Talvez você ainda não conheça Fábio Marcoff, mas o ator argentino estará em breve em duas comédias brasileiras que se destacaram no 44º Festival de Gramado: O Roubo da Taça e El Mate. No primeiro, interpreta um fã de futebol que compra a taça Jules Rimet, recentemente roubada, e decide derretê-la. No segundo filme, faz um matador de aluguel cuja noite muda completamente quando um missionário evangélico chega em sua casa.
As duas histórias trazem situações absurdas e, nos dois casos, Marcoff brilha com os diálogos e as expressões. Nós conversamos com ele em Gramado sobre as duas experiências:
Como vieram os convites para trabalhar em O Roubo da Taça e El Mate?
Fábio Marcoff: Faz muitos anos que o Caíto Ortiz tinha me falado sobre O Roubo da Taça, porque o projeto demorou muito tempo para se concretizar. Sempre que nos encontrávamos, ele me dizia: "Fábio, tenho um papel para você em um filme!". Ele conhecia o meu trabalho e já tinha pensado em mim para esse projeto específico. Foi uma experiência muito boa, porque o Caíto é uma pessoa com muita energia durante a filmagem, ele é pura paixão. Ele tem um cuidado extremo com os atores, foi lindo.
El Mate é um projeto meu. Conheci o Bruno Kott e, além disso, trabalhamos durante três anos juntos fazendo um programa no Canal Brasil que se chamava "No Divã do Dr. Kurtzman", e o final do programa me surpreendeu um pouco. Sempre falávamos de fazer outra coisa, e Bruno pensou: "E agora? Vamos da continuidade ao Kurtzman? Vamos fazer um filme!" Já tínhamos nos falado tanto, e tínhamos tanta coisa em comum que nos dividimos para fazer um roteiro. Cada um escreveu, e depois quando nós juntamos... É meio surreal, mas escrevemos quase o mesmo filme.
O Bruno Kott frisou a ideia de uma produção horizontal. Como isso se traduz no resultado final de El Mate?
Fábio Marcoff: Acho que é um filme feito por uma necessidade, um filme feito com o coração. É uma obra de arte: você gosta, não gosta, mas é muito verdadeiro, é honesto. Se você analisar o filme tecnicamente, pode encontrar coisas que estão fora da regra, mas também foi uma estética que aconteceu, obviamente por nossas escolhas, mas também pelos meios que a gente tinha para fazer o filme. Eu não diria limitações, mas é uma estética que se formou graças a um determinado acesso à tecnologia.
O humor dos dois filmes é bem diferente. O Roubo da Taça é assumidamente exagerado, mas esse não é o caso do El Mate. Como foi isso para você?
Fábio Marcoff: Bom, não sei se você conhece a história real por trás do roubo da taça, mas é absurdamente surreal o que aconteceu. O gênero de O Roubo da Taça é a comédia dramática. Tudo isso parece uma comédia italiana. No caso de El Mate, a gente não se propôs a trabalhar um gênero, então ele transita, talvez, no humor, porque também poderíamos dizer que é uma comédia, mas o humor vem de uma situação real, é completamente diferente pelo contexto. Tem muito mais drama, porque é o fracasso da vida desse personagem, que é um típico argentino!
Muitos filmes brasileiros no festival de Gramado têm cooperação financeira de outros países latino-americanos, ou contam com elenco vindo de vários países. Você acha que isso é uma tendência para se conseguir fazer mais produções?
Fábio Marcoff: Acredito que sim, mas não no nosso caso, porque o dinheiro não chegou nunca! Mentira, tivemos uma coprodução do Canal Brasil, que permitiu trazer o filme aqui [ao festival de Gramado], mas acho sensacional, muito mais que pelo dinheiro.
Não poderia estar ausente toda a parte política que está acontecendo no país. Eu moro no Brasil há 14 anos, mas não acredito mais em política partidária. A única ferramenta para mudar as coisas, ou pelo a mais forte, é a arte. Falo em arte no seu sentido mais puro, como necessidade intrínseca do ser humano. Então além da coprodução, que pode trazer dinheiro de um lugar para outro, é também a maneira de unir o povo, quebrar fronteiras, liberar crenças.
O mais importante é essa relação com o próximo, da qual o Brasil - pelo menos no teatro que é a área de que eu venho -, ficou muito isolado, por uma questão de língua. Agora ele já está mais inserido. Nosso filme, El Mate, tem isso também: sem muita explicação, um fala em português e o outro fala em espanhol. Não existe problema de compreensão.
O humor costuma ser muito ligado a uma cultura local. Você acredita que El Mate e O Roubo da Taça podem funcionar da mesma maneira na Argentina?
Fábio Marcoff: Sim, por mais que o humor seja cultural, ele vai além da fronteira. Só é possível desfrutar do humor quando a gente tem humor, quando conseguimos rir de nós mesmo, aí nos libertamos muito mais. Mas o humor está em tudo, está no drama, no humor de cada situação. Acredito que o humor, por mais que tenha a ver com cultura, é uma língua universal.