), organizado pelos pesquisadores Sheila Schvarzman e Fernão Pessoa Ramos, entrou em pauta questão das obras esquecidas ou preteridas, produções que ficaram de fora do cânone oficial da história fílmica brasileira.

    Beto Staino

    De acordo com a organizadora da obra, a compilação de textos tem por objetivo principal gerar um novo ponto de partida para o estudo do cinema no Brasil, ocupando o vácuo deixado pela natural defasagem sofrida por “História do Cinema Brasileiro” (ed. ArtEditora), escrita por Ramos em 1986; assim, agora, o apanhado histórico parte de antes dos primórdios da sétima arte, expande seus horizontes para além das análises cíclicas e, principalmente, se aprofunda nos profissionais e artistas pertencentes a minorias étnicas e/ou de gênero, indivíduos subrepresentados nas histórias em geral - como aponta o crítico e documentarista Mark Cousins em entrevista ao site português À Pala de Walsh, a narrativa convencional do audiovisual é “racista e sexista”, deslize que “Nova História do Cinema Brasileiro” busca corrigir.

    O cinema documental - liderado no Brasil por Eduardo Coutinho e João Moreira Salles, entre outros grandes cineastas -, tradicionalmente colocado em segundo plano por causa da hegemonia da corrente ficcional da sétima arte, também ganha espaço de destaque na narrativa de Schvarzman e Ramos; a vertente experimental e os novos autores da cinematografia nacional, incluindo a plural produção da escola de Pernambuco como Kleber Mendonça Filho e Cláudio Assis, também são pinçados para compor o fluxo histórico do livro. Por fim, igualmente importante é o período atual da renovada popularização do cinema no Brasil através das chamadas “globochanchadas”, examinado sob o prisma da ascensão da classe C como grupos com poder econômico durante as administrações petistas de Lula e Dilma (2002-2016).

    A sexta-feira ouropretana também foi dia de dar prosseguimento à rememoração do Tropicalismo, que é o tema central da edição 2018 da mostra. Apesar de obviamente não ter caído no esquecimento, o plural e multimidiático movimento artístico encabeçado por nomes diversos como Caetano Veloso, Hélio Oiticica e Glauber Rocha foi sacralizado dentro da trajetória artística brasileira - motivo que. por sua vez, é mais do que suficiente para que o CineOP tenha decidido "profanar" o Tropicalismo, relendo os impactos causados pelo questionador e ambivalente movimento artístico à luz de nossas atuais tensões e polarizações políticas.

    Frente a frente, o que ambas as discussões propõem, a despeito de suas aparentes diferenças, é a mesma coisa: a ampliação e aprofundamento de nossa História, principalmente cinematográfica, mas também nacional, como forma de olhar para o amanhã. Tanto a ressignificação da Tropicália quanto a releitura de uma história que parecia estar cristalizada provam que a lembrança - e o resgate do que foi proposital ou ocasionalmente esquecido - não é uma criatura exclusiva do passado; a memória, ao lado de suas transformações, é um elemento vivo que aponta para o futuro. Em um dia de “rês”, é preciso relembrar e limpar o esquecimento para seguir em frente: seja para não repetir os erros pregressos, seja para reconhecer, para além de perpetuar, a importância de todos aqueles que vieram antes de nós.

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