A comédia, por definição, trata de subverter convenções e expor o ridículo das coisas, muitas vezes servindo como pano de fundo para discursos mais sérios. Fazer rir não é uma ciência exata, mas não foram poucos os que tentaram pensar a natureza do ofício de humorista. "A vida é uma tragédia quando vista de perto, mas uma comédia quando vista de longe", teria sintetizado Charles Chaplin. Sendo assim, qual o limite entre explorar o desfortúnio de uma pessoa ou grupo em nome do entretenimento de terceiros?
Mel Brooks tem credenciais quando o assunto é o cinema cômico. Ator, diretor, roteirista e produtor de clássicos do gênero, tendo vencido o Oscar de melhor roteiro por Primavera Para Hitler, o veterano de 91 anos de idade afirmou que o politicamente correto representa "a morte da comédia".
Em entrevista recente para a BBC Radio 4, Brooks foi perguntado se algum dos seus filmes clássicos encontraria dificuldades para ser realizado atualmente, em que a noção de que não se deve endossar discursos que marginalizam minorias ou grupos discriminados ganha força dentro e fora das trincheiras do ativismo.
"Talvez fosse possível fazer O Jovem Frankenstein. Talvez alguns outros. Mas nunca Banzé no Oeste por conta da estupidez do politicamente correto", comentou. "É certo não ferir os sentimentos de diversos grupos. Entretanto, isso não é bom para a comédia. A comédia tem que andar numa linha tênue, correr riscos. A comédia é o pequeno elfo depravado sussurrando no ouvido do rei, sempre contando a verdade sobre o comportamento humano."
Com um humor provocativo, Banzé no Oeste satiriza o racismo e os retratos romantizados do Velho Oeste feitos por Hollywood. Na trama, o governador de uma pequena cidade americana (interpretado por Brooks) contrata o xerife Bart (Cleavon Little), que é negro, para colocar ordem na remota e perigosa Rock Ridge. Entretanto, a população branca do vilarejo não aceita uma autoridade negra e Bart recebe apoio apenas do pistoleiro decadente Jim (Gene Wilder).
Apesar de defender que a comédia tem que ter que "correr riscos", Brooks reconhece que ele mesmo tem seus limites em relação aos temas e situações que abordaria em um filme. "Eu, pessoalmente, nunca mostraria uma câmara de gás ou a morte de crianças e judeus nas mãos dos nazistas", disse. "Quanto a todo o resto, tudo bem."
De certa maneira, Brooks foi contraditório ao dizer que apenas questões que possam atingir a sensibilidade de judeus o incomodam, já que ele mesmo é judeu. Sem contar que é perfeitamente fazer comédia politicamente incorreta nos dias atuais e receber elogios por isso, vide o sucesso de Deadpool. Se há minorias que se incomodam com a forma que são representadas na mídia e em como discursos podem reforçar estereótipos, cabe a quem trabalha com arte saber receber críticas sem tentar sabotar tais discussões.