Estreou nesta semana Exorcismos e Demônios, filme de terror em que uma garota é possuída por uma força do mal.
A produção despertou críticas negativas, mas não foi a única: ela se junta a Livrai-nos do Mal, Ouija - Origem do Mal, A Possessão do Mal, Filha do Mal, Dominação, O Último Exorcismo - Parte II, Alma Perdida, Exorcistas do Vaticano, O Ritual... Todas foram acusadas de repetir lugares comuns e, ao trazerem exatamente as reviravoltas esperadas, não assustarem mais ninguém.
Obviamente, existem muitos filmes bons com estes elementos - desde o clássico O Exorcista até a saga Invocação do Mal, mas isso não significa que o sucesso de um história de exorcismo depende destes elementos. Existe espaço para a criatividade, não?
Quais são esses clichês que o subgênero do "terror de possessão" poderia reinventar? Abaixo, listamos alguns deles, mas fique à vontade para incluir outros nos comentários!
1. O demônio prefere garotas boazinhas
Existe um motivo pelo qual os "filmes de possessão" são considerados bastante misóginos: as vítimas são quase sempre mulheres, de preferência gentis e virginais - muitas delas vestindo roupas claras. Crianças pequenas também servem como símbolo de fragilidade e inocência, mas o alvo principal são as garotas.
Não custa tentar: Que tal homens adultos? Um grupo de velhinhos? Os jogadores de futebol americano da escola? Os chefes da empresa?
2. O demônio é uma figura masculina e sexual
Ainda na questão misoginia, a força demoníaca é sempre masculina: as garotas possuídas passam a falar com uma voz grossa, e de repente se tornam sexualizadas. Ou seja, a menina malvada é aquela dotada de desejo sexual, porque passa a "agir como homem" - em Exorcistas do Vaticano, a vítima possuída imediatamente agarra a virilha de um enfermeiro. Mais problemático que isso, impossível.
Não custa tentar: Já pensaram num demônio feminino, como Lilith? Numa vítima não sexualizada?
3. Forças malignas detestam palavras em latim
É claro que o gênero é intimamente ligado à religião, mas são sempre as mesmas convenções: chega um padre, ele constata que "nunca viu um espírito tão forte quanto este antes", fala algumas palavras em latim, a pobre vítima se contorce e o espírito vai embora.
Não custa tentar: Que tal explorar outras religiões, outras maneiras de fazer o espírito sair? Outros símbolos além da Bíblia?
4. "Inspirado em fatos reais"
Muitos filmes de terror estampam em seus cartazes: "Baseados em fatos reais". Primeiro, "fatos reais" é um pleonasmo. Segundo, se você tem uma vizinha chamada Maria e depois você inventa uma história insana na qual ela enfrenta monstros ou viaja para um universo paralelo, isso não é "baseado em fatos", ele apenas parte de uma inspiração mínima na realidade. O "fato", em si, nunca aconteceu. Este argumento de marketing não convence mais ninguém.
Não custa tentar: Vale mandar um e-mail ao distribuidor quando encontrar mais uma invenção do tipo. Fake news!
5. Pessoas rastejantes
Quando o demônio entra na pobre garota, ela logo começa a se contorcer, às vezes fica de quatro, gira a cabeça, inverte as articulações. Por que sempre as mesmas torções? O mesmo cabelo longo cobrindo a cara? No melhor dos casos, ela levita (outro clichê). Com certeza, existem formas diferentes de manipular o corpo das vítimas.
Não custa tentar: A sedução do demônio e a influência sobre a vítima não precisam passar pela ideia do "espírito parasita" - uma pessoa pode ser manipulada e influenciada sem ter a força literalmente controlando seu corpo.
6. Padres em crise existencial
Não basta a pobre família da garota possuída recorrer a padres e especialistas em exorcismos: eles precisam falar especificamente com algum sujeito em crise, que ou largou a batina, ou está prestes a fazê-lo. Mas não se preocupe: depois de ver o demônio mais forte de sua vida, ele vai redescobrir a crença no demônio - e, por consequência, em Deus.
Não custa tentar: Que tal o exorcismo não funcionar com nenhum grande exorcista, mas com uma pessoa inexperiente aplicando um método alternativo?
7. A ciência está errada
Ainda na esteira do clichê anterior, os filmes sobre exorcismo geralmente opõem a ciência à fé, apenas para chegar à conclusão de que Deus (e o demônio) existem, e todo raciocínio contrário está errado. Personagens ateus costumam transbordar arrogância, até serem obrigados a reconsiderar seus pontos de vista diante da potente força do mal.
Não custa tentar: Padres podem usar recursos científicos ao invés das palavras. Que tal fórmulas químicas, procedimentos cirúrgicos, invenções científicas e mecânicas?
8. Lentes de contato brancas e olhos revirando
Por favor, vamos parar com os cabelos ensebados, as veias saltando, os rostos brancos demais, os olhos revirando com lentes de contato brancas, a fumacinha saindo da cabeça junto do demônio, o sangue escorrendo pela boca. Essa caracterização é sempre meio tosca, e não surpreende mais ninguém.
Não custa tentar: Basicamente qualquer outra caracterização de mudança corporal.
9. Exorcismo no clímax
A garota é possuída, o especialista aparece, luta contra o demônio, e no clímax, a grande cena de exorcismo sela a vitória do bem contra o mal. O desfecho mostra todos seguindo com suas vidas (mas então vem a cena final, indicando a possível volta do demônio para a sequência). Alguém ainda se surpreende com esta estrutura?
Não custa tentar: O exorcismo poderia ocorrer no início, com as consequências do ato vindo depois, ou a tentativa de afastar o demônio daria errado e afetaria várias pessoas. A narrativa inteira poderia ser um prequel do exorcismo que já aconteceu.
10. Medo do escuro
Demônios preferem agir à noite, dentro de casas, de preferência em cômodos simples, com chão e teto de madeira, se possível no campo, ou na casa da vítima. A associação entre o mal e a noite é um clichê não só do terror, mas do cinema de gênero de modo geral. Junte esta questão ao jump scare - o susto de alguma figura maligna que aparece do nada, com efeitos sonoros altos, saltando em direção à tela - e o clichê está completo.
Não custa tentar: Possessões de dia, dentro de uma grande empresa, no meio de um evento público.