A cena é a seguinte: na primeira sessão para imprensa de Aliança do Crime, lotada, no Toronto International Film Festival 2015 (TIFF), um jornalista veterano, aposentado, encontra uma amiga por acaso, que pergunta o motivo de ele ter escolhido esse filme para assistir. “Porque finalmente parece que Johnny Depp escolheu um papel mais ‘pé no chão’”, foi a resposta dele. E o colega tem razão.
Apesar da maquiagem pesada que distrai o espectador da performance do ator de Piratas do Caribe, no papel do criminoso James "Whitey" Bulger, Depp entrega a melhor atuação da carreira desde Sweeney Todd: O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet (2007) – que lhe valeu a terceira e última indicação ao Oscar da carreira até aqui. Depois de amargar quatro fracassos comerciais como protagonista recentemente (Mortdecai - A Arte da Trapaça; Transcendence - A Revolução; O Cavaleiro Solitário; Diário de um Jornalista Bêbado), já não era sem tempo.
Pode até ser que Black Mass (no original) não seja um estrondoso sucesso financeiro, mas as primeiras exibições do filme (projetado antes nos festivais de Veneza e Telluride) já foram revertidas em prestígio para a arranhada imagem do galã.
Whitey Bulger foi um dos criminosos mais conhecidos da história de Boston, nos Estados Unidos, atuando a partir de meados dos anos 1970. Irmão do senador Bill Bulger (Benedict Cumberbatch), o mafioso recebe uma proposta do agente do FBI John Connelly (Joel Edgerton) – que cresceu na vizinhança, mas debandou para o “outro lado” da lei –, para ser informante do bureau.
Johnny Depp, quando foi escalado para o papel, despertou a desconfiança dos norte-americanos, por não ter o physique du role necessário para o papel, afinal, Bulger era conhecido também por ser... feio. Daí, a necessidade da caracterização, que envolve um (não) aplique capilar (o retratado era careca), dentes manchados e lentes de contato.
O ator adota um jeito manso de falar, mas aposta em um olhar duro de fazer tremer o valentão mais metido a besta do bairro. No fim das contas, é um papel mais adulto do que aqueles que o ator encarnou nos últimos anos.
Além de tratar-se de uma cinebiografia, subgênero que costuma deixar os votantes da Academia em polvorosa, Aliança do Crime tem como diretor Scott Cooper, responsável por Coração Louco (2009), Oscar de Melhor Ator para Jeff Bridges.
A concorrência, no entanto, será dura – e começa de casa. Porque, a despeito de toda a transformação (física) de Depp, quem passa mesmo por mudanças, essas de ordem psicológica, é o agente John Connelly, defendido com destreza por Edgerton. No fim das contas, o oficial também acaba se beneficiando, pessoalmente, da aliança. Vai ser briga de cachorro grande – fora da tela também.