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    Os Farofeiros: Roteirista conta que a ideia do filme surgiu em Até Que a Sorte nos Separe 2 (Entrevista exclusiva)

    Roberto Santucci declara que há espaço para obras como O Filme da Minha Vida e longas cômicos pastelões com que o espectador popular possa se identificar — e rir muito — nos cinemas.

    Roberto Santucci, diretor, e Paulo Cursino, roteirista, têm uma parceria muito prolífica, que rendeu os recentes O Candidato Honesto e Um Suburbano Sortudo, os dois filmes da franquia De Pernas pro Ar, a trilogia Até que a Sorte Nos Separe e outros sucessos da comédia nacional.

    Em entrevista exclusiva ao AdoroCinema, a dupla comenta sua nova colaboração: Os Farofeiros, grande lançamento da próxima semana com um time estrelado pelos hilários Maurício Manfrini (o Paulinho Gogó) e Cacau Protásio, os experientes Antônio Fragoso e Danielle Winits, a estreante Aline Riscado, dentre outros.

    Eles revelam a origem de Os Farofeiros, em uma sequência preferida do público de Até Que a Sorte Nos Separe 2, e comentam a importância de se partir de um argumento popular para que o cinema nacional seja capaz de rivalizar com os canais de streaming (cada vez mais consumidos e baratos), como de ser financeiramente rentável e habilitado a, inclusive, produzir obras mais ambiciosas.

    "Nós somos os guardiões da indústria do cinema brasileiro. Temos que garantir a comédia brasileira funcionando  para todo o resto do cinema brasileiro continuar funcionando", declara um ambicioso Roberto Santucci, que — respeitosamente — dispara: "Para o cinema nacional continuar a existir, tem que haver filmes que não sejam só O Filme da Minha Vida. Nosso cinema deve viver de todos os filmes."

    Confira o bate-papo completo (e bem interessante) com o diretor Roberto Santucci e o roteirista Paulo Cursino sobre a comédia Os Farofeiros:

    Como surgiu a ideia de Os Farofeiros?

    Cursino: Quando a gente estava rodando Até que a Sorte Nos Separe 2, tinha uma pequena sequência em que o Leandro Hassum se perdia com a família em Las Vegas, no carro, com a criançada atrás e o menino querendo fazer xixi. Tinha uma piada com o GPS, e eles acabavam parando em um hotel furreca com uma marca de corpo no chão, um guaxinim na geladeira… Enfim, era uma cena típica de Férias Frustradas que funcionava muito bem para o nosso público. Era a cena com que o público mais se identificava e mais mencionava na pesquisa. Eu fiquei com aquilo na cabeça e pensei: "Por que a gente não faz um filme só disso? Nada de trailer, acampamento... Vamos fazer farofada mesmo! Com engarrafamento na estrada de Búzios." Uma coisa bem bagaceira e bem brasileira mesmo.

    Desde que a gente teve a ideia e levou para o Bruno Wainer, os distribuidores, eles compraram o projeto. E o engraçado é que depois que começamos a fazer, pensamos por que ninguém tinha feito isso antes. E eu acho que a gente conseguiu captar bem uma situação que todos os brasileiros já passaram ou vão passar. Farofada é um clássico nacional. Nosso trabalho foi basicamente pegar algo que a gente já sabia que funcionava, buscando a identificação do público. Por que os filmes do Paulo GustavoMinha Mãe é uma Peça, fazem tanto sucesso? Porque as pessoas se identificam com aquela mãe, com aquelas frases… É um homem vestido de mulher, mas todo mundo se identifica com a mãe. A gente pensou: "Por que não buscar essa identificação com outra coisa?" A ideia nasceu daí.

    Santucci: É muito importante para a gente manter a presença do cinema nacional dentro do mercado de cinema. Existe cada vez mais entretenimento no celular, uma avalanche de séries na Internet e na TV a cabo, o que está tornando o território do cinema muito competitivo. O próprio cinema americano, você pode ver, está vivendo de filme de super-herói. Como sobreviver a isso? É preciso trabalhar com temas que já gerem um interesse, para que as pessoas tenham a disposição de sair de casa e ir ao cinema ver esses filmes. Isso é um desafio. Antigamente, fazer cinema era muito mais fácil. Era só o que tinha. Hoje a gente vive uma competição muito acirrada. É difícil pensar "Ah, eu vou fazer o filme da minha vida".

    Cursino: Que nem o Selton Mello? (Risos)

    Santucci: Não, eu vou refazer a minha colocação… (Risos) Você pode fazer qualquer coisa, qualquer coisa mesmo, mas a verdade é a seguinte: para o cinema nacional continuar a existir, tem que haver filmes que não sejam só O Filme da Minha Vida. Nosso cinema deve viver de todos os filmes. Da poesia, do cinema experimental… Tem que haver essa pluralidade. Agora, para se manter vivo, é o cinema de grande público que paga a conta. Prova disso é o cinema americano, que sobrevivendo dos blockbusters. 

    Cursino: Verdade. Os donos das salas têm que acreditar no cinema nacional tanto quanto a gente acredita e tanto quanto o público pode acreditar. Se não ele não exibe. Muitos falam: "Eu não boto filme nacional na minha sala". Existe uma cota que ele tem que respeitar, tudo bem, mas cota não vai resolver. A gente quer ir além da cota.

    Santucci: Nesse sentido, nós somos os guardiões da indústria do cinema brasileiro. Temos que garantir a comédia nacional funcionando para todo o resto do cinema brasileiro continuar funcionando. Até porque, eu também quero fazer cinema pequeno, eu também quero poder fazer outros filmes...

    Cursino: Exato, eu também quero fazer o filme da minha vida.

    Há uns meses, no lançamento de Divórcio, você disse que com tempo e estrutura é possível fazer cinema com uma qualidade de produção e elaboração com padrão de Hollywood, até melhor. Em Os Farofeiros a abordagem parece diferente, mais simples. Ou não?

    Cursino: Mais ou menos. O que houve em Divórcio foi um tempo maior de preparação, porque foi um filme pensado de forma diferente. Uma ideia de produção diferente da que a gente está realizando junto com o André Carreira.

    Você fala do L.G. Tubaldini Jr., né?

    Cursino: Ele mesmo, que está vindo com Motorrad. O Tubaldini tem uma proposta mais radical. E a gente teve mais tempo com o elenco, foi até complicado conciliar a agenda da Camila Morgado com a do Murilo Benício. Divórcio tinha um orçamento maior também… Enfim, é uma outra proposta, e também necessária. É um filme médio, que levou 500 mil pessoas, e agora que está indo super bem no On Demand, no Now, as pessoas lamentam não ter visto no cinema. Com Os Farofeiros não será assim. Este tem uma pegada mais pop e a nossa chegada é um pouco mais agressiva, um conceito de maior apelo. Como o Santucci falou, pensamos em algo para tirar o público de casa.

    Santucci: A proposta é sermos competitivos no jogo do cinema, que é muito pesado. Tem o vídeo no YouTube, tem a televisão, que você assiste enquanto está cozinhando, tem a Netflix, onde tem tudo e é baratinha — você paga 30 reais por mês e se não quiser ver mais, você para o filme. No cinema, não: o cara sai de casa, paga estacionamento, paga um ingresso caro… A exigência é muito maior. 

    Cursino: Sem um grande chamariz, um conceito forte, você não tira esse cara de casa.

    Você fala bastante de high-concept. E é curioso como em Os Farofeiros vocês tratam esse conceito como base para explorar personagens que o público já conhece: o Paulinho Gogó, o humor característico da Cacau Protásio, a personalidade da Danielle Winits em um nível mais caricatural, radicalizado, a imagem de sexy symbol da Aline Riscado... Como foi essa concepção? Imagino que tenha sido um trabalho bastante colaborativo. 

    Santucci: Muito colaborativo. Não é à toa que o Cursino tem o crédito de produtor nesse filme, ele tem uma participação muito forte. E esse negócio de high-concept foi algo que eu aprendi em De Pernas Pro Ar, com o Bruno Wainer: "Sabe esse conceito? Eu vou fazer disso aqui um filme!" Várias pessoas apontaram a Ingrid [Guimarães], mas a verdade verdadeira é que o Cursino conhecia a Ingrid e sabia como escrever para a Ingrid. Eu prestei atenção nessa fórmula e tentei continuar reproduzindo. E aí, obviamente, com a parceria, com entrosamento, o Cursino virou produtor, porque é um cara que está ali apontando que atores são interessantes; que é fundamental na montagem, porque, como quem escreveu o roteiro, pode chegar e jogar uma cena inteira fora. E a gente faz teste de público antes do corte final. O público não sorri de mentira. Se ele sorri, ele sorri de verdade. E ali você pensa: "Essa piada aqui, que a gente achou que não tinha graça, tem uma graça enorme".

    Cursino: Isso é impressionante! Tem uma cena em que o menino diz "Olha a cobra!" e o pessoal pula. Para mim, aquela piada não dizia nada, mas no teste as pessoas amavam. Nessa hora a gente pensa, "Caramba, a gente está fazendo um filme para se comunicar com as pessoas, por que a gente vai tirar uma piada que está funcionando?"

    Santucci, a última pergunta é sobre aquela quebra de quarta parede já perto do fim. Você disse que tem uma preocupação de levar as pessoas para o cinema, mas também se posiciona: ao mesmo tempo ironiza um tipo de público que ainda torce o nariz para o cinema nacional e dá uma alfinetada no crítico de cinema, no olhar mais exigente, né? Manda mesmo um recado: "Cara, eu estou fazendo cinema para um público que gosta de se ver na tela."

    Santucci: Essa foi uma ideia do Cursino. E, assim, acho que nem é a primeira vez que a gente faz isso...

    Mas essa é mais radical, né?

    Santucci: É... Eu acho que essa colou mais, na verdade. Tinha uma em O Suburbano Sortudo, tinha outra em O Candidato Honesto... Mas, sinceramente, assim, essa foi uma cena que quando eu li no roteiro, eu perguntei: "Qual é a graça disso aqui?" E ele respondeu, "Não, não é para ter graça", e foi então que eu entendi o que a gente estava fazendo. Lembro que os atores também, num primeito momento olhavam para aquilo e ficam "Hein?!", "Como?!".

    Cursino: Assim, é uma piada em que ninguém brilha, está ali por si só. Não é nem uma piada, a situação está por si, a crítica está por si. Na verdade, ela substitui uma cena que caiu que a gente adorava, em um parquinho de diversões precário no litoral. Aí eu sugeri que a gente fizesse uma saída deles ao cinema, que é algo que acontece muito, e coloquei essa crítica, essa brincadeira, uma metalinguagem de quebrar a quarta parede ali. 

    Santucci: E ainda tem a brincadeira com o Minha Avó é uma Comédia. (Risos)

    Cursino: Sabe o que é mais engraçado? Para fazer a Dona Hermínia, o Paulo Gustavo se inspirou em uma personagem do Eduardo Martini, travestido, que é aquela avó. Então, naquela cena, o Eduardo Martini faz uma sátira do personagem do Paulo Gustavo que é uma sátira do personagem original do próprio Eduardo Martini. Tem toda uma brincadeira ali além da crítica.

     

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