Matheus Nachtergaele passou ontem por um dia repleto de emoções. Homenageado pelo Festival de Vitória, o ator recebeu das mãos do diretor Lírio Ferreira o Troféu Vitória e foi ovacionado pelo público. Mas, antes da consagração, ele concedeu uma entrevista exclusiva ao AdoroCinema.
Um dos principais assuntos do bate-papo foi a revelação feita por ele durante a coletiva de imprensa, de que já estava trabalhando em seu segundo filme como diretor. "Já tenho o título: Furo no Muro! Posso dizer porque sei que não irei mudar mesmo", comentou. Matheus disse que o projeto ainda está em gestação, o que no seu caso costuma demorar um bom tempo. "Demorei 10 anos para fazer A Festa da Menina Morta. Sou que nem uma aliá, cuja gestação demora mas depois vem um bebê grandão!", brincou.
Mesmo sem revelar detalhes da história, Matheus disse que o filme já existe em sua cabeça e que Vânia Catani, da Bananeira Filmes, o procurou para produzir o longa-metragem. "Em algum momento, não muito distante daqui, irei soltar o material para a Vânia. Não se trata de uma urgência de cineasta, mas de algo que preciso falar, só que filmando."
Confira abaixo os principais destaques da entrevista exclusiva concedida por Matheus Nachtergaele ao AdoroCinema.
COMO ESCOLHE OS PROJETOS?
Ao longo das duas últimas décadas, Matheus tem se revezado entre o cinema e a TV, com papéis de destaque em ambos os veículos. Perguntamos o que o atraía ao receber um projeto. "Não sou muito um cara de nãos. Sempre acho que, de alguma maneira, quando um projeto vem a você deve ser recebido com carinho e atenção. O que sempre procurei manter como guia é o porquê disto ser feito. Então fico mais atento à vocação do projeto como um todo do que ao personagem que faria nele."
A CARA DO CINEMA BRASILEIRO
Ao lado de Selton Mello, Rodrigo Santoro, Caio Blat, Dira Paes, João Miguel e tantos outros, Matheus Nachtergaele é uma das caras do cinema brasileiro no século XXI. O ator falou um pouco sobre como foi ligação que o fez se considerar, hoje, como um ator de cinema. "Aconteceu comigo de ser ator em um momento em que o cinema se retomava. Estava em uma posição bonita dentro desta retomada e fui participando dela, à medida que era chamado. Disse sim para O Que É Isso, Companheiro? e para o Walter Salles, nos primeiros filmes dele, e acredito que aos poucos fui me tornando um bom instrumento para que os diretores mostrassem a cara do Brasil."
DIRIGIR SEM ATUAR
Por enquanto, Matheus dirigiu apenas um filme, A Festa da Menina Morta, onde não atuou. Por que? "Quando concebi A Festa da Menina Morta eu imaginei que seria o Santinho, e o escrevi para que o fizesse. Conforme as coisas foram caminhando, percebi que era mais importante dirigir tudo aquilo e que seria mais bonito para o projeto que outro ator encarnasse o Santinho. Assim eu poderia cuidar de cada ator, de cada frase, de cada figurino... Foi por isso que não quis atuar, não me senti neste primeiro filme capaz de estar dentro e fora ao mesmo tempo."
PARCERIA COM CINEASTAS PERNAMBUCANOS
"É engraçado que eu tenho muito parceiro pernambucano: Guel Arraes, Lírio Ferreira e Cláudio Assis. São cineastas tão diferentes um do outro, todos pernambucanos e com quem eu colaboro muito", disse o ator, ao relembrar grandes parcerias que teve. "Eles são meus amigos pessoais. A gente conversa muito sobre a vida, e da vida nascem os filmes. No caso destes cineastas, quando os filmes são gestados eu quase sempre sei qual será a minha participação, porque a gente faz junto. É diferente de pessoas com quem convivo menos e aí me procuram para oferecer algum trabalho."
CRIAR PERSONAGENS QUE EXISTIRAM
Recentemente Matheus teve dois desafios em cena: interpretar o carnavalesco Joãozinho Trinta, em Trinta, e o diretor José Mojica Marins, o Zé do Caixão, na ainda inédita minissérie Maldito. Perguntamos ao ator as diferenças entre interpretar um personagem fictício e outro que existiu realmente. "Quando o set está armado e o diretor grita ação, você interpreta um personagem e tem uma cena para gravar. Mas os motivos são outros. No Trinta e no Zé do Caixão eu nunca perdia de foco que a gente estava homenageando um artista brasileiro. Isto era o guia maior, a diferença mais brutal é esta."
FALTA DE CORAGEM NO CINEMA BRASILEIRO
Na coletiva de imprensa, Matheus disse que lamentava uma certa falta de coragem no cinema brasileiro atual. Perguntamos a ele como vê o atual cenário da sétima arte no país, dominada por comédias de sucesso enquanto filmes mais autorais enfrentam dificuldade para encontrar espaço no circuito. "A gente vive um fenômeno, saudável, no sentido de que muitos filmes são competitivos o suficiente para competirem com o cinema de entretenimento americano. Isto obviamente ofusca um pouco o cinema de arte, o autorial, que continua passando por dificuldades. Mas isto faz parte deste tipo de cinema, não só no Brasil mas no mundo todo. A dominação através do cinema é algo muito forte, muito violenta. Um cinema como o dos Estados Unidos ser tão exibido significa um domínio grande daquele país sobre a gente. Não é apenas em relação ao mercado de cinema, são ideias e conceitos, uma visão de mundo. Com as nossas comédias a gente tem ocupado um espaço que é importante que a gente ocupe. Só não podemos esquecer que o mais bonito do cinema não é entreter, mas investigar, mexer e cutucar."
