Damien Chazelle tinha 31 anos (ele completou 32 nessa última quinta-feira) quando entrou na sala do Hotel Ritz Carlton, em setembro, para conversar com os jornalistas, durante o Festival de Toronto (Toronto International Film Festival). Não aparentava mais do que vinte e poucos, embora a seriedade lhe conferisse um ar de “alma velha”.
A aparente contradição era estampada já na primeira declaração do realizador, a respeito de seu mais novo filme, o sucesso La La Land – Cantando Estações: “Para mim, era essencial me distanciar do passado nesse filme, embora tenha pegado muitas coisas emprestadas dos musicais antigos de que sou fã”. Michael Powell, Emeric Pressburger e Jacques Demy encabeçam a extensa lista.
O longa conta a história (a gente duvida que você ainda não saiba, mas...) do encontro de Sebastian (Ryan Gosling) e Mia (Emma Stone); ele, um pianista de jazz; ela, uma aspirante a atriz; ambos em busca do sucesso profissional em uma colorida Los Angeles atual. O filme levou sete dos sete Globos de Ouro a que estava indicado (incluindo melhor diretor e melhor roteirista para Chazelle) e promete ser um hit na próxima cerimônia do Oscar.
Whiplash foi escada.
Na ordem das paixões do filho de pai francês, o ovo veio primeiro do que a galinha, ou melhor, o amor pelo jazz antecede o apreço pelo musical. “Cresci nos arredores da cidade de Nova York [ele é de Providence, mora há nove anos em Los Angeles], toquei jazz durante a minha infância – e grande parte do meu interesse por jazz vem daí. Vejo filmes desde que consigo me lembrar, mas me apaixonei pelos musicais um pouco mais tarde, no fim da adolescência”.
Conhecido por Whiplash – Em Busca da Perfeição (olha o jazz aí...), a primeira produção sob a batuta de Chazelle foi Guy and Madeline on a Park Bench, de 2009, um... musical. Se dependesse (só) dele, no entanto, a ordem seria outra – ou, pior, o filme de 2014 premiado com três estatuetas do Oscar, talvez nem existisse.
“Eu escrevi Whiplash em um momento de frustração por não conseguir produzir La La Land. De certa forma, foi um movimento estratégico. Como eu não estava conseguindo fazer um musical em que as pessoas voavam em direção às estrelas, achei melhor fazer um filme em que eu pudesse provar que poderia dirigir esse musical. Whiplash nasceu assim: um filme pequeno, com algumas locações e sobre um mundo que conheço bem. Filmei Whiplash para convencer as pessoas de que eu poderia fazer La La Land”.
Emma Stone pode estar sentada do seu lado.
Guy and Madeline... foi filmado quando Damien ainda estava na faculdade (ok, não faz tanto tempo assim). “Era um rascunho do meu amor pelos musicais. Naquela época, meu colega de quarto, Justin Hurwitz fez as músicas para aquele filme. Nós trabalhamos juntos até hoje e o fizemos como uma forma de tentar descobrir se é possível casar a realidade com o musical”.
E é? Ele mesmo responde, em outro momento da entrevista: “Foi crucial [a escalação de protagonistas que não são profissionais do canto], porque uma das coisas que dificultam a aceitação dos musicais hoje em dia é o fato de que eles perderam a naturalidade”.
O "menino prodígio" acredita que, apesar do jeitão estilizado e pouco verossímil das produções da “velha Hollywood”, tratam-se de títulos mais “realistas” do que os musicais recentes. “Eu queria que o público sentisse que os personagens são pessoas reais cantando, que podiam estar sentadas ao lado delas no bar ou no ônibus. Não queria que fossem como Gene Kelly, Fred Astaire ou Ginger Rogers ou qualquer outra pessoa que apareça no filme pronta para cantar e dançar”.
Miles Teller e Emma Watson? Whaaat?
Não que Stone e Gosling tenham sido as primeiras opções do realizador. Era quase que “o contrário”. “Convidei o Miles [Teller] porque gostei muito de filmar com ele em Whiplash. À época, o casal protagonista seria formado por ele e por Emma Watson, mas por causa de questões de agenda, os dois acabaram deixando o projeto. Não foi fácil. Às vezes temos o dinheiro, mas não temos o elenco; e, às vezes, temos o elenco, mas não temos o dinheiro”.
A entrada do galã trouxe ainda mais mudanças para o roteiro. “O personagem que eu escrevi, antes de Ryan ser escalado, era mais novo. Tive que adaptá-lo e também adicionei a ideia que ele trouxe de dar um passado de tentativas e fracassos para esse papel. Preciso dar crédito a ele por fazer isso e por me incentivar a fazer isso”.
O ator treinou piano durante três meses e chegou “pronto” no set, com todas as músicas de cór. “Não há nenhum plano no filme que tenha sido feito por um dublê; todas as interpretações são de Ryan Gosling”, atesta o diretor. Sério?, um jornalista desconfia. Damien explica que há dublagem (voz) em algumas cenas (em outras, não), mas garante que “Ryan toca de verdade em todos os planos. Esse é um exemplo do quão dedicado ele é. Ryan é o crítico mais duro que ele possa encarar e isso facilitou muito o meu trabalho. Às vezes, eu tinha que tranquilizá-lo, acalmá-lo”.
Xô, American Idol.
Já Emma Stone foi resgatada diretamente do palco de “Cabaret”, musical que protagonizou na Broadway. A característica voz rouca da atriz foi o “canto da sereia” que seduziu Damien Chazelle. Mas não só. “O que mais gostei é o fato de que Emma canta de uma maneira completamente diferente do jeito que fala”. Ainda assim, ele não estava em busca de alguém cujo timbre você percebe que foi moldado em um estúdio de som a quilômetros dali, como “Ir da vida real para o ‘American Idol’ e de volta para a vida real”. “Quando as pessoas dizem que odeiam musicais, creio que é muito por causa disso”.
La La Land – Cantando Estações já está em cartaz nos cinemas brasileiros.
Tradução: Renato Furtado.