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    Entrevista exclusiva: Charlie Kaufman fala sobre a animação em stop-motion Anomalisa

    Conversamos com o cultuado diretor e roteirista.

    Responsável pelos premiados roteiros de Quero Ser John Malkovich, Adaptação e Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças, Charlie Kaufman fez sua estreia na direção em 2008, com Sinédoque, Nova York. Desde então, não conseguiu emplacar outro projeto, o que deixou seus fãs afoitos. Pois bem, a espera acaba com a animação Anomalisa, destaque no Festival do Rio 2015 e que chega aos cinemas brasileiros no dia 28 de janeiro de 2016, sob distribuição da Paramount Pictures.

    AdoroCinema fez uma entrevista exclusiva com Kaufman por telefone. O resultado você confere logo abaixo. O realizador fala sobre o novo projeto, sobre a carreira, sobre as séries que assiste no momento e muito mais. Fique ligado!

    Como nasceu o projeto?

    Um amigo assistiu à peça em 2005 e gostou muito. Entre 2005 e 2012, ele estabeleceu um estúdio de animação e me perguntou se poderia adaptar a história em uma animação em stop-motion. Eu respondi: “Ok, se conseguir arrecadar o dinheiro.” Depois disso, eles começaram uma campanha no Kickstarter e conseguiram o valor necessário para dar início ao projeto.

    Como foi trabalhar com o stop-motion?

    Quando optamos por fazer um filme, começamos a pensar em como desenvolver esta peça em um formato diferente, com uma forma visual. Era uma peça não-visual. Com o stop-motion, começamos a pensar elementos metafóricos e esquemáticos da animação que serviriam para a história. Com isso, o aspecto visual da história começou a ser desenvolvido.

    O filme é codirigido por Duke Johnson. Como foi esta divisão de trabalho?

    O trabalho com o Duke Johnson foi ótimo. Não conhecia ele antes do projeto. Era alguém que trabalhava para esta companhia e dirigia para eles. Tinha muita experiência com animação e quando começamos a conversar sobre como seria o filme, descobrimos que temos uma sensibilidade parecida. A direção deste filme foi realmente uma colaboração, que foi toda baseada nas conversas que tínhamos sobre como o projeto deveria parecer, sobre o que deveria transmitir. Antes de gravar, fizemos algo que é comum em animações chamado “monomatic”, que é uma espécie de storyboard filmado, com os diálogos e com a duração do filme. Um processo bem diferente do live action. Foi bem prazeroso.

    Anomalisa é uma obra bem singular, principalmente por causa da ideia de todo o mundo ter a mesma voz. Você acha que este é um problema no mundo atual, encontrar vozes originais?

    Acho que o filme é sobre muitas coisas, mas acho que a situação que o Michael (personagem principal) se encontra é que ele não consegue enxergar as pessoas, não consegue se conectar. Acho que é um problema específico do Michael. Pode acontecer com outras pessoas, mas não sabemos, pois estamos na cabeça dele. É sobre sua luta por conectar. Mas é claro que a nossa sociedade também influencia pro tipo de comportamento que vimos no filme. Há no mundo um desencorajamento da intimidade, da vulnerabilidade.

    Foram sete anos entre Sinédoque, Nova York e Anomalisa. Por que levou tanto tempo para lançar um novo projeto?

    Eu venho trabalhando sem parar. Eu escrevi três roteiros desde 2008. Também escrevi três pilotos para séries de TV. Produzi e dirigi um destes pilotos. Estou fazendo Anomalisa desde 2012 e estou escrevendo um livro nos últimos anos. Eu venho tentando fazer as coisas acontecerem desde Sinédoque, Nova York. Não foi minha escolha. Eu não consegui fazer os projetos acontecerem.

    Você começou como roteirista e este é seu segundo filme como diretor. Este é um caminho sem volta? Você vai continuar a dirigir os seus roteiros?

    Sem dúvida, é o que quero. E acho que uma das dificuldades que sofri neste meio tempo foi por esta vontade de também dirigir. Sinédoque, Nova York não rendeu bem comercialmente e desde de 2008, os estúdios começaram a ficar cada vez mais conservadores por causa da economia. Mas a resposta é: sim, eu espero continuar dirigindo. Eu gosto de dirigir. Comecei como roteirista pois tentava alguma forma de entrar no mercado, mas eu fiz faculdade de Cinema e sempre desejei ser um roteirista e diretor. Não foi algo que eu decidi após minha carreira como roteirista começar.

    No filme, você trabalha com Duke e também com o produtor Dan Harmon, que atuam muito na TV. Você tem o costume de assistir séries? É fã de Community?

    Eu gosto de Community. A série é ótima. O Dino Stamatopoulos, que é a pessoa que eu citei antes, que criou o estúdio de animação com o Dan Harmon, é roteirista da série e também interpreta o personagem Starburns, que é o nome do estúdio. Acho os dois ótimos.

    Você tem uma série favorita na atualidade?

    Não sei. Eu certamente passo por períodos em que vejo algo e outros sem nada para assistir. Eu comecei a ver The Knick e gostei. É o que vem na minha cabeça agora, porque comecei há duas semanas. Eu adorei Breaking Bad, mas já tem alguns anos.

    Você começou na TV e nos últimos tempos tentou vender série para FX e HBO. Tem novos planos para séries de TV?

    Não tenho nada novo, mas sempre tenho vontade de fazer TV. Se surgir algo e tiver gente interessada, eu adoraria fazer.

    Como foi a experiência com o crowdfunding? Acha que esta é uma importante ferramenta nos dias de hoje?

    Não sei. Certamente ajudou. Foi importante para fazer o projeto começar a andar. Jamais conseguiríamos o financiamento de um grande estúdio, que nos permitisse fazer as coisas nos nossos termos. Keith Calder, que financiou boa parte do filme, acabou sabendo do projeto pelo Kickstarter. Certamente devemos muito ao Kickstarter. Sobre a importância da ferramenta, é uma pergunta complicada. Pois eu tenho um nome conhecido. O Dan também é conhecido no meio. É difícil dizer que conseguiríamos fazer algo sem este reconhecimento prévio. Não sei se seríamos bem sucedidos. Seria ótimo que o Kickstarter funcionasse também para pessoas não muito famosas, mas não posso dizer que é sempre assim.

    É ótimo que toda sua filmografia seja original, sem continuações, prelúdios ou refilmagens. Mas você já sentiu vontade de voltar para alguma história ou personagem?

    Oh... Nossa... Não. Acho que em algum momento, há muito tempo, Spike Jonze e eu conversamos sobre uma outra versão de Quero Ser John Malkovich. Acho que era uma boa ideia, gostava bastante. Mas não consigo me lembrar bem do que era. Não foi algo que realmente perseguimos. Mas tirando isso... Sinto que as coisas que eu escrevi não conseguem existir com sequências. Me parece que elas existem apenas como uma coisa única. Não saberia como pegar algo como Adaptação ou Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças e criar novas histórias. E também gosto da ideia de novos desafios, de tentar fazer algo que nunca fiz antes.

    Talvez por causa de Adaptação, muitos consideram o seu trabalho autobiográfico. O que existe de Charlie Kaufman em Anomalisa?

    É uma pergunta difícil de responder. Acho que meus trabalhos são autobiográficos porque eu os escrevi e tento ser honesto e verdadeiro na minha escrita. Então, partes de mim estarão no texto. Mas em termos específicos, não é a minha história. É a história do Michael. Sinto que meu trabalho é muito pessoal. E eu quero que seja muito pessoal. Mas também sinto que mantenho uma distância da minha vida pessoal. Acho que revelo o tanto que eu quero revelar em meu texto.

    É mais fácil dirigir atores ou bonecos de massinha?

    São coisas muito diferentes. E a verdade é que na animação você faz os dois, pois você também dirige o ator e o tom que eles vão empregar no filme. Eu gosto dos dois trabalhos, adoro a combinação. Adoro trabalhar com atores, quando o ator é legal. O que tem sido a minha experiência até agora. Desde criança tenha interesse no mundo da atuação. Atuei muito quando pequeno e adoro pensar no que os atores conversam e refletem sobre seus personagens. É muito diferente trabalhar com bonecos, não há esta espécie de interação caótica no set. Há um rascunho, você lida com os animadores, mas não é a mesma coisa de estar num set de live action.

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