Composta por dez títulos inéditos no Brasil, a mostra competitiva de longas do 7º Olhar de Cinema tem dois filmes nacionais: o documentário Fabiana, estreia da diretora Brunna Laboissière; e a ficção Sol Alegria, de Tavinho Teixeira. Revolucionários cada um à sua maneira, eles harmonizam na apresentação de realidades que parecem absurdas, mas podem não ser.
Pesquisa divulgada ano passado constatou que o Brasil é o país com maior número de assassinatos por transfobia no mundo e Laboissière decidiu bancar uma narrativa em que uma caminhoneira trans e lésbica não é em momento algum atacada por ser quem é. Outras questões estão em foco, gerando de fato o retrato de uma pessoa simples navegando serenamente num profundo rio de complexidades. Leia a crítica de Fabiana.
Desembarcando no Brasil após lançamento mundial no Festival de Roterdã, Sol Alegria é uma loucura que faz muito(s) sentido(s). A estética é do cinema dos anos 1970, o ano é 2018 e a situação calamitosa prenuncia um futuro não muito distante, considerando o encaminhamento atual das coisas. Pastores políticos governam e saqueiam o país, mulheres são traficadas, o gozo vem da quase morte e uma família rebelde entra em ação.
O clã faz parte da falange Sol Alegria, que conta também com freiras fortemente armadas que cultivam maconha, beijam mulheres e fazem fila para usar uma máquina de penetração anal autorizada pela Igreja. Os personagens são atacados por breves epidemias de riso forçado e o humor que contagia o espectador é o do surreal que no entanto nada tem de nonsense. Como um irmão de Tatuagem que avança infinitamente mais no radicalismo em virtude do agravamento do estado do país, Sol Alegria regurgita críticas, referências, pautas e não há de passar batido na festinha dos registros que buscam lidar artisticamente com o caos contemporâneo, impulsionado pela devassidão e musicalidade.