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    "A cidade é um espaço de extermínio da criatividade", afirma Andrea Tonacci na Mostra de Tiradentes 2016

    O cineasta conversou com a imprensa após a homenagem recebida na 19ª edição do evento.

    Léo Fontes / Universo Produção

    Homenageado da 19ª Mostra de Cinema de Tiradentes, o cineasta Andrea Tonacci conversou com o público e com a imprensa sobre seus filmes e sobre sua visão de cinema. Aclamado por obras como Bang Bang e Serras da Desordem, ele emitiu reflexões sobre o cinema brasileiro atual, do ponto de vista de alguém voluntariamente à margem do circuito comercial.

    Confira alguns momentos da coletiva de imprensa:

    Situação do cinema comercial

    "É preciso pensar na relação inteira entre a produção e o público, mas também é preciso pensar no artista. Cada vez mais, temos uma produção muito grande de gente jovem. Só sinto a falta de um conhecimento maior de cinema, mas às vezes o desconhecimento é o ponto criativo, porque não há referências. Então a coisa surge, não importa que a pessoa acabe se repetindo, isso ela vai descobrir depois. É essa a energia do jovem. Muitas pessoas veem o cinema brasileiro de modo pejorativo, mas eu não: este cinema xingado de comercial é uma questão de postura. Ele corresponde a uma realidade nossa, é preciso ser visto. O problema é pensar no produto comercial como única forma cultural a distribuir às pessoas".

    Léo Fontes / Universo Produção

    O que mudou desde Serras da Desordem? 

    "O que realmente mudou, na verdade, diz respeito às diferenças sociais. O desnível econômico e de oportunidades é um crime contra a humanidade. Acredito que as pessoas com mais recursos são as mais responsáveis pelas loucuras que estão acontecendo, e que poderiam, pelas possibilidades que têm, interferir mais no mundo. [...] Nós, urbanos, somos as pessoas mais condicionadas do mundo. As cidades são espaços de extermínio da criatividade, de massificação do consumo. Fazemos as pessoas se identificarem com algo que não é a pessoa, e sim o que você veste, o que você usa, tanto no lado intelectual quanto na moda".

    Humildade 

    "Singela é a postura que eu assumo, não por falsa modéstia. É a realidade. Basta olhar as obras dos cineastas que existem no mundo e me colocar no meu lugar. Fico encabulado quando fazem analogias com alguém que admiro, como Rossellini... Não é confortável. O ego pode fazer comentários, mas não é desse jeito que funciona. É complexo o raciocínio que me leva a fazer um filme. Para chegar naquilo existiu um roteiro, um processo".

    Homenagem

    "A homenagem em Tiradentes nasce dos 10 anos do Serras da Desordem. Mas a minha obra é muito pequena. Ok, é obra mesmo assim, mesmo se fosse um filme só. Mas comparando com Júlio Bressane, Luiz Rosemberg Filho, o falecido Carlão Reichenbach, estes sim têm uma filmografia extensa, então dá para chamar de obra neste sentido. A minha vida é um pouco atrás dos filmes, não estou na frente deles. Eu vou na carona, vou na mala. Se o filme é convidado para algum lugar, acho ótimo, mas não fico fazendo planejamento de festivais. Tem pessoas que fazem listas de festivais antes mesmo de o filme ficar pronto!"

    Universo Produção

    Distribuição no cinema independente 

    "Acho que a gente deve distribuir os nossos próprios filmes. Se ficar esperando um distribuidor comercial, que visa o lucro, que depende de uma assessoria e uma campanha de imprensa, vai ser necessário muito dinheiro. Serras da Desordem, bem ou mal, está no Canal Curta, passou na TV Brasil, e isso significa alguma audiência. Não faço ideia de quantas pessoas existem, mas ele passa em tudo quanto é aldeia. Não sei se deu dinheiro ou não. Mas em São Paulo, ele ficou no cinema uma mês. Em DVD, tem muita cópia rodando, está na Internet... Então o filme está sendo visto. Não importa se não foi visto na época, se só foi visto agora. Quando você quer ir para um festival no exterior, se você não tiver um figurão que diz que o seu filme pertence ao festival, você não entra. Mas eu não construo essas relações. Prefiro ficar com minha fantasia, com meus filmes".

    Obras originais 

    "Nunca adaptei uma obra literária, com personagens já estabelecidos historicamente, tentando ser fiel. Me propuseram algo do tipo outro dia, e percebi que eu precisaria reescrever aquele texto, para torná-lo meu. O que eu conheço desse sentimento para poder representá-lo? Senão, eu fecharia o personagem em pequenas características: a altura, o timbre de voz... Ele deixa de ser um ser vivo, polivalente nas suas possibilidades de expressão".

    Último filme, Já Visto Jamais Visto

    "Esse filme tenta desconstruir o autor e a autoria. Se Paulo Cesar Pereio no Bang Bang e Carapiru no Serras da Desordem são personagens, e o mesmo personagem, porque não são donos da própria vida, no Já Visto Jamais Visto, eu tento desmontar. Nunca me passou pela cabeça construir uma autobiografia. Minha tentativa foi fazer com que esse sentimento afetivo, que constitui uma família, exista ao longo do tempo". 

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