O que acontece quando a Netflix resolve investir em uma produção original um de longa-metragem de ficção? O mesmo que acontece quando a plataforma de vídeos on-demand produz uma série própria.
Como era de se esperar, com Beasts of No Nation, exibido no Toronto International Film Festival 2015 (TIFF), a empresa não poupa esforços (leia dinheiro) para adaptar para os cinemas o romance homônimo do escritor norte-americano de origem nigeriana Uzodinma Iweala.
Para os cinemas? Sim, rapaz(moça) atento(a). O filme estreia simultaneamente em 16 de outubro na Netflix, ao mesmo tempo em que chega a algumas salas do circuito dos Estados Unidos (ainda não há previsão de estreia no Brasil, em nenhum dos dois formatos), o que, tecnicamente, permite que a produção concorra ao próximo Oscar.
Mas será para tanto? Sim, rapaz(moça) curioso(a). Beasts of No Nation traz performances vigorosas do estreante, o não-profissional Abraham Attah (de 14 anos, que aparenta ser ainda mais novo) e de Idris Elba (Thor).
Cidade de Deus da Nigéria.
A guerra civil na Nigéria chega ao vilarejo de Agu (Abraham), cuja população se encontra no meio da disputa entre governo e rebeldes. Após a morte de seu pai por militantes, o menino consegue fugir, mas é cooptado pela milícia, que o treina para ser um guerrilheiro e vingar a morte dos parentes. A partir dessa virada, o filme acompanha um verdadeiro tour de force da(s) criança(s) pelos horrores do conflito.
A exemplo do (não) ator somali Barkhad Abdi, que concorreu ao Oscar por Capitão Philips (2013), Abraham pode, sim (merece), ser indicado por sua performance. Conta a favor o fato de o jovem ter levado o troféu de ator revelação recentemente no Festival de Veneza. Conta contra ele ser o protagonista do filme – e, claro, as indicações ao prêmio principal de atuação masculina são mais concorridas.
Dessa forma, seria mais prudente apostar em uma lembrança da Academia, na categoria de coadjuvante, para Elba. Ele interpreta “Comandante”, o líder da guerrilha, um sujeito cruel mas, ao mesmo tempo, carismático, no registro do ator.
Mas não se deixe enganar. O filme não poupa o espectador – é de uma violência chocante, sobretudo pelo retrato das crianças em campo (de guerra). Nesse aspecto, lembra o brasileiro Cidade de Deus – descontado o “humor” do filme de Fernando Meirelles.
Deleite visual.
Por trás disso tudo está a direção competente de Cary Fukunaga, de True Detective – primeira temporada, que fique bem claro (na segunda, ele atua como produtor executivo).
Com o filme, Fukunaga prova (como se fosse preciso) que é um virtuose da imagem. Ele tem o domínio da câmera, sabe o que quer de seus planos, e o resultado é um verdadeiro deleite visual. Não à toa ele assina também como o diretor de fotografia desse Beats of No Nation – onde tem grandes chances de ser lembrado pela Academia também.
Vale lembrar que as séries originais de Netflix (como House of Cards e Orange is the New Black) já são presença constante nos prêmios Emmy; e que a plataforma VOD já até concorreu ao Oscar, com o documentário A Praça Tahrir (2013). A depender do desempenho de Beasts of No Nation, pode ser que a empresa tenha que investir no mercado fonográfico se quiser ir ainda mais além no mercado do entretenimento.