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    A História dos Blockbusters - Parte 2: Em uma galáxia muito, muito distante...

    Sobre George Lucas e Steven Spielberg - ou como dois amigos tomaram o controle de Hollywood.

    Este é o segundo capítulo de A História dos Blockbusters, minissérie em seis partes do AdoroCinema. Confira a Parte 1: Sobre épicos, cineastas autorais e tubarões.

    A psicodelia, a disco music, o espírito sexo, drogas e rock 'n roll, os avanços tecnológicos e a promessa, ainda que um tanto quanto distante - e falsa -, de um amanhã melhor com o possível encerramento da Guerra Fria não perfurmaram a década de 1970. Apesar do visual extravagante e das coloridas tendências da moda, o período que sucedeu os combativos anos 1960 foi como a ressaca do dia seguinte ao "e viveram felizes para sempre" dos contos de fada. Mas, enquanto os jovens inconformados da década anterior - como os manifestantes de 1968 em cidades como Paris, Rio de Janeiro e Varsóvia - viram seus sonhos morrerem, políticos e magnatas retomaram o controle quase perdido com certa facilidade.

    Em Hollywood não foi diferente. A indústria cinematográfica estadunidense, após anos conturbados provocados pela megalomania de seus épicos, que trouxeram prejuízos colossais aos cofres das majors, reencontrou o caminho da glória em 1977 - no qual tem permanecido, salvo alguns contratempos, desde 1980. Os musicais, como Os Embalos de Sábado à Noite (US$ 237 milhões) e Grease - Nos Tempos da Brilhantina (US$ 394 milhões) - ambos estrelados por um jovem John Travolta -, marcaram presença como de costume, ao passo que outros sucessos vieram de lugares inesperados. Dentre os "sleepers", filmes que levam um certo tempo em cartaz para arrecadar muito dinheiro, destaque para Rocky, um Lutador, que lutou pacientemente como seu protagonista, o ator e roteirista Sylvester Stallone, para alcançar o topo: US$ 225 milhões, obtidos muito por "culpa" da publicidade boca a boca gerada em torno do drama esportivo.

    Mas se Rocky foi inesperado, ninguém estava sequer remotamente preparado para o que o mês de maio de 1977 reservara. À época, Hollywood fugia do quinto mês do ano: os executivos não acreditavam que seria um bom período para vender seus filmes, uma vez que maio precede as férias escolares de verão nos Estados Unidos. Mas o então desconhecido George Lucas pensava de forma diferente. Para seu terceiro longa-metragem, sucessor de THX 1138 e Loucuras de Verão, o cineasta e roteirista acreditava que o mês em questão era perfeito exatamente porque as crianças ainda estavam na escola e, uma vez lá, poderiam espalhar a notícia sobre o filme mais cool em cartaz: Guerra nas Estrelas.

    A NOVA FRONTEIRA

    Descartado em duas ocasiões distintas - pela falida United Artists e pela Universal -, o argumento de Star Wars, uma ópera espacial baseada em filosofias orientais, na obra de Joseph Campbell e nos filmes de Akira Kurosawa (Os Sete Samurais) e Sergio Leone (Três Homens em Conflito), foi aprovado pela Fox; inicialmente, a empresa também não acreditava muito no potencial do argumento de Lucas, criado em 1973. Entretanto, as primeiras apresentações de Guerra nas Estrelas, com seu potente desenho de som e seu universo inteiramente novo, arrancaram aplausos efusivos da plateia. Confiante na boa recepção, a Fox decidiu acatar o pedido de Lucas e adiantar o lançamento do longa para o fim do mês de maio, no feriado do Memorial Day.

    Em um espaço de menos de seis meses - e sendo apresentado apenas em 32 salas de cinema nas primeiras semanas de lançamento -, Guerra nas Estrelas superou diversos recordes de Tubarão; no fim de sua jornada de exibição, a obra de Lucas arrecadou mais de US$ 621 milhões e explodiu todas as marcas anteriormente registradas para se tornar o longa mais lucrativo da história. Objetivo, espetacular e recheado de referências da cultura pop, o filme que viria a ser conhecido como Uma Nova Esperança, ou Episódio IV, encantou as plateias com sua "simplicidade" - afinal, Guerra nas Estrelas traz uma história antiga com uma roupagem extraordinária, apelo universal que certamente contribuiu para seu massivo sucesso.

    Além de ter se tornado um fenômeno cultural, criando um esquema de incrível êxito financeiro e lançando uma franquia que dura até os dias de hoje, mais de 40 anos depois, Guerra nas Estrelas também foi crucial para o pleno desenvolvimento de uma indústria em si: a dos produtos licenciados. Apesar de ter dirigido dois longas anteriormente, Lucas sempre fora mais roteirista e produtor do que cineasta; portanto, ele decidiu por uma jogada de mestre na negociação dos lucros de Guerra nas Estrelas: a Fox ficaria com a maior porcentagem da bilheteria adquirida e Lucas poderia ter liberdade para explorar - e receber os ganhos de - todos os produtos derivados de Uma Nova Esperança. Assim, o longa não só revitalizou a companhia, como também fez surgir em Lucas uma figura influente dentro de Hollywood - que, até aquele momento, seguia dominada por Francis Ford Coppola e companhia.

    Guerra nas Estrelas também foi crucial para estimular o que é chamado na indústria de ciclo. Como afirma o crítico, cineasta e escritor Mark Cousins em seu monumental "História do Cinema" (ed. Martins Fontes), Hollywood sempre funcionou e sempre funcionará na base do "esquema + variação". Basta ver o efeito que Deadpool, também da hoje "falecida" Fox, produziu. Antes do longa do Mercenário Tagarela (Ryan Reynolds), não existiam filmes de super-heróis para maiores de 18 anos. O sucesso retumbante de público (US$ 783 milhões) e crítica criou o esquema - produções do gênero proibidas para menores. Na esteira de Deadpool, já vieram Logan (US$ 616 milhões) e o anúncio de outras obras "similares", como os vindouros VenomHellboy e Spawnvariações do esquema.

    Uma Nova Esperança, portanto, fomentou e possibilitou a realização de grandiosos épicos de ficção científica, extremamente ligados ao Episódio IV de Star Wars. Mesmo tendo sido assinado por Steven Spielberg, o diretor do massivo TubarãoContatos Imediatos do Terceiro Grau (1978) poderia não ter encontrado o êxito que conquistou - particularmente por causa dos inúmeros problemas de produção que atrasaram o lançamento do sci-fi - se não fosse por Guerra nas Estrelas. Apesar de não ter sido recebido da mesma forma que seu "predecessor", Contatos Imediatos do Terceiro Grau ainda conseguiu arrecadar US$ 287 milhões ao redor do mundo e cimentar o status de Spielberg como um autor/produtor - mais ou menos nos moldes do patamar que George Lucas atingira, um ano antes.

    A outra produção que, de certa maneira, também "nasceu" de Guerra nas Estrelas foi Superman - O Filme, também de 78. Produção mais cara da história até então, tendo custado US$ 55 milhões, a primeira produção de super-heróis que foi levada a sério pelo público e pelos críticos obteve um retorno de US$ 300 milhões nas bilheterias. Seus aclamados efeitos visuais, incluindo as clássicas sequências de voo do Homem de Aço (Christopher Reeve), sempre acompanhadas pela trilha sonora de John Williams, garantiram três continuações diretas, inúmeros prêmios e o reconhecimento da indústria. Não é à toa que Superman - O Filme é a pedra fundamental dos épicos de super-heróis que hoje dominam a sétima arte.

    Os efeitos especiais, aliás, foram um dos elementos que encorajaram a contrarrevolução dos executivos de Hollywood, que a partir de 1980, conseguiriam se livrar dos cineastas rebeldes que colocaram fogo na indústria dez anos antes.

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