A língua portuguesa esteve em destaque na noite desta quinta-feira, no Festival de Cannes. Afinal de contas, era a chance de conferir Visita ou Memórias e Confissões, o filme testamento do consagrado diretor português Manoel de Oliveira, falecido em 2 de abril deste ano. A curiosidade é que vários brasileiros estavam entre o público presente, curiosos em conferir esta produção bem particular.
Rodado em 1981 e concluído no ano seguinte, Visita... esteve todo este tempo inédito nos cinemas, já que o próprio Manoel de Oliveira determinou que apenas fosse exibido após sua morte. O que ninguém esperava, nem o próprio Manoel, é que ela só acontecesse mais de 30 anos depois, aos 106 anos. Na época em que o longa-metragem foi rodado, o diretor tinha 73 anos.
Ao assistir o filme, fica bem claro o porquê da decisão de apenas exibi-lo após a morte do diretor. Com apenas 68 minutos de duração, o longa oferece um passeio pela casa onde Manoel viveu por mais de 40 anos, com intervenções do próprio. Nelas, o diretor assume o papel de apresentador de sua própria vida, trazendo detalhes sobre os pais, filhos, o casamento com Maria Isabel e, é claro, sua carreira cinematográfica.
Chama a atenção a honestidade do diretor ao falar abertamente que estava vendendo a casa para pagar dívidas - "nunca fui um homem de indústria", ele assume -, assim como de sua esposa ao dizer que "não se pode esperar o artista do homem". Manoel fala ainda do modo como vê as mulheres - "é o símbolo das virtudes, mas também da tentação e do pecado" - e admite a sedução pelo tema da virgindade, explorado em sua quadrilogia dos amores frustrados (O Passado e o Presente, Benilde ou a Virgem-mãe, Amor de Perdição e Francisca).
Agradável de ser visto, Visita ou Memórias e Confissões funciona mais como uma curiosidade sobre o diretor, válida a todos que apreciam seus filmes. A exibição no festival, dentro da seção Cannes Classics, foi apenas a terceira do longa-metragem, que antes fora exibido pela Cinemateca Portuguesa nas cidades do Porto e Lisboa.