Torpeza moral. Esse é o termo que Hollywood estipulou para uma nova cláusula contratual muito necessária em tempos de #MeToo, movimento pelo qual as mulheres vem denunciando casos de assédio em Hollywood após o escândalo Harvey Weinstein. "Ato ou comportamento que viole gravemente o sentimento ou o padrão aceito da comunidade", estipula a cláusula, tanto para preservar pessoas em posição de vulnerabilidade, como a própria indústria — exposta em âmbito ético e, principalmente (para o negócio), financeiro.
A Netflix perdeu US$ 39 milhões ao cancelar seu contrato com Kevin Spacey (House of Cards), acusado de assediar Anthony Rapp (Star Trek: Discovery) e outros jovens ao longo de décadas. Da mesma forma, a Imperative Entertainment teve de investir US$ 10 milhões para substituir o ator por Christopher Plummer no filme Todo o Dinheiro do Mundo. A plataforma online também teve prejuízo considerável com Louis C.K., que confessou ter se masturbado na frente de cinco mulheres. O acordo de dois especiais stand-up era de US$30 a 35 milhões, tendo parte desse montante sido repassada ao comediante, pela produção do primeiro programa, removido do catálogo logo após o escândalo.
Diante disso tudo, e da continuidade de casos de assédio envolvendo nomes grandes como Brett Ratner e Jeremy Piven, os estúdios estão tomando medidas mais severas para se preservar. Segundo o THR, a Fox tenta inserir um termo que lhe permita cancelar qualquer contrato "se o talento se envolver em conduta que resulte em publicidade ou notoriedade adversa ou risco de descrédito, desprezo, escândalo ou ridículo". Pequenos distribuidores também vêm tomando medidas semelhantes, inclusive em caso de atitudes passadas, e uma fonte da Paramount garante que seus funcionários e artistas têm se comprometer com um código de conduta.
Apesar da movimentação se dirigir em um mesmo sentido, há uma parte específica receosa com a possível radicalidade de tais cláusula de moralidade: os advogados. "Eu sou toda a favor do #MeToo", declara a advogada Linda Lichter, para então ponderar: "Mas eu acho que isso [as cláusulas de moralidade] abre um precedente ruim. Uma coisa é dizer que alguém é criminoso. Outra é dizer que uma pessoa foi acusada por alguém e você poder demiti-la sem pagá-la", explicou.
Porém, o movimento seguirá em frente. Distribuidores que preferem não se identificar dizem que grandes parceiros, principalmente canais por assinatura, fazem grande pressão para que as cláusulas de moralidade sejam aplicadas. Então, o desafio será solucionar outro ponto de controvérsia: os estúdios estão sendo acusados de hipocrisia por não impor os mesmos termos aos seus executivos — o que é mais que urgente.
Afinal, toda essa onda de denúncias de assédio sexual veio à tona por causa de um dos produtores mais poderosos e influentes de Hollywood, Harvey Weinstein. Sua conduta não somente impôs o leilão da The Weinstein Company, como ele processou sua própria empresa, gerando um constrangimento e abalo da marca da empresa com o único intuito de obter documentos para sua defesa. Ou seja: os estúdios precisam se proteger de seus próprios executivos, até mesmo fundadores.