O longa Marinheiro das Montanhas, de Karim Aïnouz, teve hoje, dia 9 de julho, a sua primeira exibição mundial, no Festival de Cannes 2021, como filme convidado da mostra Sessão Especial. O diretor abriu a sessão com um discurso em que chamava a atenção para o grave estado em que o Brasil se encontra por conta das ações do governo federal:
“Não posso deixar de lembrar que, enquanto estou aqui celebrando com vocês, milhares de brasileiros estão morrendo por absoluto descaso deste governo fascista na condução da pandemia. (...) Além das mais de 500 mil mortes com a covid, muitas outras vidas foram perdidas por responsabilidade direta desta necropolítica. Como acontece em governos autoritários, os artistas, a ciência e as universidades públicas foram os primeiros a ser atingidos. A produção cultural em todo o país está quase totalmente paralisada, em um ato calculado de destruição imposto pelo governo federal. Hoje, o cinema brasileiro e toda a sua imensa cadeia produtiva enfrentam o desafio de sobreviver neste cenário”, disse o diretor após uma emocionada reação da plateia, que aplaudiu o filme por 15 minutos.
"Uma emoção gigante ter tido essa recepção e esses encontros que tivemos aqui hoje. O que eu poderia esperar mais de um filme do que isso? A recepção foi de um calor maior do que o calor de Fortaleza", ressaltou o diretor.
A trajetória de Karim é marcada pelo Festival de Cannes, responsável por sua estreia com Madame Satã em 2002 e pelas aplaudidas sessões de O Abismo Prateado e A Vida Invisível, vencedor de Melhor Filme na mostra Un Certain Regard em 2019. É simbólico que o novo projeto – assumidamente autobiográfico – tenha seu lançamento no festival.
Festival de Cannes 2021: Diretor Karim Aïnouz fará filme com atriz premiada e roteiristas de Killing EveMarinheiro das Montanhas é um diário de viagem filmado na primeira ida de Karim à Argélia, país em que seu pai nasceu. Entre registros da viagem, filmagens caseiras, fotografias de família, arquivos históricos e trechos de super-8, o longa opera uma costura fina entre a história de amor dos pais do diretor, a Guerra de Independência Argelina, memórias de infância e os contrastes entre Cabília (região montanhosa no norte da Argelia) e Fortaleza, cidade natal de Karim e de sua mãe, Iracema.
O longa é todo narrado por Karim, que lê uma carta para a sua mãe, já falecida, transformada aqui em uma companheira imaginária de viagem. Enquanto relata e comenta episódios da jornada, ele reativa memórias familiares e revela os muitos sentimentos contraditórios que marcam o seu percurso.
“Com Marinheiro das Montanhas, eu quis correr o risco de que a maturidade e a experiência me permitem. Antes de tudo, um risco artístico ao me distanciar do que sei, abrindo o projeto ao inesperado. O risco também de me ver enfrentando minhas origens”, analisa Karim.
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