Após a exibição do impactante O Clube na abertura do Cine Ceará 2015, o ator chileno Alejandro Goic encontrou jornalistas e críticos de cinema para conversar sobre o filme dirigido por Pablo Larraín. A história gira em torno de um pequeno grupo de padres, isolados de suas atividades após cometerem delitos graves (pedofilia, adoção ilegal, violência contra crianças), vivendo em uma espécie de prisão, longe dos olhos da sociedade.
Confira um pouco dessa conversa:
Percurso
Alejandro Goic possui uma carreira extensa como ator de teatro, e diz ter retornado à atuação, em especial nos cinemas, nos últimos oito anos. Desde então, ele se sente "honrado" de ter trabalhado nos maiores e mais conhecidos filmes chilenos: A Criada, Carne de Cão, No, Gloria, Jovem Aloucada, Os 33...
Questionado sobre a sua semelhança com o personagem do padre em O Clube, o ator se declara não católico, com um passado de militância em um partido socialista-marxista. Curiosamente, o seu próprio tio, que possui o mesmo nome dele, é um padre que investiga casos de pedofilia dentro da igreja católica.
Os "clubes" reais
Por mais que a história de O Clube parece fantasiosa, o ator garante que estas casas são mantidas em condições de semiclandestinidade por todo o mundo, incluindo o Chile e o Brasil. A intenção, de acordo com Goic, é fugir à investigação policial e evitar a exposição negativa da igreja católica.
O próprio personagem de Goic possui relação com uma história real, embora não tenha sido baseado nela. No Chile, o padre Joignant costumava ajudar em partos e sedar as ricas mães dos bebês. Depois, com apoio dos médicos, dizia que a criança estava morta, realizava um enterro com caixão vazio, e entregava a criança a uma família católica que realmente quisesse cuidar dela. A atitude do padre em O Clube é exatamente esta.
Sucesso no Chile
Curiosamente, O Clube chegou aos cinemas de seu país logo após outro lançamento de grande sucesso, tratando igualmente da pedofilia na igreja católica. O filme Os Bosques de Karadima explora através da ficção a história real do poderoso sacerdote Fernando Karadima, que abusou de crianças ao longo de três décadas, mas não sofreu sanções por suas relações com políticos influentes.
O caso de O Clube nos cinemas foi curioso: a estreia mostrou resultados satisfatórios de bilheteria, mas ao contrário da maioria dos filmes, que vão perdendo os espectadores semana após semana, o drama conseguiu aumentar a bilheteria, uma semana após a outra. O caso é fruto da ótima repercussão, e do poderoso boca a boca.
A corrupção do poder
Embora a igreja católica seja o foco do filme, Alejandro Goic afirma que o verdadeiro tema de O Clube é a corrupção do poder e das instituições de modo mais amplo. "A pedofilia também é uma relação de poder", lembra o artista, citando os abusos do roteiro como exemplos da hipocrisia das classes dominantes no mundo contemporâneo.
Ele completa, lamentamos o fato de vivermos os tempos do "fim da transparência" e da "perda de poder pelo povo".
Em tempos de machismo
Goic se lembra que um jornalista perguntou para ele: "Qual é o melhor ator de O Clube?". Confuso com o que chamou de machismo tipicamente chileno, ele respondeu: "O melhor ator é Antonia Zegers". De fato, esta única mulher entre os homens tem um papel fundamental e surpreendente na história. "Ela é muito ambígua, transita entre a beatitude e a monstruosidade", define o ator.
Zegers, por acaso, também é a esposa do diretor Pablo Larraín, e acaba de trabalhar com Goic em uma minissérie de televisão sobre assassinos em série que nunca foram punidos. A dupla realmente gosta de enfrentar temas complicados...