No ano de 2017, Ridley Scott revisitou, em níveis diferentes, duas grandes propriedades de sua carreira. O realizador dirigiu o divisivo Alien: Covenant, que confundiu ainda mais a linha do tempo da saga iniciada no clássico Alien, o 8º Passageiro (1979). Além de remover Kevin Spacey de Todo o Dinheiro do Mundo e substituir o ator acusado de assédio sexual por Christopher Plummer em poucos dias, Scott também foi o produtor executivo de Blade Runner 2049.
Com direção de Denis Villeneuve, a sequência do clássico sci-fi noir e cyberpunk que definiu os anos 80 foi elogiada por críticos (o AdoroCinema deu ao longa-metragem o sétimo lugar no ranking de melhores filmes de 2017). Entretanto, as bilheterias do projeto ficaram aquém do que um filme deste porte poderia alcançar. Orçado em US$ 150 milhões (sem contar gastos com marketing), o longa arrecadou apenas US$ 258 milhões nas bilheterias mundiais. A meta da Warner Bros. era alcançar a marca de US$ 400 milhões.
Apesar de estarmos diante de um filme que provavelmente está destinado a se tornar um clássico cult para as gerações futuras — assim como aconteceu com o Blade Runner original —, nem todos se agradaram com a sequência. Para Ridley Scott, 2049, do alto de suas 2 horas e 40 minutos de duração, se estendeu mais do que deveria. "Eu preciso ter cuidado com o que eu falo. O filme era longo pra caralho", disse o diretor, sem medir palavras em entrevista para a revista Vulture. "Fuck me!", exclamou o cineasta, em uma expressão que não precisamos nem traduzir, "boa parte do roteiro é minha".
O diretor alegou que, apesar de não ter sido creditado, ele passou "um bom tempo" com os roteiristas Hampton Fancher e Michael Green. Ele disse que não pode provar que merece o crédito oficial como roteirista, pois para isso teria de "ter gravado as conversas" que teve com Fancher e Green. "Eu não posso fazer isso. Mas eu teria de ter feito para provar que eu sou parte do processo criativo", completou.
Para explicar quais seriam as contribuições que deu ao enredo de Blade Runner 2049, Scott recapitulou os principais pontos do filme original e da sequência. A citação a seguir contém spoilers.
"[Eldon] Tyrell [interpretado por Joe Turkel no primeiro filme] é um trilionário. Talvez entre 5 a 10% de seus negócios contem com inteligência artificial. Como Deus, ele criou seres perfeitos com diversas intenções e propósitos. Não há diferença entre eles e os humanos. Então ele diz, 'Quer saber? Eu vou criar uma inteligência artificial. Terei um macho e uma fêmea, eles não saberão que são IAs, vão se conhecer, se apaixonar, consumar o amor e terão um filho'. Este é o primeiro filme", disse Scott, que volta a afirmar que Deckard, personagem de Harrison Ford é um replicante, questão que é tema de debate entre os fãs da franquia desde o lançamento de O Caçador de Androides.
"O segundo filme é sobre o que acontece com o bebê. Você tem que ter o bebê, mas não pode ter a mãe, então a mãe tem de morrer inexplicavelmente quatro meses depois dela amamentar. Os ossos são encontrados em uma caixa perto de uma árvore — isso tudo é meu. E a namorada digital também", contou. A companheira virtual a qual Scott se refere é a personagem Joi, interpretada por Ana de Armas em Blade Runner 2049.
Em novembro deste ano, Villeneuve contou que precisou pedir, em tom de brincadeira, que Scott deixasse o estúdio enquanto ele filmava Blade Runner 2049. "Ele veio ao set uma vez e depois de alguns minutos parado atrás de mim e aquilo tudo ficou insustentável. Eu brinquei, 'Ei, Ridley, quem é seu diretor favorito?'. Ele me respondeu que adorava Ingmar Bergman e Kubrick. Em resposta, eu falei: 'Eu também amo Bergman. Mas me diz, como você se sentiria se estivesse trabalhando no set e Bergman estivesse logo atrás de você?'. De repente ele caiu na gargalhada e saiu do set. Naquela situação eu estava tentando dirigir Harrison Ford e só conseguia pensar 'não, isso não tá rolando'".