Após a exibição do excelente O Clube na noite de estreia do 25º Cine Ceará, o segundo dia de mostra competitiva trouxe dois dramas muito distintos: o melodrama Loreak, filme feminino inteiramente falado em língua basca, e o radical Jauja, drama sobre a busca de um pai (Viggo Mortensen) por sua filha.
Os dois filmes suscitaram reações fortes na plateia. Loreak mostra a solitária Ane, cuja vida se transforma quando passa a receber flores de um anônimo. Ao mesmo tempo, uma tragédia faz com que ela também tenha que enviar flores constantemente, sem revelar a sua identidade. A atriz Itziar Ituño subiu ao palco, declarando-se honrada de ver um "filme tão pequeno" sendo selecionado no festival cearense.
O filme começa como um delicado drama, até se transformar em um melodrama mais convencional, relativamente longo e repleto de reviravoltas inesperadas. É curioso ver como o filme despertou conversas durante a sessão, com vários espectadores se interrogando sobre os acontecimentos em tela: "Mas ela ficou realmente louca? Por quê?". Parte do público abandonou a sessão, e a outra parte aplaudiu com furor no fim da exibição. Leia a nossa crítica.
Jauja é uma obra muito mais radical, mas não surpreende os espectadores familiarizados com a filmografia do cineasta Lisandro Alonso. O diretor sempre trabalhou com tempos estendidos, cenas com pouca ou nenhuma ação, evitando qualquer envolvimento pessoal do espectador - ou seja, nada de trilha sonora empolgante, planos próximos no rosto dos atores, reviravoltas surpreendentes.
Este último filme, uma inesperada coprodução entre Argentina, Dinamarca, França, México, EUA, Alemanha, Holanda e Brasil, segue esta cartilha. A premissa básica poderia ser usada para um filme de ação americano (um pai buscando de todas as maneiras a filha sequestrada), mas prefere se concentrar nos tempos mortos, na espera, no silêncio do pai perdido nas planícies desertas. O resultado foi mais uma debandada durante a sessão, em oposição aos aplausos eufóricos do público que permaneceu até o fim. Jauja venceu o prêmio da crítica na mostra Um Certo Olhar, no festival de Cannes.
Se os longas-metragens apresentavam certo grau de radicalidade, os curtas selecionados foram muito além. Choclo, do cineasta Caetano Gotardo, apresenta uma poesia narrada em off, associada a imagens documentais de uma relação amorosa. Talvez os objetos e lembranças evocados pelo narrador e diretor tenham grande valor emocional para as pessoas envolvidas, mas desprovidos de contexto, acabam oferecendo uma obra um tanto inócua ao público.
Action Painting nº1 e nº2 também aborda o ato sexual, concentrando-se na plasticidade dos corpos durante o sexo. Os diretores Krefer e Turca revelam os arranhões na pele, os traços da cera deixados nas costas, o formato do corpo se contorcendo em fundo infinito. Uma obra conceitualmente bem desenvolvida e esteticamente empolgante.
Nua Por Dentro do Couro, já apresentado em diversos festivais brasileiros, foi talvez o filme mais "convencional" do grupo, mesmo estando longe de uma narrativa clássica. O cineasta Lucas Sá faz um mergulho pelo cinema de gênero, imaginando as relações carnais (em vários sentidos do termo) entre duas vizinhas de um prédio. Um curta-metragem curioso, embora talvez privilegie excessivamente as cenas de impacto (ah, os gritos de Gilda Nomacce!) em detrimento do contexto e do aprofundamento das personagens.
Por fim, a produção local Cenário traz uma colagem eletrônica feita a partir de vídeos pessoais de festas e casamentos. A narração maquínica (do Google Tradutor?) desperta estranhamento e humor em relação às frases de efeito proferidas sobre o amor e a amizade. Mas o curta parece um tanto limitado por esse conceito estético que se repete sem se desenvolver.
O Cine Ceará 2015 continua neste dia 20 de junho, com a exibição do drama cubano A Obra do Século, de Carlos Quintela, e do brasileiro Real Beleza, de Jorge Furtado.