O diretor italiano Bernardo Bertolucci (Os Sonhadores) não parece estar disposto a deixar de ser um dos cineastas mais polêmicos da atualidade. Permanentemente envolto na controvérsia que gira em torno da cena de estupro de Último Tango em Paris, o realizador europeu declarou - durante uma exibição remasterizada do filme supracitado, no Festival de Cinema de Bari, na Itália - que Ridley Scott deveria se sentir envergonhado por ter removido Kevin Spacey de Todo o Dinheiro do Mundo (via The Hollywood Reporter).
À época, em meio à consolidação do movimento das vítimas de predadores sexuais na indústria cinematográfica contra a cultura de abusos, o #MeToo, Spacey foi acusado de ter assediado pelo menos oito membros da equipe de House of Cards e também de ter abusado do ator Anthony Rapp quando este ainda era um adolescente. Por causa da alarmante situação, Scott tomou uma rápida decisão sem precedentes: para proteger a integridade de Todo o Dinheiro do Mundo, o diretor britânico apagou o ator do filme - que já estava finalizado e pronto para ser lançado - e escalou Christopher Plummer em seu lugar para dar vida ao magnata J. Paul Getty. A iniciativa, concretizada em apenas nove dias, de Scott foi aplaudida e celebrada em Hollywood; Plummer ainda chegou a ser indicado ao Oscar pelo papel.
Na visão de Bertolucci, no entanto, Scott simplesmente teria cedido às pressões externas. O italiano revelou que enviou uma mensagem para o conterrâneo Pietro Scalia, montador e colaborador de longa data de Scott, acusando o colega britânico e afirmando que ele deveria se envergonhar por sua decisão. E apesar de ter reconhecido a importância do #MeToo e do atual estado das coisas em Hollywood - um momento em que a indústria tenta criar um ambiente de trabalho livre dos recorrentes e assustadores assédios sexuais que assombraram profissionais durante décadas -, Bertolucci declarou em seguida que sentiu a vontade imediata de trabalhar com Spacey - o ator foi demitido da Netflix, perdeu inúmeros contratos e é investigado pela polícia atualmente por causa das denúncias de abuso.
Como exibiu Último Tango em Paris, Bertolucci também não deixou de endereçar algumas palavras sobre o polêmico drama erótico. "No set, ela [Maria Schneider] estava feliz. Não acreditem nas redes sociais quando dizem que foi estupro: a cena da manteiga foi pura simulação [...] Marlon Brando foi muito paternal com ela, a protegeu. Havia uma boa relação entre eles", afirmou o realizador, contrariando novamente a versão da falecida atriz francesa. De acordo com Schneider, ela chegou ao set de filmagens sem conhecimento prévio sobre a controversa cena; a mesma declarou, anos depois, que se sentiu violada tanto por Brando quanto por Bertolucci e que teria se manifestado contra a realização da sequência se conhecesse seus direitos como atriz.